Marcelo já vetou 11 diplomas. Só dois desses vetos estão por resolver

Presidente da República antecipou que pode estar na calha mais um veto, à lei de bases da Saúde, se esta só for aprovada à esquerda. Desde o início do mandato já o fez por 11 vezes - e acelerou o ritmo em 2018.
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O Presidente da República já vetou 11 diplomas desde que iniciou o seu mandato, em 9 de março de 2016, mais de metade dos quais no ano passado. Nos últimos dias, Marcelo Rebelo de Sousa tem antecipado uma linha vermelha para promulgar (ou não) a nova lei de bases da Saúde. Será um 12.º veto na calha, quando for tempo dele: a proposta desta lei ainda tem um percurso legislativo demorado, que pode ir até ao final da legislatura.

Para o Presidente, a linha centra-se na forma e não na substância. Marcelo Rebelo de Sousa defendeu, em entrevista à agência Lusa, à passagem do terceiro aniversário da sua eleição, em 24 de janeiro, que uma lei de bases da Saúde "é uma realidade que busca um equilíbrio, na base de uma fórmula flexível, que seja passível de durar para além de um governo", que não seja questionada "na próxima conjuntura", "seja ela quatro anos, seja oito anos".

Ao antecipar o veto, se a lei de bases só for aprovada pelas bancadas da esquerda, segundo o Público desta quarta-feira, o Presidente da República volta a evitar a consulta do Tribunal Constitucional e chumba ele.

O último chumbo presidencial foi ao diploma do governo sobre a contagem do tempo de serviço dos professores, conhecido na ressaca das festas natalícias, em 26 de dezembro de 2018.

Dos 11 diplomas vetados, três foram decretos do governo e oito da Assembleia da República. E há uma outra curiosidade: três diplomas referiam-se a matérias de transportes - os termos da transferência da Carris para a Câmara Municipal de Lisboa, os estatutos da STCP e do Metro do Porto e a regulação da atividade de multinacionais como a Uber e Cabify.

Por comparação, o anterior Presidente da República vetou 25 diplomas nos seus dez anos em Belém. Mas Cavaco Silva fê-lo de forma mais intensa no primeiro mandato, exercendo essa opção por 15 vezes.

2016
7 de junho

Três meses depois de entrar em funções, Marcelo Rebelo de Sousa veta o primeiro diploma, um decreto da Assembleia da República sobre gestação de substituição, divulgando esta decisão perto da meia-noite. O direito de alguém poder revogar o seu consentimento até ao momento do parto foi uma das razões invocadas por Marcelo para justificar o seu veto.

Este é um veto que ainda hoje não teve uma resposta legislativa - também porque o Tribunal Constitucional chumbou no ano passado algumas normas desta proposta (juntamente com a procriação medicamente assistida). Em dezembro passado, o Bloco de Esquerda pediu que o seu projeto baixasse à comissão para tentar encontrar um consenso com outros partidos sobre o direito da gestante de substituição relativamente ao período em que pode voltar atrás no acordo.

25 de julho

Antes das férias de verão, Marcelo Rebelo de Sousa recebeu pela segunda vez os partidos com assento parlamentar, para uma análise da situação política, explicando que era uma rotina que pretendia manter, com intervalos de cerca de três meses.

No mesmo dia, utilizou pela segunda vez o veto político, devolvendo ao Parlamento as alterações aos estatutos da STCP e Metro do Porto, por se "vedar, taxativamente, qualquer participação de entidades privadas" nas duas empresas de transportes. O Presidente da República apontou uma intervenção "excessiva" da Assembleia da República "num espaço concreto da administração pública, em particular do poder local".

O PS voltou a insistir na lei, mas expurgando o diploma das propostas que Marcelo tinha vetado - e o Presidente promulgou o novo texto em outubro de 2016.

30 de setembro

O Presidente da República vetou, em 30 de setembro de 2016, um diploma do governo permitindo a troca automática de informação financeira sobre depósitos bancários superiores a 50 mil euros, invocando como principal razão a "situação particularmente grave vivida pela banca".

Em maio de 2018, o governo retomou a sua proposta exatamente nos mesmos termos depois de Marcelo Rebelo de Sousa ter comunicado publicamente, como afirmou uma fonte do executivo socialista, que estavam "ultrapassadas as circunstâncias conjunturais que justificaram o veto do diploma que o governo aprovou em 2016 para garantir o acesso automático a informações financeiras relativas a contas em bancos portugueses cujo titular ou beneficiário seja residente em território nacional nas situações em que o saldo seja superior a 50 mil euros".

2017
14 de março

Marcelo Rebelo de Sousa utilizou pela quarta vez o veto político, em relação a um diploma do governo que criava o novo Estatuto dos Militares da Guarda Nacional Republicana (GNR), considerando que a possibilidade de promoção ao posto de brigadeiro-general podia "criar problemas graves" à GNR e às Forças Armadas.

