O jogo online ilegal em Portugal vale 60% do mercado legal. Ou seja, há um negócio com receitas de cerca de 90 milhões de euros por ano que não paga impostos nem é controlado pelo Serviço de Regulação e Inspeção de Jogos. Isto contribui para a fraca expansão legal deste tipo de apostas..Neste momento existem 15 autorizações para a exploração do jogo online, nas vertentes de jogos de fortuna e azar e de apostas desportivas à cota (respetivamente 8 e 7). Mas não deverão surgir muitas mais, adivinha António Vieira Coelho, administrador executivo da Estoril Sol. O jogo online e o facto de haver impostos muito elevados, faz com que este mercado - que foi regulamentado em Portugal em 2015 - "esteja parado". .No ano passado, os jogadores inscritos nos sites legais - há cerca de um milhão de registos e cada pessoa pode estar presente em mais do que um site - apostaram cerca de 2431,8 milhões de euros. Isto correspondeu uma receita bruta - a verba com que as empresas ficam após pagar os prémios - de 152 milhões de euros, mais 24% do que em 2017. As entidades que exploram estes jogos pagaram 66,5 milhões de euros de imposto especial de jogo online (IEJO), uma subida de 22,7% em relação ao ano anterior..E se estes são os dados oficiais - estão disponíveis na página do Serviço de Regulação e Inspeção de Jogos -, as estimativas apontam para valores perto dos 90 milhões euros - extrapolando 60% dos 152 milhões de receita líquida - que são ganhos anualmente por quem explora sites ilegais onde após pagar uma determinada verba o jogador recebe uma password com a qual pode entrar nessas páginas e apostar em qualquer lugar e em qualquer plataforma desde que tenha uma ligação à internet..A projeção de que haverá 60% de receitas geradas de forma ilegal no jogo online é feita na sequência de um estudo apresentado pela Remote Gambling Association (associação que reúne empresas ligadas ao setor) no final de 2017. Através de inquéritos a jogadores este inquérito chegou à conclusão de que cerca de 60% dos inquiridos preferiam apostar em sites não regulamentados. E a explicação é simples: as odds (prémio pago por cada aposta) são maiores..Mais uma vez, a justificação está no imposto, diz António Vieira Coelho. "Por isso vamos diminuindo o valor das odds. Enquanto nos casinos físicos o imposto incide sobre a receita bruta [após serem pagos os prémios], nas apostas desportivas é sobre a receita total. Se pensarmos que depois de pagarmos os prémios ficam para a casa entre 6% e 9% da receita, percebe-se que não é possível manter os níveis de rentabilidade. Diminuímos o valor das odds e deixa de ser competitivo, interessante para o apostador. Assim as pessoas vão jogar nos sites ilegais que como não pagam impostos podem pagar prémios melhores."."Hoje qualquer pessoa tem acesso à internet, pega no telemóvel, iPad ou computador e joga. Se vai a um site legal que, como tem de cumprir uma série de regras, tem apostas baixas, porque não vai jogar ilegalmente?" O administrador da Estoril Sol tem a expectativa de que esta situação possa ser alterada em breve com a mudança na forma e no valor de pagamento do IEJO. Esta questão estará a ser avaliada pelo grupo de trabalho criado no início do ano pelo governo, tal como o regime de Exploração e Prática das Apostas Hípicas Mútuas de Base Territorial.."Tenho esperança de que venha alguma notícia por aí [do grupo de trabalho]", adianta, explicando o que, no seu entender, podia ser uma solução: "Uma taxa de 25% para todos os jogos, tanto no casino físico como nas apostas desportivas. Alinhava-se pela mesma base de tributação em vez de ser por escalões." Seria, na realidade, o recuperar de uma fórmula que chegou a ser equacionada para fazer parte do Orçamento do Estado para 2019, mas que acabou por não integrar o documento..Além da questão das apostas serem mais favoráveis, a dificuldade dos atores tradicionais passa pela incapacidade de adaptar os jogos internacionais à legislação portuguesa. "Temos imensa dificuldade em oferecer jogos novos pois os grandes produtores não estão para fazer alterações, dizem que não vale a pena. Mais uma vez, os ilegais não têm esse problema", explica António Vieira Coelho. .Frequentemente, a Estoril Sol elabora listas de páginas ilegais e envia-as para o regulador. Mas pouco acontece. "Eles [SRIJ] comunicam às operadoras, elas fecham o site e ele volta a abrir com um novo endereço". No relatório referente à atividade do jogo online em Portugal, o Serviço de Regulação e Inspeção de Jogos refere que durante o ano passado foram notificados para encerrarem 338 websites. Nos 12 meses de 2018 foi pedido o bloqueio de 270 sítios na internet e feitas 13 participações ao Ministério Público..As apostas nos e-Sports.Sem que estas questões tributárias e de oferta irregular tenham sido resolvidas, há já uma outra situação a merecer atenção: as apostas nos e-Sports - os jogos eletrónicos disputados online e que já se transformaram num fenómeno. A tal ponto que já existem sites que possibilitam a aposta em determinado jogo. "Temos de os regulamentar, pois só dessa forma conseguimos controlá-los. É uma modalidade que vai ter um crescimento grande e que se não formos rápidos a acompanhar seremos ultrapassados. As pessoas apostam, não vão ficar à espera de um regulamento", sublinha António Vieira Coelho..A juntar a estas duas modalidades, o jogo tradicional - dos casinos e online - conta também com a concorrência do Placard, propriedade da Santa Casa da Misericórdia que existe tanto na vertente física como num site, e da Raspadinha, o jogo que mais apostas consegue no país. "Em Portugal há 11 casinos - há mais um nos Açores, mas não vamos contar com esse - e todos juntos fazem 270 milhões de euros/ano - a chamada receita bruta de jogo. E só em 2015 a Raspadinha fez mil milhões [as contas de 2018 da Santa Casa da Misericórdia ainda não são conhecidas, mas no primeiro semestre desse ano este jogo já tinha receitas superiores a 800 milhões de euros]. Fiquei surpreendido por ver a Santa Casa a aproveitar o exclusivo das apostas físicas que estão bem disseminadas, como o Placard, e transportar esta proposta com o mesmo nome para o placard.pt e mantendo o outro [registo em papel]", diz o responsável da Estoril Sol..Concessão a acabar e apostas a reduzir no casino.Com todos estes desafios, a discussão sobre o futuro dos casinos e do jogo tradicional vai surgir num ano que começou com dados pouco confortáveis para a exploração, que nos dois primeiros meses de 2019 entrou em contraciclo com o que aconteceu em 2018. No ano passado, a Estoril Sol distribuiu 2706 milhões de euros em prémios - jogos físicos e online -, o que foi um recorde absoluto e em janeiro e fevereiro registou um decréscimo nas apostas..Os projetos novos incluem "criar uma sala de jogo online numa sala do casino físico" e renovar o público dos casinos. E continuar a tornar o espaço do casino em salas de espetáculos e galerias de arte, tem pela frente numa altura em que se aproxima o final da concessão - o novo concurso terá lugar em 2020 Nos últimos três anos, diz António Vieira Coelho, "tem havido um crescimento, mas ainda não recuperámos de dez anos de prejuízos. No ano passado crescemos quase 4%, os casinos da Estoril Sol representam mais de 60% do mercado nacional, mas neste ano estamos a baixar. Neste momento, nos dois primeiros meses, esse crescimento é negativo. Há muita gente a jogar, mas apostam menos. A razão? Não sei", diz. Quanto aos jogos que as pessoas mais procuram, a esmagadora preferência vai para as slot machines - é idêntico no jogo online de fortuna e azar.