O que falhou na resposta dos hospitais durante a pandemia
Neste período, que já vai longo, de sobrecarga de trabalho para os profissionais de saúde, o reconhecimento e a respeitabilidade seriam condições dignas e essenciais para melhorar a prestação de cuidados. Ao invés, após um lento período de degradação, que se arrasta há décadas, assistimos ao colapso do sistema de saúde.
As medidas para responder à pandemia vieram aumentar as barreiras existentes e debilitar ainda mais o SNS. Vimos o acompanhamento dos utentes ser prejudicado devido à diminuição da atividade de consultas presenciais, com maior incidência na capacidade de diagnóstico precoce, de resposta atempada na doença aguda e de acompanhamento de quem vive com doenças crónicas. Os impactos a curto e médio prazo são incalculáveis. A descoberto ficaram as doenças que são a principal causa de morte em Portugal.
Mas o tempo é de reflexão e simultaneamente de ação. Um dos aspetos positivos desta experiência foi o reforço da perceção pública sobre o papel das comunidades do conhecimento, pela partilha de informação essencial para a orientação e a eficácia das políticas públicas.
Disso é exemplo o estudo exploratório levado a cabo pelo RICH - Research and Innovation Center for Health sobre "Modelos de gestão hospitalar na crise pandémica covid-19: Lições para o futuro", que teve como objetivo analisar os modelos de tomada de decisão que emergiram nos hospitais portugueses durante o agravamento da crise pandémica em Portugal e as diferenças entre os modelos de funcionamento e resposta das entidades públicas empresariais e das parcerias público-privadas.
Entre as conclusões, o estudo revela que as principais barreiras à tomada de decisão nos hospitais, durante o agravamento da crise, foram as orientações ambíguas da DGS e as falhas de comunicação entre entidades. O plano foi feito de forma generalista e não teve em conta as capacidades e potencialidades de cada unidade. Quando se divulgam orientações a nível central, estas devem ser implementadas em cascata pelas administrações regionais de saúde e depois pelas administrações hospitalares.
Destaca-se ainda que os médicos e os enfermeiros ganharam relevância na tomada de decisão e as chefias operacionais tomaram o pulso à execução. Acredito que possa ser revelador da importância de se fazer um trabalho de grande proximidade com estas direções, porque é nelas que os profissionais de saúde se reveem. É também nestes profissionais que os utentes mais confiam, especialmente em momentos de maior insegurança.
Nesta fase inicial do estudo quisemos perceber o que correu bem e menos bem para os modelos de gestão a replicar em situações futuras. Os profissionais de saúde, em particular, terão um importante contributo nas reformas indispensáveis e emergentes para o serviço público em complemento com os setores privado e social da saúde.
O impacto da pandemia nos cuidados de saúde é incalculável. Certo é que aumentar a capacidade de resposta dos cuidados primários é um fator crítico - é urgente o investimento na prevenção da doença e organizar equipas multidisciplinares que atuem em proximidade junto do cidadão; é prioritário novos modelos de financiamento do sistema de saúde - condições essenciais para tornar o setor mais resiliente a crises futuras.
Médico e professor universitário CEU/UAL