O Mali responde ao último périplo de Macron pela África mais ocidental
Na continuação do episódio Mali-Costa do Marfim, o grande mal-entendido, a Junta Militar que governa o Mali desde agosto de 2020, deu esta semana 72h para todos os militares estrangeiros com base no Aeroporto de Bamako, abandonarem o país. Trata-se de mais um avante maliano face às pressões externas, entretanto amenizadas na Cimeira de Acra da CEDEAO, de 3 de julho. Estas, as pressões regionais, fizeram durante os últimos dois anos do Mali, uma ilha rodeada de terra, sem possibilidade de importar, exportar, nem fazer transferências bancárias para o exterior, ou recebê-las a partir deste. Voltaram, os malianos a uma certa normalidade há precisamente um mês, com o levantamento destas sanções.
As pressões ainda mais exteriores, não regionais, começam agora a aumentar, também em consequência da guerra da Ucrânia, por via do alinhamento maliano com os "conselheiros russos" no território, os quais fazem a bolha securitária e diplomática à Junta Militar, garantindo-a no poder e dando-lhe formação. Ora para os russos terem entrado, alguém teve que sair, tocando essa ordem aos franceses. Por isso mesmo na semana passada, enquanto o MNE russo Lavrov iniciava o seu périplo africano no Cairo, descendo depois pela África mais oriental (República Democrática do Congo, Uganda e Etiópia), o Presidente (PR) francês, Emmanuel Macron iniciou também um périplo pela África mais ocidental, aterrando primeiro nos Camarões, país "entalado" entre a "Nigéria do Boko Haram" e a República Centro Africana, actualmente a grande base operacional e militar russa em África. Paul Biya, o PR camaronês há 40 anos, começou a substituir importações e acordos comerciais com países europeus, nomeadamente com França, por importações e acordos comerciais com a Rússia. A preocupação de Macron é a mesma de todos os líderes europeus, não permitir que o Golfo da Guiné e a África Ocidental caiam para a órbita russa! Nesse mesmo sentido o Benim também viu a visita do PR francês. Porquê? Porque os avanços jihadistas para sul, a partir das "três fronteiras" (Mali, Burkina Faso e Níger), certamente ainda este ano criarão "novas três fronteiras" ainda mais problemáticas na porosidade e no controlo da "transumância jihadista". Uma descida para sul a partir do Burkina, com o intuito de chegarem ao mar fazendo do Golfo da Guiné nova porta de entrada e de fuga da região, desestabilizará não apenas o Benim, mas também Costa do Marfim, Gana, Togo e a própria Nigéria, maior produtor de petróleo em África. A França, expulsa do Mali, transferiu o seu contingente militar para o vizinho Níger, mas também não se importaria de garantir uma nova base militar no
Benim, para antecipadamente preparar a investida jihadista que se projecta para sul. Estas razões são suficientes para o comunicado oficial do Eliseu, referir que no Benim se abordaria o assunto do retorno de peças de arte locais em museus franceses!
Por último, Macron passou por Bissau, sempre "com um olho nos russos e outro nos portugueses", mas fundamentalmente porque o PR Umaro Sissoko Embaló preside actualmente à CEDEAO, que gere os dossiês das sanções e monitorização de três golpistas regionais, o Mali, o Burkina Faso e a República da Guiné (Conakri), todos actualmente de tendência russa. Visto isto, o Mali respondeu como pôde, dando 72h para os militares estrangeiros que dormem nas instalações do aeroporto da capital e que servem os que se encontram na cidade, incluindo os das Nações Unidas, se retirarem o quanto antes, que o Mali já não é uma "coutada europeia"!
Politólogo/Arabista
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