O "adeus" do líder que antes de o ser já moldava o CDS à sua imagem. E agora?
É daquelas histórias sobre alguém que antes de o ser já o era. Paulo Portas, o jornalista, foi desde tenra idade um dos ideólogos de uma nova direita. Uma direita que viria a ter o seu cunho e que começou a ser forjada nas páginas d'O Independente, o extinto semanário que o líder do CDS-PP fundou (e depois dirigiu), em 1988, ao lado de Miguel Esteves Cardoso.
Sempre com o cavaquismo em ponto de mira, o jovem Portas sonhava com um partido liberal e conservador, moderno, mas eurocético e antifederalista. E, nos bastidores, não conteve esse ímpeto, que canalizou para o CDS. Manuel Monteiro era o presidente dos centristas, mas Portas já ia dando forma ao partido. Na palavra - chegou a escrever discursos para o então líder -, nas bandeiras e até nas figuras.
Em 1995, findo o cavaquismo, e de malas feitas do jornalismo, Portas (que em tempos abjurara a política), cruzou a fronteira. Nesse mesmo ano foi cabeça de lista em Aveiro e chegou ao Parlamento. A partir daí, começou a dinamitar o entendimento com Monteiro - dizendo, por exemplo, que apoiaria Cavaco Silva para a Presidência da República - e em 1998 consumou o "assalto" ao poder. Derrotou Maria José Nogueira Pinto (apoiada por Monteiro) e ficou ao leme do CDS, rebatizado, entretanto, como Partido Popular.
De eurocéticos, Portas e o CDS foram-se transformando em eurocalmos. A Europa já não era uma "questão de fé"; Portugal, sim. E só assim, com Jorge Sampaio em Belém, conseguiu a aliança com o PSD de Durão Barroso e chegou ao Governo em 2002, do qual foi ministro da Defesa. Uma união que foi reeditada com Santana Lopes quando Durão rumou a Bruxelas.
Porém, antes, a renovada AD (Portas/Marcelo Rebelo de Sousa), para as europeias de 1999 e legislativas do mesmo ano, claudicou. Caiu por terra ainda antes de ser uma realidade. Portas ficou, Marcelo saiu. Ironia do destino, 17 anos depois, Portas abandona o Largo do Caldas, Marcelo toma conta de Belém.
Em 2005, após Sampaio dissolver a Assembleia da República e de José Sócrates alcançar a maioria absoluta, afastou-se e Ribeiro e Castro tomou as rédeas do CDS. Não resistiu ao divórcio e regressou dois anos depois, derrotando o então líder no Congresso.
Voltou a fazer o caminho sobre as pedras na oposição, calculando milimetricamente as aproximações e os afastamentos em relação ao PSD. Até que em 2011, chegou o PEC IV e Passos precipitou a queda de Sócrates. Portas voltou a "casar-se" com "os laranjinhas".
Num Executivo em que começou com a pasta dos Negócios Estrangeiros, acabou por ser "promovido" a vice-primeiro-ministro com a crise "irrevogável" de 2013. Escreveu uma página importante na diplomacia económica, mas a reforma do Estado, a que Passos o colou, ficou pela rama.
Agora, e uma vez que "o ciclo político mudou", Portas sai de cena e altera o guião que desde os tempos d'O Independente vinha a escrever. Não quer voltar a ser oposição e deixa esse palco aos que consigo ganharam protagonismo. No fundo, ao portismo sem Portas. Ao partido que, por sua influência, somou PP à sigla, deixa sobretudo um desafio: o da sobrevivência - provar que o CDS não era o partido de um homem só.