Presidente devia ter mais poderes na área da Defesa e Forças Armadas
Como vê o furto nos paióis de Tancos e a ação dos vários atores políticos e militares?
Não me quero pronunciar sobre as minúcias desse acontecimento. O relevante é que houve um assalto a uma unidade militar e que, na sequência dessa situação, houve diversas aproximações ao problema que originaram exonerações, demissões, renomeações.... O que é importante é, em primeiro lugar, que se descubra ou se saiba qual é o paradeiro das armas, valham elas o que valham. Em segundo lugar, que decorra um inquérito que apure as responsabilidades da falta de segurança que permitiu que tivesse acontecido um incidente daquele género. É única e exclusivamente o que quero dizer sobre a matéria, o resto é a espuma dos acontecimentos.
Incluindo o pedido de novas audições parlamentares feito pelo PSD?
A Comissão de Defesa solicitou informações sobre esse assunto, vai haver um conjunto de audições, há inquéritos que foram desenvolvidos e terão um resultado. É nessa perspetiva que a própria comissão decidiu essas audições para se informar mais sobre o que veio a ser conclusivo. Porque, independentemente de tudo o mais, a questão não é o material roubado, nem sequer a questão relacionada com o que significa financeiramente. A questão é que houve um assalto a uma unidade militar e isso é um assunto grave.
Faz sentido dar novas missões às Forças Armadas, civis e não mandatórias como as militares, quando se reduzem verbas e efetivos?
Se o Estado atribui missões também deve contribuir para ter capacidades adequadas para as cumprir. Interessa é que haja a possibilidade de racionalizar. Temos de maximizar as capacidades que temos... porque não aproveitámos equipamentos como os Puma, que servem muito bem para combater fogos? A Força Aérea é fundamental para verificar como estão a evoluir os fogos... isto é um combate que implica uma estratégia.
Porque é que isso não acontece?
Tem havido um certo preconceito. Houve sempre o cuidado, e a Constituição suporta esta situação, que é a separação entre o que são missões de segurança interna e o que é a projeção de forças em termos de Defesa, em organizações que ajudam a produzir paz e segurança. Mas hoje em dia começa a ser cada vez mais complexo em termos de interpretações e penso que devemos encontrar formas adequadas que levem a que haja cada vez mais articulação entre um setor e outro.
Mas a Constituição e a lei já permitem isso...
Certo.
Defende alterações constitucionais?
Sim e não só neste sentido. Deve haver mais poderes do Comandante Supremo das Forças Armadas, não só porque estamos a lidar com questões de soberania mas também pelas responsabilidades inerentes a este cargo no âmbito da Defesa e da política externa. O Presidente, quando foi a Tancos, disse que foi "até ao limite" dos seus poderes... precisa de mais. É o momento de refletir nesta matéria, no sentido de podermos incorporar melhor, sedimentar e estabilizar tudo o que tem a ver com os setores essenciais da soberania. É tempo de considerarmos um Conselho de Segurança Nacional que ligue as áreas dos atuais conselhos de Defesa Nacional e de Segurança Interna, pois é fundamental que os desafios sejam enfrentados dentro de uma cooperação ultradesejável e que ocorre na maior parte dos países.
As Forças Armadas devem agir na segurança interna com poderes de autoridade própria?
Não, não. O que defendo é que as Forças Armadas não sejam afastadas mas procurem a cooperação dentro dos termos constitucionais, por exemplo no que é a proteção dos cidadãos nos incêndios, como sucedeu agora com o Exército e Marinha.
Mas isso não demonstra que o quadro constitucional e legal já o permite?
É preciso uma cultura maior, para não haver dúvidas de relacionamento. Por exemplo, nesta questão de Tancos deveria ter sido reunido o Conselho de Segurança Interna, onde participa o chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, não podemos funcionar como se cada setor estivesse impedido de ajudar.
A razão disso parece ser a resistência dos militares em subordinarem-se às forças de segurança. Um chefe militar até já disse no Parlamento que mal tinha lido a Constituição...
Não ouvi isso e não faço qualquer comentário a uma declaração dessas.
Em 2012 teve de ser feita uma lei para clarificar uma área onde interveio diretamente há duas décadas...
Em 2002 criaram-se o Sistema de Autoridade Marítima e um conselho, presidido pelo ministro da Defesa, que era uma base de diálogo entre todas as forças que tinham a ver com as questões marítimas na costa. Curiosamente, penso que nunca reuniu...
O poder político tem medo das Forças Armadas, como diz Vasco Lourenço?
Eu fiz a lei, é o que posso dizer. Não respondo pelos outros.
Década e meia após o fim do Serviço Militar Obrigatório, como avalia o processo de profissionalização? Defende o seu regresso ou variante desse modelo?
É um problema complexo. Não sou avesso a que exista um serviço militar obrigatório, mas nos tempos atuais será mais interessante desenvolver um serviço cívico, que possa até conter uma parte relacionada com as Forças Armadas e que desse noções sobre o interesse de participar nas várias áreas. Falemos dos fogos: se houvesse um serviço cívico que pudesse ajudar na vigilância das florestas ou pudesse colaborar na Proteção Civil, no INEM ou instituições de solidariedade social, um serviço cívico pode ser uma maneira interessante de também ajudar naquilo que é o recrutamento para as Forças Armadas.
Vê o desinvestimento na Defesa como desinteresse político?
Tem havido altos e baixos. De maneira geral tem-se procurado levar por diante o que é essencial nas capacidades das Forças Armadas. Mas houve momentos de aplicação da Lei de Programação Militar que nos deixaram perplexos: desistirmos do programa cooperativo como o [da aeronave] A400M não foi positivo e do [helicóptero] NH90 também não. A não concretização do navio polivalente logístico, componente essencial do sistema de forças, ou cancelar o programa das viaturas blindadas Pandur a meio também não... houve dificuldades financeiras mas também estas decisões.