"O João Dinis está muito mais alto, parece que já tem 18 anos"

A generalidade das escolas dos 2. º e 3. º ciclos recomeçaram as aulas presenciais nesta segunda-feira, tal como os ATL para os mais crescidos. Há quem já estivesse farto de estar em casa, mas também quem preferisse o estudo "online". Conviviam através do telemóvel, ligação que mantêm.
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O João Dinis "está muito mais alto, parece que já tem 18 anos", diz o Simão do amigo que ele pensa ter 12. "A voz de alguns está mais grossa", observa o Raul. São alunos do 3.º ciclo e, esta segunda-feira, voltaram às aulas presenciais. As opiniões dividem-se quanto aos benefícios: há quem prefira estudar em casa e quem não goste de se levantar mais cedo; mas também há quem diga que aprende mais nas aulas ao vivo e quem tenha aproveitado o intervalo para jogar as escondidas. Quanto ao convívio, garantem que sempre falaram uns com os outros pelas vias digitais. Em casa ou na escola, o telemóvel parece ser o melhor amigo.

A generalidade das escolas dos 2.º e 3.º ciclos recomeçaram presencialmente nesta segunda-feira, também os ATL para os mais crescidos. As creches, jardins-de-infância e 1.º ciclo já tinham reaberto a 15 de março. Os últimos serão os do ensino secundário e das universidades. As exceções vêm das autarquias que dividiram o ano letivo em primeiro e segundo semestres, ao contrário de três períodos. "As escolas ds 2. º e 3.º ciclos só reabrem no dia 7, que é quando se inicia o 2.º semestre", informam da Câmara Municipal da Amadora.

O Simão Costa tem 11 anos e está no 6.º ano na Quinta de Marrocos, em Benfica, que tem os 2 º e 3 º ciclos. Desde 22 de janeiro que deixou de estar numa sala de aula, volta mais de dois meses depois. "Estava muito ansioso por ver os professores e colegas. Gostei de os ver, brincámos às escondidas. De resto foi tudo normal." Prefere a escola ao computador, diz que aprende mais. "Em casa, nem sempre há net, outra vez é o computador, é melhor vir à escola."

Mas Simão melhorou as notas neste período de confinamento, teve positiva a todas as disciplinas. Entrou às 08h30, às segundas-feiras não tem aulas à tarde. Conta que deixou de se sentir nervoso quando entrou na sala de aula. Puxa pela cabeça para se lembrar do que encontrou de novo, até que exclama: "O João Dinis! O João Dinis está muito mais alto, parece que tem 18 anos." Uma surpresa, tanto mais que o rapaz, que "deve ter 12 anos", nem era o maior da turma.

A logística em casa do Simão é que não tem sido fácil, "somos cinco e sem poder sair de casa". Três irmãos, o mais novo tem 21 meses e o mais velho 14 anos, uma rapariga aluna da mesma escola, os pais estão em teletrabalho. O Simão estuda no seu quarto, a irmã no dela, os pais trabalham na sala: o pai numa secretária e a mãe no sofá, com o bebé a ver desenhos animados.

A mãe é Cristina Costa, 32 anos, e tenta unir todas as pontas, incluindo apanhar de carro os mais velhos à escola, sempre com o mais novo atrás. "Foi complicado, ficámos todos em casa, literalmente, por outro lado, é mais fácil controlar o que andam a fazer, mas não é simples", começa por explicar. Acrescenta: "Custou muito de início, a mais velha é mais autónoma, já o Simão tinha de o acompanhar, ver se tinha os exercícios bem feitos em matérias que não conheço, muitas vezes, tentei perceber como se fazia na internet. Em relação à logística, acabamos por nos habituar, os mais velhos também ajudam na lida de casa."

É administrativa e o teletrabalho com adolescentes na escola e um bebé é difícil de conciliar entre ela e o marido: "Acordar mais cedo, depois aproveitar quando o Vicente [bebé] está a dormir a sesta e voltar ao computador quando já estão a dormir."

