Ninfa de Isabel Allende revela a fantasia de cada leitor

Com ilustrações de Ana de Lima, foi ontem lançado em Portugal a única incursão da escritora chilena no mundo dos livros de colorir.
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Uma fotografia do ator norte-americano Ray Bolger e um retrato de mulher do pintor inglês Dante Gabriel Rossetti serviram de inspiração à ilustradora Ana de Lima para delinear as duas principais personagens do conto A Ninfa de Porcelana, de Isabel Allende, ontem lançado em Portugal. Um livro em que a ilustradora galega deixa de fora uma das fases habituais do seu trabalho, ficando para cada um dos leitores a tarefa de o colorir.

O processo de trabalho, que decorreu durante cerca de cinco meses, começou pela leitura, várias vezes, do conto que, confessa, não conhecia. "Depois documento--me, passeio, vejo livros, procuro na internet, para decidir o estilo do livro, das diferentes cenas, das personagens. Ainda que o primeiro impulso seja começar a desenhar imediatamente, o melhor é conseguir uma certa distância para ordenar todas as possíveis ideias até que, por fim, fica claro o caminho a seguir e como o desenvolver."

É depois desse processo que fica atenta a tudo o que a rodeia porque, avança, "a inspiração que te dá a chave pode vir de onde menos esperas. E foi isso mesmo que aconteceu com o protagonista do conto da escritora chilena, Don Cornelio, um "senhor míope, vestido com um fato cinzento", nas palavras de Isabel Allende, que ganhou forma nos traços de Ana de Lima inspirado no ator Ray Bolger (1904-1987) que ficou conhecido pelo seu papel como Espantalho no Feiticeiro de Oz (1939). "Durante uma visita a uma exposição de fotografia, em Barcelona, descobri um retrato do ator Ray Bolger e foi essa fotografia que me deu uma referência para Don Cornelio: delgado, com nariz e orelhas grandes", conta ao DN a ilustradora, a partir de Nuremberga, na Alemanha, onde vive, apesar de manter forte relação com Barcelona, onde realizou várias formações na área da ilustração na Escola BAU.

Características físicas que contrastam com as da ninfa, outra protagonista do conto da escritora que ganhou o reconhecimento mundial logo com o seu primeiro romance, A Casa dos Espíritos. "As personagens foram o maior desafio neste projeto", conta Ana de Lima, natural da Corunha, em Espanha, onde nasceu (1977) e se licenciou na Escuela Superior de Diseño y Moda Goymar. Com um trabalho de ilustração fortemente inspirado por elementos da natureza, na composição das personagens saiu da sua zona de conforto. Com uma dificuldade acrescida. No caso concreto da ninfa, "o conto descreve-a minuciosamente - uma dama roliça, com caracóis e calçando sandálias de gladiador - e, aqui, a inspiração acabou por surgir ao folhear uma revista de moda em que vi um retrato de mulher do pintor pré-rafaelista Dante Gabriel Rossetti [1828-1882], uma mulher com muitas curvas, rechonchuda". E foi assim, sem estar verdadeiramente à procura, "em momentos em que estava a olhar mas sem procurar", que surgiram as duas principais personagens, ponto de partida para este projeto.

"Neste caso foi fundamental começar pelas personagens. Embora sejam descritas no texto, era importante dotá-las de uma identidade que estivesse em linha com a ideia com que Isabel Allende as criou." E este foi mesmo o seu maior desafio: "Queria estar à altura das expectativas da autora e também captar e manter as suas características psicológicas em todas as cenas."

A ilustradora reconhece que o que lhe deu mais prazer foi "a criação dos elementos da natureza que, sendo um recurso muito presente na minha obra, aqui consegui desenvolver estes elementos formando parte de uma história mágica e de fantasia". Uma fantasia que Don Cornelio também encontra, de uma forma surpreendente, no decurso da história. Mas isso fica para cada um descobrir.

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