Novo bispo das Forças Armadas: "A minha avó testemunhou o 13 de outubro de 1917"
Nasceu a 24 de dezembro de 1964 em Urqueira, aldeia próxima de Fátima, o que poderia ser já um sinal que dele algo se esperaria, mas a família não o imaginava mas também não ficou surpreendida quando aos 11 anos lhes pediu para entrar no seminário. A avó, que dava pelo nome de Júlia de Jesus, foi uma das testemunhas do 13 de outubro de 1917. Com ela aprendeu muitas histórias da Cova da Iria, com ela aprendeu a oração, mas foi com toda a família, "uma família de crentes", que Rui Valério entrou na igreja pelo batismo e na catequese.
Ao DN conta que foi uma experiência traumática que lhe ensinou o caminho da confiança para Deus e o levou até ao sacerdócio. Num dia de frio, aquecia-se na escola da aldeia junto à fogueira, quando uma fagulha lhe apanhou a perna esquerda, queimando-a ao ponto de a encurtar. Foi levado para o hospital. Durante meses sujeitaram-no a várias intervenções cirúrgicas, que não tiveram sucesso. Tinha 8 anos, diz que nunca pensou que iria morrer, "uma criança não pensa nisso", mas pensou que a perna não seria recuperada, mas acreditou em Deus e teve confiança. "À medida que iam acontecendo os insucessos da medicina e da ciência, a minha fé e a minha confiança em Deus aumentava, tornou-se inabalável, acreditava que tudo ia correr bem. Eassim foi, embora ainda tenha marcas. Mas esta experiência de confiança levou-me até Jesus Cristo e ao querer entrar no seminário", conta ao DN. E só o conta porque "quem me conhece sabe da história. Foi a experiência que me marcou".
Aos 11 anos, vai para o seminário da Ordem dos Monfortinos, em Fátima, onde fica até ao 12.º ano, altura em que vai para Itália, Bari, para uma das casas destes missionários e aí, diz, aconteceu aquilo que o "fascinou e o enamorou de Jesus Cristo, aquilo que consolidou a minha decisão para o sacerdócio". Tinha uns 19 ou 20 anos. E nunca se arrependeu, "sou um padre feliz". Um padre que ficou surpreendido com a nomeação feita neste sábado pelo Papa Francisco que o torna bispo das Forças Armadas e das Forças de Segurança Portuguesas. "Não sei como é que o Papa se lembrou de mim", confessa, embora o seu percurso, primeiro como capelão no Hospital da Marinha e depois na Escola Naval, lhe tenha dado alguma experiência. Como padre e como militar, "os capelães são oficiais, fui cadete, fiz serviço de campo, andei em navios, no Escola Sagres, o que me ajudou a perceber a realidade destes homens e destas mulheres militares e que servem o país".
Foi como capelão no Hospital da Marinha que iniciou o sacerdócio, no início dos anos de 1990. Ali e depois na Escola Naval contactou com homens e mulheres que assumem "a missão de servir a pátria, o país e os outros", tendo sempre por base "os princípios da integridade e da grandeza da honra". O desafio que lhe é pedido agora "é o mesmo que o Papa Francisco pede a qualquer outra paróquia: o da Santidade, da renovação da fé e dos valores do evangelho".
O padre Rui Valério, que sucede ao bispo do Porto, Manuel Linda, será ordenado bispo a 25 de novembro, numa celebração no Mosteiro dos Jerónimos, juntamente com o cónego Daniel Batalha Henriques, nomeado novo bispo auxiliar de Lisboa.
Rui Valério tem agora 53 anos e fala com o DN por telefone, enquanto espera por casais das equipas de Nossa Senhora. Apesar da nomeação e das novas funções não irá parar. É na paróquia da Póvoa de Santo Adrião que está em missão desde 2011, mas já lá tinha estado em 1996. Fez um interregno por Louvaine, na Bélgica, para estudar na Ordem, e pelo Alentejo, pela paróquia de Castro Verde. Terra onde aprendeu o cante alentejano, chegando a integrar o grupo Vozes do Campo Branco, "foram tempos muito importantes para mim". Mas o regresso à Póvoa também o foi e confessa: "Vivemos tempos em que o sentido de missão está na ordem do dia e ser sacerdote é uma missão que me preenche."