O futuro do PS após Costa já se joga nas presidenciais
Eleições presidenciais. Quem, no PS, apoia quem? Ana Gomes ou Marcelo Rebelo de Sousa? Ou ninguém? Aos poucos, as cartas vão sendo mostradas e, do que já se sabe, a linha de fratura é clara. O apoio (ou não apoio) a Ana Gomes reflete quem estará (ou não estará) com Pedro Nuno Santos quando este um dia se abalançar para uma candidatura à liderança do PS.
Que essa candidatura à liderança será um dia uma certeza ninguém tem dúvidas no PS. Só os imponderáveis da vida ou da política - um qualquer megaescândalo - irão tirar o atual ministro das Infraestruturas e da Habitação dessa corrida. Pedro Nuno evidentemente nunca concorrerá contra Costa, mas está disposto a esperar pacientemente até que o atual secretário-geral decida deixar a liderança para depois avançar.
Deixou-o muito claro - surpreendendo tudo e todos - em maio de 2018, no congresso nacional que o PS realizou em Alcobaça. Foi de tal forma explícito que António Costa sentiu necessidade de avisar. "A minha reforma pessoal ainda está longe." Insistindo: "Aviso já que não meti os papéis para a reforma." Já se sabe que Costa quer ser recandidato a primeiro-ministro pelo menos mais uma vez (a terceira).
Citaçãocitacao"Se a Ana Gomes é uma boa candidata? Na minha opinião, sim, enriquece o debate democrático. Se é uma boa candidata para ter o apoio do Partido Socialista, na minha opinião, não."
O que a candidatura de Ana Gomes fez para já foi revelar fraturas dentro do Governo e na cúpula do PS. Augusto Santos Silva e Carlos César puxam nitidamente contra a candidatura da antiga eurodeputada. E Pedro Nuno Santos puxa a favor.
O que toda a gente sabe, dentro do PS, é que Pedro Nuno está, através desta candidatura presidencial, a fazer o seu caminho à esquerda para um dia suceder a Costa; e ninguém ignora que, nesse percurso, não terá nem o apoio de Santos Silva nem o apoio de César. Dois moderados que, por exemplo, apoiaram Costa quando este recusou em 2019 esforçar-se por uma geringonça 2 - ao contrário de Pedro Nuno, que se bateu para que a solução de 2015-2019 fosse renovada.
O confronto saltou para o espaço público. O protagonista dos últimos dias foi Augusto Santos Silva. "Se a Ana Gomes é uma boa candidata? Na minha opinião, sim, enriquece o debate democrático. Se é uma boa candidata para ter o apoio do Partido Socialista, na minha opinião, não", disse o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, na terça-feira, à TVI.
E no dia seguinte, numa entrevista Renascença/Público, praticamente pediu a Marcelo que se recandidatasse: "Já temos bem presente no debate político um extremismo que põe como objetivo mudar o regime, e num sentido não democrático, e trazer para Portugal discussões moralmente repugnantes. Esse extremismo deve ser combatido com a força da moderação. Espero que surja uma candidatura suficientemente abrangente para que a grande maioria do eleitorado se reveja."
Explicitamente questionado nesta quarta-feira sobre Augusto Santos Silva, o ministro das Infraestruturas respondeu: "Quem decide quem o PS apoia são os órgãos do partido. Não é o Governo, não é nenhum membro do Governo, é mesmo o PS que decide quem é que apoia ou deixa de apoiar."
E depois disparou contra todos os que no PS criticam a candidata: "As pessoas não servem para o PS para fazer umas coisas de vez em quando, serem eurodeputadas, serem candidatas à câmara municipal ou membros do Secretariado Nacional, e depois, de um momento para o outro, passarem a ser vilipendiadas porque não lhes dá jeito."
Citaçãocitacao"Não se apoiar o Presidente da República em exercício não significa desconsideração, desrespeito, deslealdade. Vivemos numa democracia madura, e era só o que faltava que as pessoas e os políticos ficassem chateados uns com os outros porque não tiveram o apoio deste ou daquele."
Em suma: Pedro Nuno Santos vai apoiar Ana Gomes. Já o fez implicitamente, mas irá fazê-lo explicitamente, assim que a Comissão Nacional (CN) do PS - órgão máximo entre congressos - discutir a questão presidencial (numa reunião que está marcada para dia 24).
A CN determinará oficialmente o que já se sabe: o PS não irá apoiar ninguém; os dirigentes e militantes em geral terão liberdade de voto. A partir desse momento todos estarão à vontade para dizer de que lado da barricada irão ficar.
Será nessa altura que o ministro das Infraestruturas se posicionará oficialmente. Há muito que se sabe que uma opção já tinha excluído: apoiar Marcelo. Já o tornou claro tentando, em simultâneo, desdramatizar: "Não se apoiar o Presidente da República em exercício não significa desconsideração, desrespeito, deslealdade. Vivemos numa democracia madura, e era só o que faltava que as pessoas e os políticos ficassem chateados uns com os outros porque não tiveram o apoio deste ou daquele."
A seguir a essa reunião surgirão outros apoios dentro do PS à candidatura de Ana Gomes. É muito provável que o atual secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Duarte Cordeiro, o faça; ou o deputado Pedro Delgado Alves. Em comum com Pedro Nuno têm o facto de também terem sido líderes da Juventude Socialista. Cordeiro e Delgado Alves serão além do mais destacados apoiantes do atual ministro das Infraestruturas quando este um dia avançar para a liderança do PS. Quem também poderá formalizar apoio a Ana Gomes serão as líderes atuais da JS, Maria Begonha, e do Departamento Nacional das Mulheres Socialistas, Elza Pais.
O que falta saber é quem avançará contra Pedro Nuno Santos quando este partir para o assalto final à liderança. Fernando Medina tem sido dos nomes mais referidos - mas não tem tido vida fácil na presidência da Câmara Municipal de Lisboa.
A outra possibilidade é Ana Catarina Mendes. Para já, a atual líder parlamentar nada diz sobre quem apoiará nas presidenciais - ou sequer se apoiará alguém. Sendo claríssimo que não estará com Pedro Nuno Santos quando este se candidatar a líder, é portanto muito provável que não venha a estar agora com Ana Gomes.
Nesta quinta-feira, a candidatura presidencial da ex-eurodeputada recebeu o apoio formal do PAN - o segundo partido a apoiá-la, depois do Livre.
O anúncio seguiu-se a uma reunião da Comissão Política Nacional do partido e foi feito pela líder parlamentar. "O PAN decidiu apoiar a candidatura de Ana Gomes à Presidência da República", disse Inês Sousa Real, considerando que a antiga eurodeputada é uma "candidata forte e independente, que vai ao encontro do ideário e dos valores do PAN".
Ana Gomes "é a única candidata que se apresenta como progressista, humanista, europeísta e que sente a emergência climática" que o mundo atravessa "e as preocupações" dos jovens", justificou. E é "a única candidata que pela sua independência e pela transversalidade das suas ideias é capaz de agregar diferentes campos políticos, ativismos, gerações e diferentes sensibilidades, capaz de levar a eleição a uma segunda volta e vencer estas eleições".
A líder da bancada do PAN defendeu que "eleger Ana Gomes como Presidente da República irá representar um enorme avanço" e "derrubar mais uma pedra no muro da desigualdade de género, num país que, em cem anos de democracia, nunca teve uma mulher como Presidente da República".
Nota: Pedro Delgado Alves informou o DN que ainda não tomou posição sobre apoios e candidaturas presidenciais.