Mar do Sul da China: Pequim rejeita decisão jurídica que dá razão a Manila
A decisão é vinculativa ao abrigo da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, que tanto as Filipinas como a China assinaram, mas o Tribunal Permanente de Arbitragem não tem poderes para garantir a aplicação. Mesmo assim, esta é uma derrota para Pequim, que viu negado aquele que diz ser o seu "direito histórico" em relação à soberania de grande parte do mar do Sul da China, com os juízes de Haia a decidirem a favor das pretensões filipinas. O governo chinês, que boicotou as audiências por não reconhecer a jurisdição do tribunal sobre o tema, promete ignorar a decisão e reforçar a presença militar.
"O tribunal conclui que não há qualquer base legal para a China reclamar direitos históricos em relação aos recursos nas águas que estão dentro da chamada "linha dos nove traços"", decidiu o tribunal de arbitragem. Na sua decisão de quase 500 páginas, os juízes dizem que a China "violou os direitos soberanos das Filipinas dentro da sua zona económica". Isto porque não só "interferiu com a exploração petrolífera e piscatória" filipina, enquanto permitia a presença de barcos de pesca chineses, mas também tem procedido à "construção de ilhas artificiais". Algo que causou "danos graves" ao ecossistema de corais.
"O povo chinês não vai aceitar a decisão e todas as pessoas do mundo que defendem a justiça também não a vão aceitar", reagiu o ministro dos Negócios Estrangeiros chinês, Wang Yi. "Agora que esta farsa acabou é hora de voltar ao caminho certo", acrescentou, referindo que a China "está disposta a continuar a resolver pacificamente os diferendos em questão através das negociações e consultas diretas com os países envolvidos". Pequim vai destacar mais meios militares para a região e diz já ter feito testes com sucesso em dois novos aeroportos.
"As Filipinas declaram fortemente o respeito por esta decisão histórica como uma importante contribuição para os esforços em curso em resolver as disputas no mar do Sul da China", afirmou o chefe da diplomacia filipina, Perfecto Yasay. "Pedimos que todos os envolvidos atuem com contenção e sobriedade", acrescentou. O pedido de arbitragem foi feito em 2013 pelo anterior governo. Rodrigo Duterte, presidente há 15 dias, prometeu no passado desafiar Pequim andando de jet ski nas áreas disputadas, mas também já defendeu negociações para resolver a situação - relações mais próximas com a China garantiriam o acesso aos empréstimos e investimentos chineses.
Pequim reclama a soberania sobre 90% do mar do Sul da China, que além de ser rico em recursos piscatórios se acredita esconder também grandes reservas de petróleo e gás natural. Por aquela rota passam ainda navios que transportam 4,5 biliões de dólares de mercadorias todos os anos. Além das Filipinas, também Vietname, Malásia, Brunei e Taiwan reclamam da "linha de nove traços", desenhada pela China em 1947 após a capitulação do Japão (mas que já remontaria à dinastia Han, há dois mil anos).
A decisão do tribunal de arbitragem em relação às Filipinas pode beneficiar estes outros países (só Taiwan a rejeitou), que têm tido o apoio dos EUA e de outros países ocidentais. Os militares norte--americanos participam constantemente em manobras conjuntas na área. A China tem reforçado a presença militar na zona, transformando os corais em ilhas e instalando aí lançadores de mísseis, pistas de aterragem, casernas e outras instalações de segurança.
Ainda antes de ser conhecida a decisão, já o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, pedia à China que a reconhecesse. A Casa Branca, por seu lado, lembrou que o decidido pelos juízes "é final e legalmente vinculativo", pedindo que ambos os países evitem "declarações ou ações provocatórias".