Morreu o escritor Amos Oz

Após lutar contra um cancro, o polémico escritor israelita Amos Oz faleceu hoje.
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O premiado escritor Amos Oz morreu hoje aos 79 anos. Amos Oz nasceu em Jerusalém em 1939.

Publicado em Portugal, onde os leitores sempre apreciaram as suas obras, posições políticas e as críticas que fazia ao conflito que opõem palestinianos e o seu pais. A última obra de Oz foi publicada em Portugal há poucas semanas intitulava-se Caros Fanáticos - Fé, Fanatismo e Convivência no Século XXI.

O DN entrevistou-o em 2016 a propósito do seu romance Judas. Leia a entrevista, em que confronta as suas posições políticas, religiosas e militares de forma muito aberta.

A notícia da morte do escritor foi notícia em todo o mundo após a filha o ter revelado no Twitter e o jornal israelita Haretz a ter divulgado em termos elogiosos, apesar das sua contestação polémica à atividade militar interminável com os vizinhos do seu país natal. Para Amos Oz a solução do conflito isrelo-palestiniano era a existência de dois estados e o retomar de um diálogo urgentemente.

Curiosamente, em entrevista que deu em abril deste ano, Amos Oz defendeu que todos os países com embaixada em Telavive a deveriam mudar para Jerusalém: "Todos os países devem mudar a sua embaixada para Jerusalém e seguir a atitude do Presidente Trump." Defendia também que em simultâneo esses mesmos países deveriam abrir uma representação diplomática na capital do povo palestiniano.

Mas era pela literatura que Amos Oz era reconhecido mundialmente, considerado um dos três maiores escritores israelitas contemporâneos. A sua obra, traduzida e premiada em inúmeros países, refletia bastante esta situação de conflito. Entre a sua produção estão romances, ensaios, novelas, contos, além de uma vasta produção jornalística, sempre muito influenciados pela sua experiência no serviço militar de três anos no exército israelita. Durante a Guerra dos Seis Dias, em 1967, e na Guerra do Yom Kippur, em 1973, Oz voltou a incorporar as forças militares.

A sua morte surpreendeu os seus leitores, sendo que a sua filha Fania Oz-Salzberger revelou que o pai "acabara de falecer, após uma deterioração rápida da sua saúde, em paz enquanto dormia, rodeado dos que o amam." A historiadora era uma das três filhas do escritor, que cresceu no kibbutz Hulda e desde cedo se interessou por filosofia e literatura.

Começou a publicar em 1961 e o seu mais recente romance, Judas, foi um sucesso, tendo integrado a lista de finalistas do Man Booker Prize. Em quase todos os seus livros estavam presentes as memórias do tempo em que combateu.

Ao questionar-se a razão de ter escrito Judas, Amos Oz disse ao DN que era "por muitas razões, mas entre elas está o facto de ter sido chamado muitas vezes de traidor por muitos dos meus compatriotas. Até por causa deste livro!."

Quanto ao facto de a literatura israelita estar demasiado focada no seu próprio país como se fosse uma missão, Amos Oz justificou que "o escritor escreve sobre o que sabe melhor. Saramago escreveu principalmente sobre Portugal. García Márquez sobre a América Latina e Tolstói sobre a Rússia. Essa é a natureza da literatura. Quanto mais provinciano se é mais universal se torna. Se escrevesse um romance passado em Honolulu seria um erro."

O facto de colocar Judas como o fundador do cristianismo, o único e último cristão, era considerado pelo escritor como uma grande provocação. Na própria resposta ao DN usa a ironia de forma provocatória: "Não sei como dizer de outro modo, porque quando aconteceu a crucificação, naquela sexta-feira, eu estava numa consulta no dentista e desconheço como tudo ocorreu. O que sei é que na Bíblia a história do beijo de Judas e do pagamento de 30 dinheiros - 600 euros na moeda de hoje - a alguém que era rico não é muito convincente, portanto o protagonista Samuel pensa numa versão alternativa. Que Judas é o mais crente em Jesus; que até acredita mais em Cristo do que o próprio; que, quando o beijou para o identificar, fê-lo desnecessariamente, pois todos sabiam quem era Jesus. Nem este alguma vez disse: 'Não sou Jesus, sou Berlusconi!'"

No que respeita à guerra israelo-árabe, Amos Oz era perentório, tanto que defendeu a invasão do Líbano: "Há uma diferença entre ser pacifista e um ativista da paz. O pacifista acredita que se pode dar a outra face ao agressor, eu não. Ou considera que a guerra é o último passo e eu não penso assim. No entanto, se me perguntar se defendo as atuais políticas de Israel, a resposta é não. Sou contra, mas não por ser pacifista, antes por achar que a política atual do governo é egoísta e perigosa."

A fama do escritor ultrapassava as fronteiras do seu pais, sendo traduzido também em árabe. Amos Oz tinha orgulho nessa situação e apreciava que "os meus livros tenham sido vendidos ilegalmente em muitos países árabes".

O escritor era presença constante nos candidatos ao Prémio Nobel, mas nunca o venceu.

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