Lei de Bases da Saúde. Entre a "foice e o martelo" e a "ideologia do negócio"

Debate de quatro propostas para uma nova Lei de Bases da Saúde mostrou um Parlamento dividido em dois blocos, com o PS a alinhar com BE e PCP
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Deve haver mais Estado na Saúde ou menos Estado na Saúde? Esta foi a pergunta que atravessou hoje todo o debate parlamentar em torno de quatro propostas para uma nova Lei de Bases para o setor - e a resposta deixou clara a divisão da Assembleia da República em dois blocos, leia-se PS, BE e PCP versus PSD e CDS. A visão de cada um dos lados sobre o outro pode ser resumida assim: para a direita, o PS encaminha-se para uma lei "estatizante", construída "à força de foice e martelo" em função da maioria parlamentar do momento; para a esquerda, as propostas de sociais-democratas e centristas são um prolongamento da "lei infame" de 1990, uma "lei da Luz Saúde e do Grupo Mello" que "pensa mais nas clientelas e nos acionistas" do que no Serviço Nacional de Saúde.

Mas, se a oposição à direita foi muito clara, a convergência à esquerda foi mais ténue - BE e PCP apontaram virtudes ao texto do Executivo, mas foram avisando que a proposta ainda é insuficiente e que é preciso mais clareza.

Na abertura do debate, a ministra da Saúde, Marta Temido, referiu-se à relação entre o Serviço Nacional de Saúde (SNS) e o setor privado e social para defender que a matriz da atual lei, que coloca o SNS em concorrência com os privados, deve mudar. "Não queremos concessionar pela simples dificuldade em reformar, não queremos uma sangria dos nossos profissionais" para o privado, afirmou a ministra, antes de sublinhar:"Não nos peçam que alinhemos na falácia de que o mercado da Saúde é como qualquer outro". Em resposta à intervenção da titular da Saúde, PCP e BE lançaram o repto - é preciso acabar com as Parcerias Público-Privadas (PPP) na Saúde e extinguir as taxas moderadoras, dois pontos que afastam governo e PS das bancadas mais à esquerda.

Uma lei "à força de foice e martelo"

À direita, o deputado Ricardo Baptista Leite apontou baterias ao que diz ser uma proposta (a do governo) "pobre, equívoca e contraditória", que aposta num "modelo político de cariz estatizante" e construída "à força de foice e martelo". "A ideologia não dá saúde e que se saiba não cura doenças", afirmou o deputado social-democrata, frisando também que uma Lei de Bases da Saúde "é importante, mas não é tudo" - "Não há lei de bases que nos valha perante a má governação do país".

Também Isabel Galriça Neto, do CDS, defendeu que Portugal vive "um estado de emergência na saúde" e que não é uma lei de bases que vai resolver a "calamidade" em que se transformou este setor. Até porque, no caso da proposta do Executivo, trata-se de umtexto "minimalista, sem uma visão da saúde moderna e com ausência de valores e princípios.

PS revê-se "convictamente na proposta do governo"

Do lado do PS, a deputada e porta-voz socialista Maria Antónia Almeida Santos garantiu que o grupo parlamentar se "revê convictamente na proposta de lei do governo". Na intervenção final, Jamila Madeira disse que os socialistas estão disponíveis para melhorar a proposta, com o apoio dos "verdadeiros defensores" do SNS, mas não estão disponíveis "nem para privatizar, nem para estatizar a saúde".

Pelo Bloco de Esquerda, Moisés Ferreira acusou PSD e CDS de terem aprovado uma "lei infame" em 1990 (ao tempo de Cavaco Silva), que "abriu as portas às PPP" - "que nos custam 500 milhões de euros por ano". A direita quer "uma lei da Luz Saúde e do grupo Mello", acusou o deputado bloquista.

Também Paula Santos, do PCP, acusou sociais-democratas e centristas de seguirem a "ideologia do negócio", pondo o SNS ao serviço do financiamento de grupos privados. Já o PEV, pela voz do deputado José Luís Ferreira, defendeu que os privados devem ser colocados "no sítio certo" - "em segundo plano, com uma natureza meramente supletiva".

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