Juiz Carlos Alexandre diz que "os tempos estão a adensar-se"

Magistrado sugere que Lei de Organização da Investigação Criminar poderia ser clarificada para acabar com as guerras entre PJ e PJ Militar, como ocorreu em Tancos.
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"Há necessidade que o legislador decida que Polícia Judiciária Militar [PJM] quer ter" e em que termos deve estar articulada com a PJ, defende o juiz Carlos Alexandre.

Último orador do seminário sobre Direito Militar realizado quarta-feira pela Academia Militar do Exército, Carlos Alexandre não se referiu abertamente ao conflito que rebentou entre a PJM e a PJ durante a investigação ao furto nos paióis de Tancos. Começando por dizer que seria muito cauteloso a falar, pois na sua "circunstância pessoal" tudo o que diz "pode ser aproveitado ou até utilizado contra" e isso é algo que procura "evitar a todo o transe", o magistrado - que trabalhou década e meia na área da criminalidade militar - nem sequer quis dizer se a PJM "está ou não dotada" dos meios necessários para a sua missão.

"De certeza absoluta que me valeria pelo menos uma chamada à Rua Mouzinho da Silveira", leia-se ao Conselho Superior da Magistratura. Agora, "acho que [a PJM] tem toda a razão de ser, até pela especificidade das coisas que tem em mãos, dos interesses que lhe compete acautelar, dos perigos que lhe compete, cá ou nas Forças Nacionais Destacadas, prevenir ou reprimir. Tem toda a razão de existência, mas tem de ser articulado no quadro global" com as outras forças e serviços de segurança, referiu.

O juiz foi enfático ao dizer que "há uma necessidade ingente de clarificar quem é que faz o quê, quem é complementar de quem e articularem-se". Mais, "gostava que as regras fossem clarificadas, que ambas as polícias, Judiciária militar e Judiciária civil, pudessem articular-se, que as tarefas fossem conjugadas no mesmo objetivo e que não houvesse problemas de capelas".

O juiz do Tribunal Central de Instrução Criminal, afirmando várias vezes que "os tempos estão a adensar-se", sugeriu que "talvez a Lei de Organização da Investigação Criminal pudesse ser mais clarificada", até porque "continua a existir criminalidade associada às Forças Armadas".

"Confrontado com graves problemas em tentar perceber se estou num mundo em que todos concorrem em termos de investigação criminal militar", o juiz disse - de forma enigmática - estranhar que "uma distribuição eletrónica [de processos] feita com base num algoritmo num edifício de 18 andares no Campus da Justiça não tivesse feito sortear dois" deles - que não identificou.

A propósito de outro processo, onde não interveio e que recusou "dizer qual porque violaria o dever de reserva", o juiz disse ainda ser "forçado a concluir que é cada vez mais residual o papel da hierarquia militar, sequer no procedimento de crimes estritamente militares quanto mais nos casos de corrupção" - onde, frisou Carlos Alexandre, "também aqui se colocam cada vez mais discussões sobre as esferas de competência da PJM versus outras forças e serviços de segurança".

A par de referências enigmáticas, como afirmar que "o que importa é o resultado e se o resultado for aparecer no meio da água fico satisfeito" - alusão ao material furtado de Tancos, que apareceu num dia de fortes chuvadas? -, o mediático juiz teve uma intervenção marcada igualmente por momentos de humor.

Por exemplo, ao lembrar os militares com quem trabalhou nos anos (2000 a 2004) em que foi juiz de instrução criminal (JIC) junto "daquela incipiente" PJM: Eram "pessoas que se expunham muito, ao ponto de serem proibidas também de entrar em unidades, ao ponto de sofrerem até algumas sensibilizações, algumas elucidações, até por cumprirem ordens do JIC."

Outro episódio, após recordar que deixara a PJM em 2004, motivou mesmo fortes gargalhadas: "Em 2014 herdei os mesmos processos... até tive um caso em que entreguei o processo a mim próprio."

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