Macron iniciava há um ano marcha triunfal para o Eliseu

Ninguém acreditaria há um ano que o ex-ministro socialista chegaria à presidência do país. Hoje, já tem cognome, Júpiter, alcançou uma vitória histórica e o seu partido também.
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"Imaginem onde estaremos daqui a três meses, daqui a seis meses, daqui a um ano", disse profeticamente Emmanuel Macron no primeiro comício do seu movimento En Marche!, em Paris, há exatamente um ano. Ora bem, um mês e meio depois deste encontro, Macron deixava de ser ministro da Economia, seis meses depois estava a fazer campanha para se tornar presidente e agora não só chegou ao Eliseu como conseguiu ter uma maioria esmagadora nas legislativas. E não parece querer parar por aqui.

Segundo dados do próprio partido, o En Marche! conta agora com cerca de 375 mil pessoas inscritas, entre as quais mais de 160 mil militantes ativos. O movimento está organizado em 3200 comités locais espalhados por toda a França e já efetuou mais de 70 mil iniciativas políticas (por exemplo, comícios e ações de formação) num ano. Foi aliás destes comités, que começaram por apoiar a campanha de Macron à presidência, que saiu uma parte importante dos 308 deputados eleitos nas legislativas.

Uma maioria absoluta que não se antevia há 365 dias quando a macronmania deu a sua primeira mostra de força na capital francesa, na Mutualité à Paris, sala de espetáculos e eventos escolhida para acolher os três mil primeiros fiéis do En Marche!. Agora sem festa e sem pompa, o DN questionou, nas redondezas desta sala simbólica para o movimento, os franceses que tentavam fugir da chuva sobre o futuro do partido e do presidente. "Era impossível antecipar que isto ia acontecer. Falava-se muito da renovação da vida política, mas não estava particularmente convencida de que Macron pudesse ganhar tudo à primeira. Depois das primárias da direita e da esquerda, e de tudo que se soube sobre os outros candidatos, teve o caminho aberto para o poder", disse Anne Sophie, jurista de 26 anos, que passava frente à Mutualité.

Macron tem o caminho livre para realizar as reformas que anunciou na campanha eleitoral. A reforma do Código do Trabalho já chegou à Assembleia e pretende mexer na negociação coletiva, criar maior flexibilidade nos contratos de trabalho e fundir as diferentes instâncias que representam os trabalhadores nas grandes empresas. A central sindical CGT (Confédération Générale du Travail) já programou uma jornada de protesto contra esta reforma para 12 de setembro, mas com a popularidade em alta, é preciso esperar para ver quem sairá à rua contra Macron.

Um partido startup

Com um presidente, mais de 300 deputados e milhares de comités em todo o país, cabe agora ao partido profissionalizar-se. "Foram vocês, os marcheurs, que mostraram a todos os especialistas, a todos os políticos instalados que é possível criar em pouco tempo uma força militante e renovar as práticas políticas. E fazer isto tudo com um sorriso no rosto", disse o primeiro-ministro Edouard Philippe, ex-esperança da direita e destacado ex-membro d"Os Republicanos, perante os militantes do En Marche! que acorreram ao encontro de sábado passado. Com Macron na reunião G20, em Hamburgo, coube a Philippe animar as tropas.

O plano do partido é agora aprovar os estatutos através de voto eletrónico, eleger uma direção colegial em setembro e manter a formação política contínua (ou formação cívica), dando apoio aos militantes mais empenhados em continuar o dinamismo local até às próximas eleições. Nas propostas a votos está a isenção de quotas, a possibilidade de pertencer ao En Marche! e a outra formação política ao mesmo tempo e ainda a limitação de mandatos interna. Tudo isto é possível porque os resultados históricos do En Marche! dão também frutos financeiros. Os cofres do partido estão cheios, com subvenções que ascendem a 20 milhões de euros por ano. O principal investimento vai para ferramentas digitais, como uma plataforma de contacto com os militantes e uma rede de "facilitadores locais" que visa dar ajuda imediata a quem quiser mobilizar a sua comunidade. Mas o movimento ainda vive da sua figura maior.

"Eu era uma cética quando o En Marche! apareceu e Macron se lançou na corrida [à presidência]. Mas vi que era alguém que trazia algo novo e que representava a juventude. Acima de tudo, é alguém que não entra em jogos políticos", declarou Annette, 69 anos, diretora de um hotel nas imediações da Rue des Écoles. A parisiense admite que a tarefa do presidente "não é fácil", mas que por enquanto está com ele. As provas de fogo para Anette serão as medidas para travar o desemprego e relançar a economia.

Júpiter sim, mas até quando?

Com menos de dois meses de mandato, Macron já tem cognome: Júpiter. Por oposição a François Hollande, apelidado de "homem normal", Macron é visto como extraordinário, deus entre os deuses, de carácter imperial e dominador. O poder parece renovar-se com a sua popularidade. Segundo uma sondagem Yougov publicada no início do mês, 47% dos franceses consideram positivo o arranque do mandato presidencial - mesmo com o escândalo de Richard Ferrand e a demissão de François Bayrou. Mas Júpiter não agradou a toda a gente. "As pessoas que votaram por Macron, votaram com esperança e acreditam na possibilidade de mudança, mas eu acho que a maioria está desiludida com a política e já não acredita em ninguém", pensa Sébastien, 47 anos e jornalista. Na sua opinião, e apesar de ser jornalista, os meios de comunicação "ajudaram a construir uma imagem" longe da verdade. "Estamos a viver novo capítulo da luta de classes. Há a França que teve sucesso na globalização e a França que perdeu no processo. E uma parte de quem perdeu, também votou em Macron. Agora, os franceses vão aperceber-se da verdadeira cara de Macron e do En Marche!", pensa.

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