Morreu a atriz Ruth Escobar
A atriz e produtora Ruth Escobar morreu na tarde de quinta-feira (dia 5) aos 82 anos, informou a Associação de Produtores de Espetáculos Teatrais do Estado de São Paulo (Apetesp). A atriz sofria de Alzheimer desde 2000 e estava internada há um mês no Hospital Nove de Julho.
Maria Ruth dos Santos Escobar nasceu no Porto, em Portugal, em 1936, e mudou -se para o Brasil em 1951, com 15 anos. Pouco depois, casou com o filósofo e dramaturgo Carlos Henrique Escobar, com quem embarcou para a França em 1958, para estudar interpretação.
De regresso ao Brasil, Ruth Escobar montou a companhia Novo Teatro, com o diretor Alberto D'Aversa, e protagonizou peças escritas ou encenadas pelo marido, Carlos Henrique Escobar. Foi a estrela de espetáculos como Antígone América (1962), Mãe Coragem e Seus Filhos, de Bertolt Brecht, em 1960, e Males da Juventude, de Ferdinand Bruckner, em 1961, ambas dirigidas por D'Aversa.
Em 1963, abriu o Teatro Ruth Escobar, na Bexiga, região central de São Paulo. Casada com o arquiteto Wladimir Pereira Cardoso, que se tornou o cenógrafo de suas produções, Ruth Escobar produziu grandes montagens, como A ópera dos três vinténs (1964), de Bertolt Brecht e Kurt Weill, com encenação de José Renato; O casamento do Sr. Mississipi (1965), de Dürrenmatt, dirigida por Jô Soares; As fúrias (1966), de Rafael Alberti, com encenação de Abujamra; até Lisístrata (1968), de Aristófanes, encenada por Vaneau.
Em meados dos anos 60, Ruth Escobar criou o projeto Teatro Popular Nacional: transformou autocarros em palcos e levava peças para várias regiões de São Paulo, como por exemplo A Pena e a Lei, de Ariano Suassuna.
Sempre a inovar, em 1968, reformou uma antiga garagem na rua 13 de maio, em São Paulo, para produzir a peça Cemitério de Automóveis, adaptação de um texto de Fernando Arrabal. O Globo escreve que nesta época, Ruth Escobar foi "a mais ousada empreendedora teatral do país": "A montagem consagrou não apenas a capacidade de realização da produtora, mas o talento da atriz Ruth Escobar, que protagonizou a obra ao lado de Stênio Garcia em meio a máquinas, carcaças de veículos, motores, guindastes", escreve o jornal. O crítico Sábato Magaldi considerou este espetáculo um marco no teatro brasileiro.
Logo a seguir, Ruth Escobar fez O Balcão, de Jean Genet, com o qual ganhou o troféu Roquette Pinho para personalidade do ano.
Nos anos 70, produziu peças como Missa Leiga, de Chico de Assis, com encenação de Ademar Guerra, em 1972. Proibida de utilizar a Igreja da Consolação como palco, acabou por encenar o espetáculo numa fábrica.
Após o 25 de Abril de 1974, regressou a Portugal para apresentar Autos Sacramentales, sobre Calderón de la Barca, encenação que se destacou na Bienal de Veneza.
Nos anos seguintes, dedicou-se ao Centro Latino-Americano de Criatividade e ao Festival Internacional de Teatro, em São Paulo. Outra iniciativa de Ruth Escobar foi a Feira Brasileira de Opinião, em 1976, com espetáculos dos mais importantes dramaturgos da época, evento que acabou por ser proibido pela censura. Como produtora, esteve na criação do Festival Internacional de Teatro na São Paulo de 1974, que levou ao Brasil, entre outros, Time and Life of Joseph Stalin, de Bob Wilson (título foi alterado para The life and times of David Clark, por determinação da censura).
Militante da Amnistia Internacional, Ruth Escobar lutou contra a ditadura militar brasileira. Chegou a ser enquadrada na Lei de Segurança Nacional e teve o seu teatro destruído pelo CCC (Comando de Caça aos Comunistas) às vésperas da estreia de Roda viva, de Chico Buarque, com encenação de Zé Celso Martinez Corrêa, em episódio que a levou à prisão, ao lado de Marília Pêra.
Em 1977 foi Ilídia de A Torre de Babel (que punha em cena um burro chamado Ernesto, numa referência ao general Geisel, o presidente na altura) e levou a São Paulo o autor Fernando Arrabal para dirigi-la. A ???????seguir fez peças como Caixa de Cimento, encenada por Juan Uviedo, e Fábrica de Chocolate, que produziu a partir de texto de Mario Prata sobre a tortura.
Nos anos 80, fez uma pausa na sua carreira e foi eleita duas vezes deputada estadual pelos partidos PMDB e PDT. Em 1987, lançou o livro Maria Ruth - Uma Autobiografia. Em 1990, voltou aos palcos, numa encenação de Gabriel Villela, de Relações Perigosas, de Heiner Müller.
Ao analisar sua importância na cena artística brasileira, a crítica e ensaísta Ilka Marinho Zanotto observou: "Se quiséssemos traçar a evolução do teatro brasileiro no século XX [...] teríamos forçosamente de incluir entre os cumes de suas realizações a trajetória polémica da atriz-empresária Ruth Escobar. Marcada pelo signo do inconformismo, pelo faro do verdadeiramente artístico e do anticonvencional".