Mulher morta na Golegã. GNR e PSP desconheciam "plano de segurança"

Ana Maria Silva foi morta a tiro este domingo. Tinha feito queixa à GNR e o Ministério Público definiu medidas de proteção de que as autoridades nunca ouviram falar
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O Ministério Público terá pedido um plano de segurança, que consistia "no estabelecimento de contactos periódicos com a vítima" e "o reforço do patrulhamento junto do local da residência" de Ana Maria Silva, a mulher de 53 anos, assassinada pelo ex-namorado, este domingo à noite, na Golegã. A mulher já tinha feito queixa de violência doméstica em setembro - o que foi confirmado ao DN pela GNR de Santarém, e pelo Procuradoria-Geral da República (PGR). Mas as autoridades desconhecem o plano de proteção à vítima.

"Confirma-se a existência de uma queixa, a qual deu origem a um inquérito. No âmbito do mesmo, o suspeito foi constituído arguido", esclarece o Ministério Público [MP], que diz ter sido então elaborado o tal "plano de segurança". O MP não esclareceu a que força de autoridade - e de que área - foi solicitado o plano de segurança e se este chegou a ser posto em prática.

Ana Maria Silva acabou morta pelo antigo companheiro à porta da Danceteria São Martinho, junto à Estrada Municipal 118, na Golegã. Estava com um amigo e foi atingida nas costas com "pelo menos dois tiros de caçadeira", segundo comunicado da Polícia Judiciária. O amigo que a acompanhava sofreu ferimentos ligeiros.

Na resposta enviada ao DN, a PGR esclarece que "a investigação ainda não estava concluída, tendo o Ministério Público ordenado a realização de diligências complementares às já realizadas pela GNR". E aponta a elaboração de um plano de segurança, quando questionado sobre que medidas de proteção foram disponibilizadas à vítima.

O Comando Territorial da GNR de Santarém afirma desconhecer essa recomendação do Ministério Público, mas que a existir um plano de segurança, este deveria ser posto em prática pela PSP de Torres Novas - a vítima tinha-se separado no verão de 2018, e deixado a sua casa na Chamusca, onde chegou a viver com o homicida e os seus três filhos, todos maiores.

Mudou de cidade para fugir do ex-namorado

Amigos e familiares acreditam que a mulher se mudou para Torres Novas - cidade onde estava a trabalhar - também para fugir do ex-namorado. Ana Maria Silva viveria até muito perto da esquadra da PSP, mas também aqui as autoridades afirmam desconhecer um plano que poderia ter evitado que a mulher se tornasse a 11ª vítima mortal do crime de violência doméstica este ano.

O alegado autor do homicídio de Ana Maria Silva e de tentativa de homicídio do homem que na altura a acompanhava foi detido fora de flagrante delito. O empregado fabril de 62 anos estava em casa de uma irmã, em Torres Novas, e terá confessado os crimes, sem oferecer resistência à detenção.

Antes de ir viver para Torres Novas, Ana Maria Silva tinha uma oficina de cerâmica onde produzia louça regional e painéis de azulejos, na Chamusca.

Ana Maria Silva entra assim para a estatística negra das mortes devido a violência doméstica e dá eco às conclusões do último relatório do Observatório de Mulheres Assassinadas. Na análise da idade das vítimas ao longo dos anos, o OMA chegou à conclusão de que grupo etário mais vitimizado pelo femicídio por violência de género é o das mulheres com idades superiores a 50 anos: são 179 dos 475 femicídios registados entre 2004 e 2018, logo seguido das mulheres que se encontram no escalão etário 36 - 50 anos: neste grupo foram 140 as mulheres assassinadas.

O ano passado morreram 28 mulheres vítimas deste tipo de crime, mais sete do que em 2017. Na maioria destas mortes, o mesmo contexto: o homicídio surge após "um contínuo de violência que, em muitas das situações, era do conhecimento de terceiros (vizinhos/as, amigos/as, familiares)".

"O assassinato e atentado à vida destas mulheres ocorreram, na sua esmagadora maioria, em contextos de violência doméstica, em grande parte de conhecimento geral, sem que isso tenha sido potenciador ou suficiente para evitar os crimes contra elas praticados", sublinha o documento do OMA, que exige menos burocracia e "uma ação de terreno diária, de aproximação das organizações, das polícias, dos tribunais, e com o apoio de toda a sociedade, também do Estado e do Governo".

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