Marcelo há 6 anos em Belém. Vem aí o tempo em que "tende a apagar-se"
A frase foi dita em outubro de 2015 pelo próprio - antes portanto de ser eleito Presidente da República pela primeira vez (janeiro de 2016) -, numa sessão na Voz do Operário, em Lisboa, onde Marcelo Rebelo de Sousa fez a sua leitura dos poderes presidenciais e de como eles podem ser modelados em função das maiores parlamentares.
"Se houver uma maioria absoluta de um partido ou de uma coligação, muito coesos e com um líder forte no Governo, o Presidente tende a apagar-se. Se houver uma maioria absoluta com uma coligação instável, o Presidente ganha mais peso. Se houver uma maioria relativa, o Presidente ganha ainda maior relevo. Se houver crise nos partidos, cisões e instabilidade no parlamento, o Presidente pode chegar a ter um poder particularmente decisivo, embora sempre no respeito da Constituição", afirmou. Completando: "E, à margem destas situações, conta muito o estilo do Presidente, e conta muito se ele está no primeiro ou no segundo mandato e, neles, mais perto do começo ou mais perto do fim."
Esta quarta-feira passam seis anos sobre o início da vida presidencial de Marcelo Rebelo de Sousa. Foi em 9 de março de 2016 que tomou posse do cargo, sucedendo a Cavaco Silva, e na sequência de eleições presidenciais que venceu com 52 por cento e com esmagadora vantagem sobre o segundo classificado, Sampaio da Nóvoa (22,9 por cento). A reeleição, em janeiro do ano passado, também não ofereceu dúvidas: 60,7 por cento dos votos, contra 13 para a segunda classificada, a socialista Ana Gomes.
Se tudo correr como previsto, Marcelo irá ficar para a história como o primeiro Presidente da democracia a ter de lidar com um único primeiro-ministro, o socialista António Costa. E tendo agora o PS maioria absoluta, iniciar-se então o tal tempo em que, nas suas próprias palavras, o Presidente da República "tende a apagar-se".
Pode ser que aconteça - mas notoriamente o inquilino de Belém recusa reduzir-se à condição invisibilidade. Ontem, perante notícias de novas necessidades de financiamento do Novo Banco (mais 200 milhões de euros), Marcelo avisou, já impaciente: "Nestes tempos de fim de pandemia ou de transição para a endemia e de guerra, nós dispensamos obras de Santa Engrácia. Dispensamos. estando nós com tantas questões e tantos problemas a enfrentar, acho que às vezes não vale a pena juntar a essas questões e a esses problemas mais um problema que dê a sensação de ser uma espécie de obras de Santa Engrácia." Portanto, o que irá fazer é "aguardar a assembleia geral do banco, que está marcada para o final do mês de março, e depois a tomada de posse do Governo, para ver qual é a atitude do Governo e a posição do Fundo de Resolução". "E depois, se for caso disso, direi qualquer coisa."
Ontem o Presidente teve na agenda a possibilidade de se encontrar com os seus dois únicos antecessores ainda vivos, Ramalho Eanes e Cavaco Silva. Seria no lançamento das memórias cirurgião José Roquette, Hospital da Luz, em Lisboa.
Marcelo contudo atrasou-se e quando chegou já Cavaco Silva tinha saído, sem falar aos jornalistas. Conversando com a imprensa, o Presidente da República reconheceu que na UE ainda não tiveram acordo medidas de sanção à Rússia no setor energético. "Essas não tiveram, no todo ou em parte ou nalguns pormenores, acordo", afirmou. No caso da energia, e noutros casos, é preciso mais tempo e mais ponderação. Por isso, é evidente que é uma situação que está a ser vivida hora a hora, minuto a minuto", acrescentou, explicando ainda que na UE, "para não haver divisões", o "trabalho é contínuo".
Questionado sobre que posição poderá sair da reunião do Conselho de Estado que convocou para 14 de março exclusivamente sobre a situação na Ucrânia, o Presidente da República respondeu que "para já, o importante é que se faça uma avaliação".
Marcelo Rebelo de Sousa assinalou que antes haverá uma reunião do Conselho Europeu, "que vai fazer um ponto daquilo que foi este processo muito rápido, mas com mudanças contínuas", desde 24 de fevereiro, "portanto, já tem uma visão global, estratégica, política, diplomática, económica e social que é mais rica, mais completa do que teria há oito dias ou há dez dias". "A União Europeia, e bem, tem seguido o seu caminho sem estar a reagir ou a dar importância às reações relativamente àquilo que faz que a inibam de fazer isso. Se tem de fazer, tem de fazer", disse ainda o Presidente da República.
Hoje, portanto, Marcelo completará seis anos como Presidente da República - mas fá-lo-á sem nenhuma agenda pública (ontem, pelo menos, isso não estava previsto, embora se saiba que o PR é especialista em improvisos). Só deverá regressar ao espaço público na sexta-feira, numa conferência na Gulbenkian.