Meio orçamento num país adiado

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O Governo decidiu apresentar ao País um "meio orçamento". Nem ele próprio estará convencido de que este instrumento financeiro irá solucionar as graves questões que Portugal enfrenta num ano tão carregado de incertezas.

É um "meio orçamento", logo à partida, em sentido literal. Porque será aprovado quase com o ano a meio.

É um "meio orçamento" também por já estar desactualizado no momento em que foi entregue à Assembleia da República. Sem prever os efeitos da inflação, da subida das taxas de juro, do desabastecimento a diversos níveis e da trágica guerra que decorre na Ucrânia.

E é um "meio orçamento", porque não tem ambição, deixando o país a meio caminho, adiando oportunidades e desenvolvimento.

O cenário macroeconómico contido neste Orçamento do Estado parece uma peça de ficção. Muito ao estilo de governar deste primeiro-ministro, que por estes dias é mais visto no estrangeiro, em Bruxelas ou em Estrasburgo, do que em Portugal. António Costa convence-se de que basta ter "energias positivas" e dizer muitas vezes que "o diabo afinal não chegou" para afastar os problemas.

Infelizmente para todos nós, esta modalidade de pensamento mágico não soluciona nada. O que explica, em grande parte, o facto de Portugal continuar um país estagnado, sem recursos próprios, com serviços públicos em degradação, com uma das maiores dívidas públicas do mundo e à mercê de financiamentos de emergência ao fim de 18 anos de governos socialistas no último quarto de século.

Adiar parece ser o verbo preferido deste executivo socialista, que é novo apenas na fachada. Porque os antigos vícios de funcionamento permanecem incólumes. E o maior destes vícios é a permanente tentação de deixar tudo para depois, à espera que as coisas se resolvam por si.

Pura ilusão. Continuamos num país sempre adiado. Um país que vai sendo ultrapassado em desenvolvimento económico e em qualidade de vida por países do centro e do leste da Europa que aderiram ao espaço comunitário muito depois de nós. Vieram de baixo e já estão à nossa frente. Isto devia desafiar-nos, estimular-nos. Mas parece que só gera apatia e resignação.

Aproximar Portugal do padrão médio de crescimento da União Europeia devia ser um verdadeiro desígnio nacional para a geração que agora entra no mercado de trabalho. Lamentavelmente, o Governo nada faz para corresponder a este desígnio. Num país onde faltam médicos e professores, os jovens profissionais mais qualificados continuam a ser empurrados para a emigração. Portugal tornou-se um país de poucas ou fracas oportunidades.

Daí o cenário que nenhuma propaganda consegue disfarçar. Recuo nos índices de saúde, perda de poder de compra, quebra no investimento. Reformas estruturais e grandes opções estratégicas sempre adiadas, como é tristemente emblemática a do novo aeroporto de Lisboa, que se arrasta há décadas sem decisão à vista. Por falta de vontade política e pela característica que este PS tem de adiar a resolução dos problemas para outro dia, seja lá quando for.

Daí esta sensação de vivermos num país onde as questões se eternizam sem desfecho à vista. Num país onde querer não é poder. Porque o poder é fraco e lasso, mesmo quando dispõe de maioria absoluta no parlamento. E é assim que gere um país, "acenando e sorrindo", porque pensa sempre mais nas manchetes da manhã seguinte do que nos desafios das gerações que vão seguir-se.

Deputado.
Escreve de acordo com a antiga ortografia

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