1954-2021. Jorge Coelho, o político "frontal" que fez amigos em todos os partidos
Jorge Coelho, militante destacado do PS, e que o país guardou na memória como ministro das Obras Públicas que se demitiu após a queda da ponte de Entre-os-Rios, morreu esta quarta-feira aos 66 anos, vítima de um ataque cardíaco fulminante quando visitava uma casa na Figueira da Foz.
António Costa, de olhos marejados, disse que Jorge Coelho "foi sobretudo um amigo de todos nós" encarnando como poucos a "alma socialista". "Não era só um camarada, era um amigo de todos nós", sublinhou o chefe do governo e líder do Partido Socialista. Recordou-o também como "uma força da natureza que ajudou o PS a reerguer-se" de dez anos na oposição (1985-1995). Prometeu ainda que depois da passada a pandemia o PS o irá homenagear de forma devida, sem a "contenção" que o covid-19 impõe.
Numa nota no site da Presidência, Marcelo Rebelo de Sousa escreveu que "desaparece uma das mais destacadas personalidades da vida pública portuguesa nas décadas de 1980 e 90 e no início deste século, em que foi governante, parlamentar, conselheiro de Estado, dirigente partidário, analista político e gestor empresarial".
"Reunindo grande intuição, espírito combativo, perspicácia política, afabilidade pessoal e sentido de humor, por entre os escolhos inevitáveis dos apoios e das contraditas, deixou na memória dos portugueses o gesto singular de assumir, em plenitude, a responsabilidade pela tragédia de Entre-os-Rios e a capacidade rara de antecipar o sentir do cidadão comum", acrescentou e apelidou-o de "amigo".
A última grande missão política de Jorge Coelho foi como organizador das primárias do PS em 2014, as eleições que deram a António Costa a liderança do partido. Nos últimos anos abriu um bem-sucedido negócio de produção e comercialização de queijo da serra na sua cidade natal, Mangualde (distrito de Viseu). Em 1996 tinha sido também o organizador da campanha que elegeu Jorge Sampaio Presidente da República.
O presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues, afirmou-se "ainda em choque" com a notícia da sua morte. "Foi sempre um verdadeiro camarada e um amigo" e além disso "uma força tremenda da democracia", "uma verdadeira máquina de fazer política".
Natural de Mangualde, Jorge Coelho foi uma das mais influentes figuras dentro do partido, em que se filiou em 1982 e onde assumiu vários cargos, também nos governos de António Guterres, de quem foi braço direito. Foi - como dizia Almeida Santos - o "bulldozer" que, chefiando o aparelho do PS e sendo nº dois de Guterres, levou o PS de regresso ao poder, em 1995, depois de dez anos na oposição, esmagado pelo cavaquismo.
Guterres manifestou-se "chocado" pela perda do "amigo queridíssimo". Com a voz embargada, num depoimento à SIC, frisou que sempre o acompanhou "nos momentos decisivos" da sua vida. "Era a alegria de viver, era a personificação da vida. Nem sequer consigo aceitar", disse o secretário-geral das Nações Unidas, desfiando um rol de qualidades de Jorge Coelho: "Tinha enorme capacidade", "era um político inteligentíssimo".
Sobre a sua demissão do governo, em 2001, Guterres classificou-a de "extrema dignidade" e que só fez aumentar a "admiração que tinha por ele". E mesmo depois de abandonar as funções governativas não desmobilizou do PS. Coelho assumiu uma posição central no partido e coordenou a campanha às legislativas de 2005, que deram a primeira maioria absoluta a José Sócrates. Anos antes já tinha deixado a sua marca na política nacional com a também muito citada frase "Quem se mete com o PS leva".
Foi ainda conselheiro de Estado, cargo que deixou em 2008 também para se dedicar à vida empresarial, quando foi convidado para CEO do grupo Mota-Engil.