O anúncio, surpreendente, foi feito na terça-feira: Bob Iger, que foi CEO da Disney nos últimos 15 anos, deixou o cargo e foi substituído por Bob Chapek, um veterano com 27 anos de experiência na casa e que era até aqui o responsável por parques, experiências e produtos da Disney. Num momento em que a empresa está numa posição claramente vantajosa no mercado do audiovisual e entretenimento, esta era aquela notícia que ninguém estava à espera. Iger, de 69 anos, sai por vontade própria e mantém-se na empresa até terminar o contrato com a Disney, no final de 2021, com o cargo de chairman executivo.."Com o bem-sucedido lançamento serviço direto ao consumidor (o Disney+) e com a integração da Twenty-First Century Fox, acredito que este é um ótimo momento para fazer a transição para um novo CEO. Tenho a maior confiança no Bob e estou ansioso por trabalhar com ele nos próximos 22 meses. E, enquanto assume a nova função e aprofunda os diversos negócios e operações globais da Disney, eu irei dedicar-me aos empreendimentos criativos da companhia", disse Robert Iger, em comunicado..Bob Iger entrou na empresa nos anos 1990, quando a Disney comprou a Capital Records/ABC, onde ele trabalhava. Em 2005 assumiu os comandos, substituindo Michael Eisner num momento em que a Disney enfrentava uma das maiores crises - a concorrência da DreamWorks (que fez Shrek e Madagáscar) e alguns fracassos de bilheteira (como Pacha e o Imperador, Kenai e Koda ou O Paraíso da Barafunda) ensombravam os resultados da marca que nos anos 1990, com Jeffrey Katzenberg à frente da divisão de animação, tinha lançado filmes de grande sucesso como O Rei Leão, A Bela e o Monstro ou Pocahontas..Iger foi, segundo os especialistas, o "salvador" da Disney. Pegou numa marca que estava a tornar-se irrelevante e transformou-a na gigante que hoje conhecemos..A conquista do império.A retoma começou com a aquisição da Pixar em janeiro de 2006, por seis mil milhões de euros. A Pixar, presidida por Steve Jobs, era um estúdio especializado em animação digital que tinha com a Disney um contrato de distribuição e que nos últimos anos lhe tinha garantido os maiores êxitos, com filmes como Toy Story, Monstros e Companhia ou À Procura de Nemo. Só com os seis filmes de animação digital feitos até então com a Pixar, a Disney teve receitas globais (cinema, DVD, direitos para distribuição e merchandising) de 2,6 mil milhões de euros..Perante o iminente fim do contrato de distribuição, a compra da Pixar tornara-se a única saída viável, defendeu Robert Iger, apesar de todas as vozes contrárias. E tinha razão, como veio a provar-se. A Pixar manteve a sua gestão própria (e também o espírito dos seus filmes) mas trouxe à Disney sangue novo, quer na animação quer na gestão, que fez toda a diferença..Depois disso, a Disney avançou para mais duas aquisições. Em 2009 comprou a Marvel Entertainment, por 3,7 mil milhões de euros, passando a ser proprietária de criações como Homem-Aranha, Vingadores ou X-Men, entre outros - o que lhe permitiu entrar num mercado que ia para lá do mundo das princesas (com um público tradicionalmente mais infantil e mais feminino), para entrar no universo dos comics (um público mais juvenil/adulto e mais masculino). E em 2012 pagou perto de 3,5 mil milhões de euros pela Lucasfilm, de George Lucas, tomando posse de todo o universo de Guerra das Estrelas e também de Indiana Jones..No ano passado, Iger estabeleceu um acordo com Rupert Murdoch para a maioria dos ativos de entretenimento da Fox - incluindo o estúdio de cinema (20th Century Fox)de redes de cabo como FX e National Geographic, por mais de 65 mil milhões de euros. Com esta nova aquisição vieram Os Simpsons e os filmes Avatar, de James Cameron..Além dos importantes conteúdos audiovisuais - disponíveis nos cinemas e nas várias plataformas da Disney -, estas marcas vieram alimentar a indústria de merchandising da Disney, incluindo o mercado dos videojogos onde a empresa ainda não tinha conseguido singrar, assim como os seus parques temáticos espalhados pelo mundo..Os filmes mais vistos.Em 2016, os filmes mais vistos no mercado norte-americano foram Rogue One: Uma História de Star Wars, À Procura de Dory e Captain America: Guerra Civil. Todos com a marca Disney. 