Dois dias depois do veto, o Conselho de Ministros alterou o novo estatuto da GNR, prevendo agora que naquela força apenas os coronéis com formação de base na academia militar possam ser promovidos a brigadeiro-general.

9 de agosto

O Presidente da República vetou o diploma do Parlamento sobre os termos da transferência da Carris para Câmara Municipal de Lisboa, naquele que foi o seu quinto veto político.

Em outubro, os deputados acordaram uma solução que ultrapassava o veto, ao permitir a possibilidade de haver alienação de capital ou de concessão da Carris, mas limitando-a a entidades públicas ou de capitais públicos.

Marcelo Rebelo de Sousa promulgou então o diploma, "sem embargo de ficar aquém da mais ampla consagração da autonomia do poder local", o Presidente da República promulgou o diploma".

2018
3 de janeiro

Logo a abrir o ano, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, vetou as alterações à lei do financiamento dos partidos políticos. Este sexto veto foi tomado "com base na ausência de fundamentação publicamente escrutinável quanto à mudança introduzida no modo de financiamento dos partidos políticos", explicou em nota.

Em março seguinte, Marcelo baixava os braços e promulgava as regras de financiamento de partidos e campanhas eleitorais, reconhecendo que não estava em Belém para impor "pontos de vista minoritários".

"Tenho uma posição segundo a qual deve haver limites máximos ao financiamento privado, que deve reduzir-se o conjunto de despesas partidárias e que deve haver financiamento sobretudo público. Mas sou ultraminoritário em Portugal e o Presidente não está na presidência para impor os seus pontos de vista minoritários", explicou-se.

7 de abril

O Presidente da República vetou o diploma do Parlamento que permite a um conjunto de engenheiros assinarem projetos de arquitetura.

Este sétimo veto do seu mandato foi ultrapassado com um novo diploma do Parlamento - com alterações introduzidas pelo PAN e PCP - com uma nova versão que "restringe substancialmente o âmbito de aplicação da exceção transitória" que permite a um conjunto de engenheiros assinar projetos de arquitetura.

29 de abril

O oitavo veto do Presidente da República foi à lei que regularizava a Uber e outras plataformas de transporte individual, mas em 31 de julho seguinte deu "luz verde" à legislação, depois das alterações efetuadas. Marcelo Rebelo de Sousa tinha considerado necessário um maior equilíbrio com os táxis, que poderia ser alcançado através das tarifas ou na contribuição das empresas como a Uber para o setor.

9 de maio

Marcelo Rebelo de Sousa vetou a mudança de género aos 16 anos. A primeira versão da lei tinha sido aprovada a 13 de abril com votos favoráveis de PS, BE, PEV e PAN. O nono veto foi ultrapassado com um novo diploma votado em 12 de julho.

"Considerando que a alteração aprovada pela Assembleia da República vai, genericamente, no sentido do reparo feito em 9/5/2018", lê-se no site da Presidência, o Chefe do Estado "promulgou o Decreto da Assembleia da República n.º 228/XIII relativo ao direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de género e à proteção das características sexuais de cada pessoa". O Parlamento contornou as objeções presidenciais estabelecendo a obrigatoriedade de um relatório médico para atestar a vontade dos menores.

1 de agosto

O Presidente da República usou o veto político pela décima vez, em relação a um diploma do Parlamento sobre direito de preferência dos arrendatários. De novo, os deputados responderam às dúvidas de Belém e, em outubro seguinte, Marcelo acolheu, em nota publicada no site, essas alterações: "Atendendo às alterações introduzidas pela Assembleia da República, tomando plenamente em conta as clarificações solicitadas na mensagem de 1 de agosto de 2018 e melhorando e reequilibrando o diploma, o Presidente da República promulgou o Decreto 248/XIII, que altera o Código Civil, (...) garantindo o exercício efetivo do direito de preferência pelos arrendatários na alienação do locado."

26 de dezembro

Foi um presente envenenado para o governo, ao cair do pano do Natal. Marcelo Rebelo de Sousa vetou o diploma do governo sobre a contagem do tempo de serviço dos professores, argumentando que deve ser "dado efetivo cumprimento" à norma orçamental que prevê um processo negocial sobre esta matéria. Este 11.º veto do seu mandato abriu uma guerra surda com os sindicatos de professores a exigirem uma resposta rápida ao veto - e o executivo socialista a argumentar que há um Orçamento do Estado em vigor.

Nesta quarta-feira, confrontado com a referida norma, que obriga à existência de negociações, o primeiro-ministro foi taxativo na resposta aos jornalistas, depois de ter cumprimentado o líder da Fenprof, que protestava à porta de uma iniciativa onde esteve António Costa e o ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues: "O Orçamento não manda coisa nenhuma, só diz que está em processo negocial. Segundo, ainda estamos em janeiro, temos todo um ano para aplicação do Orçamento", atirou Costa.

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