O eterno fantasma da extrema-direita

O próximo ano vai ficar marcado pelas presidenciais que podem mudar não só o destino do país mas de todo o projeto europeu
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França está no mapa da rota eleitoral de 2017 que pode mudar definitivamente a face da Europa nos próximos anos. E, até ao resultado final das eleições - que se vão dividir em duas voltas, com a primeira a acontecer a 23 de abril e a segunda a 7 de maio -, tudo pode acontecer. Os franceses afastaram os suspeitos do costume (fora da corrida estão já Sarkozy, Juppé e Hollande), abrindo caminho a candidatos menos convencionais e baralhando as contas para o ano que vem.

Com uma subida constante nos índices de popularidade e nas sondagens, Marine Le Pen, líder da Frente Nacional, é uma candidata incontornável na corrida ao Eliseu, mas a sua retórica nacionalista e anti-imigração pode não sobreviver à campanha eleitoral. "O desafio, caso a Frente Nacional ganhe, é perceber se conseguirá tornar-se um partido mais moderado como aconteceu em Itália, onde um partido neofascista se transformou num partido de direita moderado, ou se vamos ver fenómenos como os que estão a acontecer na Polónia e na Hungria, onde esses partidos estão a ameaçar o sistema político", afirmou ao DN o politólogo António Costa Pinto, acrescentando que a Frente Nacional, ao contrário de outros partidos na Europa que surgiram ou ganharam preponderância nos últimos anos, é uma força consolidada na política francesa.

Mas nem tudo vai bem no reino da Frente Nacional. A tensão e as divergências entre Florian Philippot, vice-presidente do partido, e Marion Maréchal-Le Pen, sobrinha da líder e deputada da Frente Nacional, sobre a linha ideológica da Frente Nacional vão continuar a marcar o início do próximo ano, mostrando que há fraturas dentro de um partido que se quer afirmar como o expoente máximo da unidade em França.

Na direita moderada, a escolha do candidato ficou fechada ainda em 2016 com a eleição de François Fillon, como o (improvável) candidato d"Os Republicanos e com uma mobilização maior do que seria de esperar com mais de quatro milhões de franceses a comparecerem às primárias deste partido. Já a escolha do candidato do Partido Socialista vai dominar o início de 2017 e a vitória de Manuel Valls, ex-primeiro-ministro de Hollande, não está garantida. Na corrida estão também Arnaud Montebourg, ex-ministro da Economia, e Benoît Hamon, ex-ministro da Educação, entre outros. Na estrada desde o verão, estes candidatos têm percorrido todo o país em busca de apoios para as primárias, que vão acontecer já a 22 e 29 de janeiro. Uma vantagem face a Valls ,que só arrancou com a sua campanha em dezembro.

Fora de quaisquer primárias ficou Emmanuel Macron, ex-ministro da Economia e protegido de Hollande, que decidiu lançar o seu próprio movimento (En Marche) e afirma ter mais de 120 mil inscritos. "Macron já conseguiu apoios políticos importantes, mas não é claro que ele vá conseguir o apoio suficiente. Neste momento, trata-se de um movimento virtual porque para governar ele vai precisar do apoio e da estrutura de um partido", disse ao DN Gilles Sengès, jornalista do L"Opinion. O candidato independente conta entrar no eleitorado da esquerda e centrista que acusa o cansaço e a desconfiança de anos de alternância entre Partido Socialista e Republicanos.

Para além das figuras que mostram a polarização das tendências no debate político francês, o país está à procura de um novo modelo de crescimento económico. A escolha parece centrar-se no programa eleitoral de François Fillon, que quer uma administração pública mais pequena (com menos 500 mil funcionários) e uma segurança social menos pesada, cortando impostos aos cidadãos e às empresas. "A esquerda afirma que será o fim do Estado social e do modelo francês. A campanha em França será à volta desta discussão", concluiu Gilles Sengès.

Ao mesmo tempo, a definição da identidade nacional e a ameaça do terrorismo estão no topo das questões a que os franceses querem resposta antes de se deslocarem às urnas. Em dezembro, ainda antes dos ataques em Berlim, o estado de emergência foi prolongado até julho de 2017, incluindo ainda o período das eleições. Este é o período mais longo de reforço da segurança nacional em França desde a guerra da Argélia. "É uma questão que ninguém discute. Há um acordo nacional sobre a necessidade deste reforço porque sabemos que os atentados não vão parar. Claro que a identidade nacional associada a estes ataques é a grande carta da Frente Nacional nas eleições", referiu ainda o jornalista francês.

Mas mais do que França, uma possível subida ao poder de Marine Le Pen põe em causa o projeto europeu, já que o traço antieuropeísta da Frente Nacional é também uma das suas maiores bandeiras e a candidata já afirmou que uma das suas medidas será referendar a permanência de França na União Europeia.

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