Lagarde pede orçamento "prudente" a países muito endividados como Portugal

BCE mantém juros zero e espera que taxas se mantenham nos mínimos atuais ou inferiores até que a inflação se aproxime dos 2%. Hoje a inflação está em apenas 1%.
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Os países mais endividados da zona euro, como Portugal, não têm grande margem de manobra para orçamentos expansionistas e, portanto, devem enveredar por "políticas prudentes" em 2020 e daí em diante. O recado veio ontem de Christine Lagarde, a presidente do Banco Central Europeu (BCE).

No sábado, o governo aprova a proposta de Orçamento do Estado de 2020, num Conselho de Ministros extraordinário. Na segunda envia o documento ao Parlamento.

Ontem, foi a estreia de Lagarde na primeira reunião sobre taxas de juro do BCE, em Frankfurt. Na conferência de imprensa que se seguiu à reunião do conselho de governadores, a antiga líder do Fundo Monetário Internacional (FMI) renovou os recados aos governos da zona euro.

"No que respeita às políticas orçamentais, espera-se que a orientação orçamental da zona euro continue ligeiramente expansionista em 2020, dando assim apoio à atividade económica", começou por dizer a nova presidente do BCE.

A francesa relembrou que o BCE está a fazer o máximo que pode para suportar a economia, mas que Frankfurt não pode fazer tudo sozinho. Os governos precisam de dar o seu contributo com uma gestão orçamental adequada e com reformas estruturais.

Mas, insistiu, nem todos os países estão na mesma posição ou têm o mesmo grau de liberdade. Os muito endividados, como Portugal, Itália ou Grécia, devem ir com cuidado. Devem arranjar "margem orçamental" agora para mais tarde terem capacidade de responder a uma eventual crise através dos chamados "estabilizadores automáticos". Ter margem para gastar mais em subsídios de desemprego e apoios sociais e aliviar um pouco a carga fiscal, se for esse o caso.

"Tendo em conta as perspetivas económicas mais fracas para a zona euro, o conselho do BCE congratula-se com o apelo do Eurogrupo por respostas orçamentais diferenciadas e o facto de estar preparado para as coordenar", começou por referir Lagarde.

"Os governos com margem orçamental devem estar prontos a agir de maneira eficaz e oportuna", mas "os países onde a dívida pública é alta precisam de adotar políticas prudentes e de cumprir as metas do equilíbrio estrutural", acrescentou a presidente do BCE.

No primeiro grupo estão países como a Alemanha, que tem sido acusada de gastar pouco, apesar de ter uma situação orçamental equilibrada e uma dívida baixa.

No segundo grupo, está claramente Portugal, que tem uma dívida que equivale a mais de 118% do produto interno bruto (PIB).

Ainda nesta semana, o Presidente da República relevou esse problema. Já se sabe que o governo quer avançar com uma proposta de OE 2020 com um excedente de 0,2% do PIB, um máximo histórico em democracia. Marcelo Rebelo de Sousa considerou muito apropriado este OE pouco expansionista porque "não temos estado a diminuir a dívida, que é uma das maiores da Europa, ao ritmo desejável".

Por isso, disse o presidente, este novo Orçamento "é um ponto de viragem e é bom que os portugueses percebam porque é que é importante haver mais receitas do que despesas pela primeira vez em muitas décadas. É que isso vai permitir acelerar o pagamento da nossa dívida. Isto significa Portugal subir na cotação internacional e juros impostos a descerem e todos nós beneficiarmos com isso".

Estreia de Lagarde foi para baixar a fasquia

Em Frankfurt, Lagarde recordou que se os países sobre-endividados cortarem na dívida isso "criará condições para que os estabilizadores automáticos funcionem livremente". "Todos devem intensificar esforços para alcançar uma composição das finanças públicas mais favorável ao crescimento."

Nessa mesma reunião inaugural de Lagarde, o BCE anunciou que a taxa de juro de referência da zona euro mantém-se nos 0% e que o programa de compras de dívida pública e outros ativos, no valor de 20 mil milhões de euros ao mês, também vai continuar, como já se previa.

O legado do anterior presidente Mario Draghi permanece, para já, intocado porque a retoma da zona euro está periclitante, a inflação continua muito fraca e muitos bancos continuam a precisar de limpar os seus balanços, sobretudo os dos países do sul, que ainda estão sobrecarregados de malparado.

Lagarde revelou ainda que o crescimento da zona euro está cada vez mais débil e voltará a travar no ano que vem; a inflação, embora acelere devagar, vai continuar longe da meta política de 2% em 2022.

O ritmo da economia da zona euro só deve chegar a 1,1% no ano que vem, menos uma décima face à projeção de setembro de 2019 e também menos uma décima em relação ao ano completo de 2019. Assim, 2020 terá o pior registo de crescimento da economia da moeda única desde a recessão de 2012-2013.

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