O futebol falado
Anda muita gente inflamada com a quantidade de horas que as televisões portuguesas estão a dedicar ao Europeu. Que é uma vergonha, uma overdose, uma coisa sem igual. Não é. É perfeitamente natural.
De dois em dois anos, aliás, é sempre a mesma conversa. Quem agora se queixa esquece-se disso. O que assistimos nos últimos dias foi o mesmo que já tinha acontecido no passado. Talvez até em menor dimensão do que há quatro anos. Em 2012, RTP, SIC e TVI partilharam os direitos de transmissão da prova que decorreu na Ucrânia e na Polónia. Naturalmente, por terem o produto principal - o futebol jogado nas quatro linhas -, as três televisões e respetivos canais informativos potenciaram ainda mais a competição. Porque ela lhes trazia audiências.
É muito futebol? É, sem dúvida. Sim, eu também critico o número de horas, os diretos cheios de coisa nenhuma, a falta de rigor e isenção, os psicodramas de Ronaldo e Quaresma. Mas, caramba, será que os dez segundos que medeiam entre a euforia e o pessimismo, tão habituais na tribo da bola, é um exclusivo do Euro 2016? Não, não é.
Sabendo como o futebol falado já preenche uma dose considerável de horas na televisão portuguesa, não é de espantar que uma competição como esta, ainda por cima quando Portugal assume publicamente a ambição de chegar ao título, tenha o destaque que tem.
Compreensivelmente, a RTP meteu toda a carne no assador, com um valioso e mediático naipe de comentadores. Os jornalistas, com a capacidade analítica de António Tadeia a ser uma evidente mais-valia para a leitura dos jogos, e os treinadores/ex-jogadores, grupo em que por exemplo Nuno Espírito Santo se tem revelado uma boa aposta.
Carlos Daniel continua a ser o mais brilhante de todos. Tem um saber enciclopédico e é um exímio gestor da linguagem e do tempo televisivos. Parecendo que não, é importante, como se percebeu com a experiência da TVI com Jorge Jesus.