No mercado de Natal cada banca tem uma história
Na Praça do Município há sardinhas de pano e malas de cortiça bordadas, peças em filigrana e caixas de fruta reciclada com mensagens personalizadas. As histórias do DN também lá estão, na banca do jornal onde qualquer pessoa pode encomendar a primeira página do dia do seu aniversário ou de outra data importante. Há mais histórias, como as das artesãs que decidiram dar um rumo novo às suas vidas, depois de terem deixado de ter lugar numa escola, por exemplo. Esta é a história de Teresa Barreto. Deu aulas de Trabalhos Oficinais durante vários anos e no primeiro em que não conseguiu colocação na escola decidiu começar a bordar em casa - o impulso nasceu depois de ter encontrado uma máquina de bordar numa loja. Comprou-a.
Começou a vender os primeiros trabalhos em pequenas feiras e há 20 anos que esta é a sua atividade principal. Borda sobretudo sacos do pão e "puxa-sacos", aventais, babetes e fraldas, toalhas e T-shirts.Aceita trabalhos por encomenda, mas no ano passado decidiu arriscar e usar um material novo, de olhos postos nos turistas: a cortiça.
"Ainda não vi ninguém bordar cortiça como eu", diz. Foi uma aventura, até porque ao início se debateu com dificuldades, mas agora já consegue trabalhar fechos e botões e moldar a cortiça à sua vontade. Borda caixas para os óculos, e carteiras, pequenas e grandes, de variadas formas. A inspiração acontece-lhe, muitas vezes, durante a madrugada. "Há dias em que começo a bordar às dez da manhã e só termino às três... da manhã." Há pedidos especiais e outros engraçados, o último foi uma encomenda de vários babetes bordados, mas para adultos. "Era para oferecer num jantar", conta.
O que faz é um trabalho de paciência, insistência, mas sobretudo de paixão, mas Teresa reconhece que as pessoas "dão valor" ao que faz. Na Praça do Município, os curiosos passam e às vezes ficam a observar a artesã na máquina de bordar. Teresa Barreto costuma pedir para não se aproximarem muito, não se vá repetir o episódio de há dias, quando um curioso simulou que ia bordar a própria gravata e acabou preso à máquina. Acabou com uma gravata cortada e uma história para contar.
De várias histórias também se faz a vida de Christy Chan. É jurista, nasceu na África do Sul, onde viveu vários anos até se mudar para Macau. Chegou a Portugal e a Cascais, onde agora vive, há três anos, e decidiu fazer uma pausa no Direito. "Sempre gostei imenso de anéis e fazia muitos para mim e depois as amigas começaram a pedir e acabei a fazer para vender." Na banca que está no mercadinho de Natal da Praça do Município vende os anéis, mas também brincos e colares com pedras e cristais e vários trabalhos de filigrana, não de ouro ou prata - "é muito caro e não posso investir" - mas de um fio especial que encomenda fora de Portugal.
Os trabalhos de filigrana são os que lhe tomam mais tempo, uma das gargantilhas que tem exposta custou-lhe quatro horas de paciência. "É um método simples", explica, "mas muito minucioso". O fio passa entre os seus dedos e vai sendo moldado até surgir a forma que Christy deseja. Além das peças de filigrana, vende também pirogramas, onde aproveita a madeira de caixas de fruta, que depois trata e onde escreve mensagens personalizadas. "São um sucesso", revela.
Também recebe encomendas, as últimas foram de um crucifixo de 50 centímetros de filigrana - demorou um mês a acabar - e a mais demorada foi uma réplica, igualmente de filigrana, da caravela Sagres. "Foi um grande desafio, foram quase três meses de trabalho", conta.
Anabela Ferreira também encontrou uma nova vida no artesanato depois de ter deixado o trabalho de secretária, que exerceu durante 20 anos. Sempre gostou de trabalhos manuais e quando ficou sem emprego decidiu montar um ateliê com loja no Bairro Alto, em Lisboa. Vendia artesanato e objetos de design. Ainda passou pela LX Factory até perceber de que gostava mesmo era de pôr "as mãos na massa, fazer as coisas". Mudou-se em definitivo para a zona da Sé, em Lisboa, onde divide um ateliê e loja que vende a sua marca, Nalua design, onde as peças mais populares são sobretudo as sardinhas de pano, de todas as cores e tamanhos.
"Posso dizer que vivo praticamente das sardinhas", confessa. Vende para hotéis e empresas, em grandes quantidades, mas também para o estrangeiro. "Há muitos países onde este peixe é símbolo nacional", explica. Ainda há pouco tempo costurou centenas de sardinhas de pano para o Museu das Conservas, na Noruega. A Nova Zelândia também é fã da sardinha, de França recebe encomendas de pequenos pássaros de pano e já costurou Bretzel para um cliente da Alemanha.
Se as sardinhas de pano estão por todo o lado em Lisboa, e no mundo, os tecidos coloridos e únicos são o que distingue as sardinhas de Anabela.
"Encomendo tecidos de Bali, por exemplo, mas também uso nacionais. Encontro muitos nas minhas viagens, levo sempre uma das malas vazia só para trazer tecidos", revela. Por agora, são as sardinhas que lhe permitem viver da sua arte. E as da Anabela Cartaxo são lindas.