O disco saiu no final do ano passado, mas ainda hoje Ricardo Lima continua a ser abordado na rua por vizinhos e conhecidos da freguesia de Ramalde, uma das mais desfavorecidas do Porto. Mais conhecido por LS, é o autor da maior parte das letras, às quais também dá voz, de Cidade Líquida, o primeiro álbum dos Oupa!, um coletivo composto por jovens artistas de bairros sociais do Porto. Ricardo, 29 anos, atualmente licenciado em Ciência Política e com uma pós-graduação em economia, já fazia rap há mais de uma década, mas nunca antes tivera a oportunidade de fazer ouvir as suas rimas fora do meio onde reside. Até que, em 2016, Capicua assentou arraiais em Ramalde para a segunda edição das residências artísticas iniciadas um ano antes no bairro do Cerco, ao abrigo do programa Cultura em Expansão, da Câmara do Porto.."Foi uma proposta do então ainda vereador da cultura Paulo Cunha e Silva, que nos desafiou a realizar uma residência de hip-hop no Cerco", recorda ao DN a rapper Capicua, que, durante seis meses, passou a trabalhar num regime quase diário com os jovens desse bairro portuense, muito mais conhecido pelos problemas sociais..O resultado final foi depois apresentado num concerto no Rivoli, onde também foi apresentado um documentário da autoria de André Tentúgal, que acompanhou todo o processo não só como realizador mas também enquanto formador, nas áreas da promoção online e da realização de videoclips. "O objetivo inicial era levar ao centro o bairro, porque o Cerco continua muito isolado e marginal, quase como se a cidade realmente o cercasse e só através da cultura se conseguisse furar esse bloqueio", refere o também músico dos We Trust, para quem este projeto mostrou que "há talento e vontade" em todos estes bairros. "São miúdos muito generosos, com imenso para dar à comunidade, faltam-lhes é oportunidades, que não são de facto iguais para todos", defende André..E foi precisamente isso que estas residências, anos após ano, pretenderam ser, uma oportunidade para quem nunca as teve. Depois do Cerco, onde ficou a funcionar um estúdio de música comunitário, seguiu-se em 2016 a freguesia de Ramalde e no ano seguinte foram para Lordelo do Douro, para trabalhar em bairros como o da Pasteleira ou do Aleixo. Entretanto e depois de três anos no terreno, ao quarto decidiram consolidar o projeto com um disco, feito por alguns dos participantes das edições anteriores. "Selecionámos um dream team de oito elementos, oriundos de todos os bairros e, em vez das habituais oficinas, fomos acompanhando de forma mais espaçada o trabalho, de modo a dar-lhes mais autonomia", conta Capicua, que, em jeito de elogio, confessa não ter ficado muito surpreendida com o resultado final. "Talento é o que mais salta à vista neste grupo. Uma grande variedade de talentos, aliás, pois uns cantam, outros escrevem, alguns tocam." Desde o início que o trabalho feito nos bairros teve "a ambição de ter um resultado editorial". Um desejo cumprido finalmente no final do ano passado, com o disco Cidade Líquida, apresentado ao público com um concerto no Plano B. "Conseguimos que, a cada ano, o resultado final não fosse olhado com condescendência, mas sim como um bom espetáculo, a que valia a pena assistir, por ser consistente, e isso orgulha-nos muito", diz Capicua. Afinal, "todos os participantes já faziam música, apenas não tinham experiência de palco ou de estúdio". Mónica Sol, uma das vocalistas dos Oupa!, apenas costumava cantar para os amigos, mas agora vai passar a frequentar aulas de música. Tem 23 anos, vive em Lordelo do Douro, tirou um curso de gestão de turismo e trabalha em restauração, mas agora, mais do que nunca, acredita no sonho de um dia poder vir a viver da música. "Esta experiência foi uma lufada de ar fresco na minha vida. Passei a acreditar mais em mim. Se quisermos, é possível e vale a pena tentar", sublinha, com emoção..Como Capicua lembra, além de darem as ferramentas necessárias a futuros artistas, estas residências assentaram sobre dois eixos fundamentais: "Ter orgulho no coletivo a que cada indivíduo pertence e aproximar o centro da cidade aos bairros periféricos." O melhor exemplo desta filosofia aconteceu aquando da visita ao Porto do Presidente da República, que foi ouvi-los cantar ao Cerco. Como salienta Capicua, "isso foi um motivo de orgulho para toda aquela comunidade, porque o bairro foi notícia não pelos problemas, mas devido ao talento daqueles jovens".