2017 foi o ano de O Último Jedi e A Bela e o Monstro. Em 2018, a tabela era liderada por Vingadores: Guerra do Infinito, Black Panther e The Incredibles 2: Os Super Heróis..E depois chegámos a 2019, que foi o ano da Disney no cinema. Não há como negá-lo. No balanço final do box office da América do Norte, a Disney era responsável por oito dos dez filmes com mais receitas de bilheteira (cinco deles no topo da tabela)..Globalmente, a Disney conseguiu uma receita de 13 mil milhões de dólares só em bilhetes de cinema, com títulos como Vingadores: Endgame (o filme mais rentável de sempre, com 2,8 mil milhões de dólares), Star Wars: A Ascensão de Skywalker , O Rei Leão , Captain Marvel , Toy Story 4 e Frozen II . E ainda Homem-Aranha: Longe de Casa (em parceria com a Sony).."Ainda é possível levar as pessoas ao cinema", comentava no final do ano Cathleen Taff, diretora de distribuição da Disney. "O que acontece é que estamos a competir pelo tempo das pessoas. Se o filme não for muito bom, as pessoas têm outras opções. Mas quando é muito bom, as pessoas aparecem. E vimos isso neste ano, com sete filmes a fazerem mais de mil milhões de dólares.".Em todos os pequenos ecrãs.Apesar de ter os seus canais de televisão, a Disney percebeu que para se manter no topo tinha de ter também o seu próprio serviço de streaming. Além do serviço de conteúdos desportivos, a ESPN + (para já, com 7,6 milhões de assinantes mas com grande potencial de crescimento), e ao mesmo tempo que adquiria a Hulu, a empresa lançou em novembro do ano passado o serviço o Disney+, que oferece aos assinantes conteúdo dos catálogos de Disney, Marvel, Pixar, Lucasfilm e Fox. Entre os conteúdos originais, destaca-se a série The Mandalorian, que já tem a sua própria multidão de fãs e lançou uma nova figura: The Child (ou Baby Yoda)..Em menos de três meses, o Disney + ultrapassou os 28 milhões de assinantes na América do Norte. Até ao final de março, o canal começa a ser distribuído em alguns países da Europa (Espanha, França, Itália, Alemanha e Reino Unido) e gradualmente chegará a todo o globo. A Portugal chegará no verão, em data ainda por definir, com um preço para o consumidor de 6,99 euros por mês (ou 69,99 euros por ano) e a garantia de poder ver, por exemplo, as 30 temporadas de Os Simpsons e os nove episódios de Guerra das Estrelas..O streaming - com as suas novas regras na relação com o consumidor e a concorrência cerrada com a Netflix, a Amazon e outros serviços - representa um novo mundo para a Disney e este será, porventura, o maior desafio que o novo CEO enfrenta..Montanhas-russas e outras diversões.Ao todo, os parques de diversões da Disney receberam 157 milhões de visitantes em 2018 e foram responsáveis por metade dos quase 60 mil milhões de dólares faturados pela empresa. Esta também foi uma das áreas que cresceram durante o reinado de Bob Iger, e que era liderada pelo atual CEO, Bob Chapek. Nos últimos anos, a Disney preocupou-se não só em remodelar os parques mais antigos, que já estavam um pouco antiquados, como em chegar a novos mercados..Em 2016, abriu o parque de Xangai, na China, que no primeiro ano teve 11 milhões de visitantes e rapidamente se transformou num dos empreendimentos mais rentáveis do grupo. No ano passado, abriu na Florida um parque só dedicado à Guerra das Estrelas, o Star Wars: Galaxy's Edge..Atualmente, há parques da Disney em cinco países - Estados Unidos, França, China, Singapura e Japão. O maior complexo é o Walt Disney World, que fica na Florida (EUA) e tem uma área de 103,6 quilómetros quadrados, integrando vários parque, incluindo o mais famoso, o Magic Kingdom.