"Normal, foi dia normal, se calhar falámos um bocado mais, repetem os alunos do 8.º ano da Escola Galopim de Carvalho, em Queluz, num dia em que também tiveram aulas de manhã. Têm maior carga horária à tarde.

O Raul Areeiro, 13 anos, assegura que estava muito melhor em casa. Os colegas brincam que "é antissocial". Ele concorda: "Prefiro estar em casa, dá um trabalhão ir à escola, levantar, vestir e ainda tenho o caminho, uma subida, para chegar à escola", justifica. Esteve uma manhã com os colegas e acha que estão na mesma, com uma ou outra exceção. "Alguns mudaram a voz, ficou mais grossa."

A Lara Fialho, 13, e a Natália Silva, 17, também preferem ficar em casa. "Começámos as aulas às 09h55 e tivemos de acordar às 08h00, em casa basta levantar da cama . Já a Juliana Fialho, 13 (prima da Lara) gosta mais dos dias em que vai à escola. É como o Bruno Santos, 15 anos. "Em casa não se faz nada, mais vale estar na escola, sempre estamos com os amigos."

Luís Mira, professor de Educação Visual e Tecnológica e coordenador da Escola Galopim de Carvalho, faz um balanço positivo deste reinício de aulas presenciais. "Alguns alunos estavam ansiosos, estavam cansados de estar em casa", diz, para defender: "O ensino à distância tem sempre problemas, desde os relacionados com a parte informática, as dificuldades de acesso, depois, o facto de professor e alunos não estarem junto faz que as aulas sejam menos produtivas."

A Geórgia Pereira, 14 anos, 9.º ano, gostou deste primeiro dia de aulas. Entrou às 08h00. "Não estava muito ansiosa, já conheço os professores e os colegas e não gosto muito da escola, mas foi bom encontrar-me com toda a gente. Só que tive três professores que não vieram dar aulas", lamenta.

Divide-se quando é questionada se prefere a modalidade online ou presencial. "Por um lado, preferia ter aulas em casa, por outro, na escola, depende das matérias. Consigo estudar melhor sozinha, estou mais focada, na escola há mais distração", justifica a Geórgia. Apesar disso, as notas não subiram no 2.º período. Irá para o secundário no próximo ano, depois, talvez a academia militar. Quer tirar Medicina.

Com a pandemia, o espaço da sala de aula não aumentou e o número de alunos por turma mantém-se, em média 25. As escolas tiveram de se adaptar. Afastaram as carteiras, não se pode circular na sala e só saem para ir à casa de banho. Há circuitos de entrada e de saída diferentes, medição da temperatura, gel desinfetante e uso de máscara obrigatório. Máscaras reutilizáveis e que, em geral, são as autarquias que fornecem.

Rubim Serra, 14 anos, e Rodrigo Almeida, 14, ambos no 7.º, e Iara Soares, 13, do 8.º ano, põem a conversa em dia ao portão da Escola Básica Pedro Santarém, em Benfica. O Rubim não está muito contente com o que vê. "Está cheia de pessoas sem máscara, mais valia ter aulas em casa, é mais seguro. E temos mais conforto, é só assistir às aulas e aprendemos à mesma, além de que não precisamos de usar a máscara, sufoca." Vive com a avó desde o início da pandemia.

Já o Rodrigo, que tem tido a mãe em casa, prefere a escola, sempre encontra os colegas. "Gosto mais das aulas presenciais, acho que não se aprende nada online." Logo a Iara observa: "Não se aprende? Estás a falar com uma pessoa que teve 4 [bom]." Resposta do Rodrigo: "Não consigo ter boas notas nas aulas online, tenho melhores notas devido ao bom comportamento e isso não é avaliado online."

Na casa de Iara vivem cinco pessoas, trabalham quatro e ninguém em teletrabalho. Gosta desse ambiente calmo. "É mais tranquilo." A Pedro Santarém tem também o 1.º ciclo, que iniciou as aulas há três semanas. Os circuitos de entrada e saída são diferentes. O turno da tarde está a iniciar, muitos alunos esperam sentados nas escadas. A maioria em grupos, mas todos com os olhos pregados nos telemóveis.

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