O disco saiu no final do ano passado, mas ainda hoje Ricardo Lima continua a ser abordado na rua por vizinhos e conhecidos da freguesia de Ramalde, uma das mais desfavorecidas do Porto. Mais conhecido por LS, é o autor da maior parte das letras, às quais também dá voz, de Cidade Líquida, o primeiro álbum dos Oupa!, um coletivo composto por jovens artistas de bairros sociais do Porto. Ricardo, 29 anos, atualmente licenciado em Ciência Política e com uma pós-graduação em economia, já fazia rap há mais de uma década, mas nunca antes tivera a oportunidade de fazer ouvir as suas rimas fora do meio onde reside. Até que, em 2016, Capicua assentou arraiais em Ramalde para a segunda edição das residências artísticas iniciadas um ano antes no bairro do Cerco, ao abrigo do programa Cultura em Expansão, da Câmara do Porto.."Foi uma proposta do então ainda vereador da cultura Paulo Cunha e Silva, que nos desafiou a realizar uma residência de hip-hop no Cerco", recorda ao DN a rapper Capicua, que, durante seis meses, passou a trabalhar num regime quase diário com os jovens desse bairro portuense, muito mais conhecido pelos problemas sociais..O resultado final foi depois apresentado num concerto no Rivoli, onde também foi apresentado um documentário da autoria de André Tentúgal, que acompanhou todo o processo não só como realizador mas também enquanto formador, nas áreas da promoção online e da realização de videoclips. "O objetivo inicial era levar ao centro o bairro, porque o Cerco continua muito isolado e marginal, quase como se a cidade realmente o cercasse e só através da cultura se conseguisse furar esse bloqueio", refere o também músico dos We Trust, para quem este projeto mostrou que "há talento e vontade" em todos estes bairros. "São miúdos muito generosos, com imenso para dar à comunidade, faltam-lhes é oportunidades, que não são de facto iguais para todos", defende André..E foi precisamente isso que estas residências, anos após ano, pretenderam ser, uma oportunidade para quem nunca as teve. Depois do Cerco, onde ficou a funcionar um estúdio de música comunitário, seguiu-se em 2016 a freguesia de Ramalde e no ano seguinte foram para Lordelo do Douro, para trabalhar em bairros como o da Pasteleira ou do Aleixo. Entretanto e depois de três anos no terreno, ao quarto decidiram consolidar o projeto com um disco, feito por alguns dos participantes das edições anteriores. "Selecionámos um dream team de oito elementos, oriundos de todos os bairros e, em vez das habituais oficinas, fomos acompanhando de forma mais espaçada o trabalho, de modo a dar-lhes mais autonomia", conta Capicua, que, em jeito de elogio, confessa não ter ficado muito surpreendida com o resultado final. "Talento é o que mais salta à vista neste grupo. Uma grande variedade de talentos, aliás, pois uns cantam, outros escrevem, alguns tocam." Desde o início que o trabalho feito nos bairros teve "a ambição de ter um resultado editorial". Um desejo cumprido finalmente no final do ano passado, com o disco Cidade Líquida, apresentado ao público com um concerto no Plano B. "Conseguimos que, a cada ano, o resultado final não fosse olhado com condescendência, mas sim como um bom espetáculo, a que valia a pena assistir, por ser consistente, e isso orgulha-nos muito", diz Capicua. Afinal, "todos os participantes já faziam música, apenas não tinham experiência de palco ou de estúdio". Mónica Sol, uma das vocalistas dos Oupa!, apenas costumava cantar para os amigos, mas agora vai passar a frequentar aulas de música. Tem 23 anos, vive em Lordelo do Douro, tirou um curso de gestão de turismo e trabalha em restauração, mas agora, mais do que nunca, acredita no sonho de um dia poder vir a viver da música. "Esta experiência foi uma lufada de ar fresco na minha vida. Passei a acreditar mais em mim. Se quisermos, é possível e vale a pena tentar", sublinha, com emoção..Como Capicua lembra, além de darem as ferramentas necessárias a futuros artistas, estas residências assentaram sobre dois eixos fundamentais: "Ter orgulho no coletivo a que cada indivíduo pertence e aproximar o centro da cidade aos bairros periféricos." O melhor exemplo desta filosofia aconteceu aquando da visita ao Porto do Presidente da República, que foi ouvi-los cantar ao Cerco. Como salienta Capicua, "isso foi um motivo de orgulho para toda aquela comunidade, porque o bairro foi notícia não pelos problemas, mas devido ao talento daqueles jovens".