O falhado golpe de judo contra Israel
Tal como na Antiga Grécia, os modernos Jogos Olímpicos supõem uma mensagem de paz. Infelizmente, desde a sua recriação em 1896, não faltam os exemplos de fracasso nesse nobre desejo: não só os beligerantes das duas guerras mundiais não hesitaram um segundo em prosseguir as hostilidades mesmo com a aproximação dos verões de 1916, 1940 e 1944, como os Jogos foram ao longo do século XX alvo de vários boicotes, os mais célebres sendo os de Moscovo 1980 e os de Los Angeles 1984.
Existe, claro, competição entre as potências por um lugar de honra no medalheiro, e o desejo de muitos países em se revelar David contra Golias. Se pensarmos, porém, que o desporto substitui lutas mais destrutivas, não virá grande mal ao mundo que os atletas compitam não só por si mas também por um hino e uma bandeira. Será, por exemplo, o que acontecerá na próxima semana no jogo de basquetebol entre os Estados Unidos e o Irão, países sem relações diplomáticas há 40 anos e com um historial de hostilidade. Não é sequer a primeira vez que se defrontam num jogo de seleções, basta recordar o Mundial de Futebol de 1998 em França.
Verdade seja dita que nem sempre o desporto permite uma luta sem violência. Nos Jogos de Melbourne em 1956, o ano em que os tanques soviéticos esmagaram uma revolta popular anticomunista em Budapeste, uma partida de polo aquático entre as seleções da URSS e da Hungria acabou com traços de sangue na piscina.
Mas o abandono nos Jogos de Tóquio de um atleta argelino por recusa de enfrentar um israelita volta a trazer para a ordem do dia a politização do desporto. É legitimo que o judoca argelino se sinta solidário com os palestinianos e a sua luta por um país. Mas rejeitar um adversário por causa das cores que veste, não sendo ato inédito, em nada acrescenta aos palestinianos. É simplesmente trazer o conflito político para a arena desportiva, nada ganhando o judoca num dos campos e perdendo tudo no outro. O seu selecionador foi solidário, as autoridades e o povo argelinos também, mas isso não lhe dá razão. Basta pensar que os descendentes dos palestinianos que permaneceram nas suas terras quando Israel nasceu em 1948 são hoje cidadãos israelitas e alguns até representam no desporto o Estado Judaico. Além disso, se é improvável um reconhecimento de Israel pela Argélia, dado o historial de aversão (os argelinos enviaram tropas nas guerras dos Seis Dias e do Yom Kippur), deve ficar bem presente o sucedido há quatro anos, quando um judoca israelita ganhou o ouro num torneio nos Emirados Árabes Unidos, mas os organizadores recusaram tocar o hino. Hoje, Israel e os Emirados têm relações diplomáticas e o primeiro-ministro de um e o príncipe herdeiro do outro conversam ao telefone.
Além disso, tendo em conta até o terror que sofreram os atletas israelitas em Munique em 1972, talvez encarar os Jogos Olímpicos como o tal verdadeiro momento de tréguas fizesse todo o sentido.