Jesus em estreia no Fla-Flu, o clássico que é património imaterial do Rio de Janeiro

Jorge Jesus vai estar pela primeira vez no dérbi do Rio de Janeiro, que detém o recorde mundial de público em jogos entre clubes e que é considerado um dos mais vibrantes clássicos do futebol
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Depois de em Portugal ter estado em 23 dérbis entre Benfica e Sporting, 20 clássicos entre Benfica e FC Porto e nove entre Sporting e FC Porto, Jorge Jesus vai pela primeira vez experimentar o Fla-Flu, dérbi do Rio de Janeiro que tem estatuto de património imaterial da cidade e que é considerado um dos mais vibrantes jogos do futebol mundial.

Rivais há mais de um século, o clássico entre Flamengo e Fluminense detém o recorde mundial de público num encontro entre clubes: 194.603 espetadores. Aconteceu a 15 de dezembro de 1963, no Maracanã, era relativo à última jornada do Campeonato Carioca e terminou empatado a zero, resultado que permitiu ao mengão conquistar o título. Apenas o Brasil-Uruguai do Mundial de 1950 (199.854) - o célebre Maracanazo - e um Brasil-Paraguai da qualificação para o Mundial de 1954 (195.513), ambos no Maracanã, tiveram mais adeptos na história do futebol.

Um dia, o jornalista Mário Filho, adepto do Flamengo e que dá nome ao estádio mais conhecido por Maracanã, imortalizou o jogo de Clássico das Multidões, enquanto o seu irmão e também jornalista Nelson Rodrigues, adepto do Fluminense, é autor de diversas frases marcantes sobre o dérbi como "o Fla-Flu não tem começo. O Fla-Flu não tem fim" ou "o Fla-Flu começou quarenta minutos antes do nada".

Génese a fazer lembrar Benfica-Sporting

A rivalidade entre Benfica - então Sport Lisboa - e Sporting começou em 1907, quando oito jogadores dos encarnados se mudaram para os verde e brancos em busca de melhores condições de trabalho. Bastante semelhanças tem a génese da rivalidade entre Flamengo e Fluminense, que nasceu em 1912 quando nove jogadores do tricolor deixaram o clube para fundar departamento de futebol do mengão, que até então tinha apenas remo e polo aquático. No primeiro Fla-Flu, a 7 de julho de 1912, o Fluminense venceu por 3-2, embora à partida o favoritismo estivesse do outro lado.

Quatro anos depois, um novo duelo marcante contribuiu para a consolidação da importância do clássico. Num jogo do Campeonato Carioca, nas Laranjeiras, o Flamengo vencia por 3-2 quando o árbitro R. Davies assinalou um penálti a favorecer os rubro-negros. Riemer encarrega-se da execução, mas atira para fora. Depois é marcado outro penálti a favorecer o Flamengo, mas Sidney Pullen permitiu a defesa de Marcos de Mendonça. O árbitro mandou repetir a grande penalidade por duas vezes, o que levou a que os futebolistas do Fluminense protestassem bastante, acusando o árbitro de beneficiar o Flamengo. O árbitro não voltou atrás na decisão, o que gerou ainda mais protestos e uma invasão de campo por parte dos adeptos do Fluminense. O regulamento do Campeonato Carioca dizia que se um jogo estivesse parado mais de cinco minutos seria anulado, o que acabou por acontecer, pois a paralisação durou mais de sete minutos. Foi a primeira vez que um Fla-Flu do Campeonato Carioca foi anulado, tendo sido disputada nova partida a 8 de dezembro, no campo do Botafogo, com o Fluminense a vencer por 3-1. Curiosamente, esse segundo jogo esteve interrompido durante 20 minutos depois de a bola ter ido parar em cima de uma das bancadas.

A rivalidade foi crescendo durante as décadas seguintes, e em 1945 o Flamengo estabeleceu a maior goleada de sempre no clássico: 7-0, em jogo do Torneio Municipal. Porém, foi a partir de 1950, aquando da inauguração do Maracanã, que ganhou maiores proporções, com várias assistências superiores a 100 mil espetadores, sobretudo em jogos decisivos do Campeonato Carioca.

Outro clássico marcante no Maracanã remonta a junho de 1995, na final do Campeonato Carioca, e ficou decidido por um golo de barriga de... Renato Gaúcho, atual treinador do Grêmio e que recentemente se envolveu numa troca de palavras com Jorge Jesus a propósito do confronto com o Flamengo para as meias-finais da Libertadores. Na altura Renato jogava pelo Fluminense, depois de três passagens pelo mengão, e marcou aos 87 minutos o golo que deu a vitória por 3-2 e o título ao tricolor carioca.

A 4 de abril de 1999, antes das obras de modernização do Maracanã, registou-se o último Fla-Flu com mais de 100 mil espetadores: 106.111. Entretanto, o clássico entre Flamengo e Vasco da Gama também ganhou grande protagonismo nas principais decisões do futebol brasileiro, mas desengane-se quem pense que os duelos entre mengão e tricolor deixaram de ser fervorosos.

Em janeiro de 2010, por exemplo, o Fluminense foi para intervalo a vencer um jogo do Campeonato Carioca por 3-1 e já se ouviam olés no Maracanã, mas na segunda parte o Flamengo foi demolidor e acabou por ganhar por 5-3.

A rivalidade entre os dois emblemas cariocas também se estendeu às provas da CONMEBOL, a entidade que rege o futebol na América do Sul. Em 2009 mediram forças pela primeira vez numa competição internacional oficial, a Taça Sul-Americana - equivalente à Liga Europa -, com o Fluminense a seguir em frente. Mais recentemente, em novembro de 2017, o Flamengo redimiu-se e passou às meias-finais da prova depois de uma vitória por 1-0 no primeiro jogo e de um emocionante empate a três golos na segunda mão.

Por essa altura, já o Fla-Flu era considerado património imaterial do Rio de Janeiro, sendo o único clássico de futebol a merecer essa honra. Esse estatuto foi atribuído em 2012, quando se completou um século desde o primeiro confronto entre Flamengo e Fluminense.

Sociedade conjunta para administrar Maracanã

Embora ambos os clubes tenham tido outras estádios, como o Rua Paysandu e a Gávea no caso do Flamengo e as Laranjeiras e o Engenhão no do Fluminense, tem sido o mítico Maracanã o palco de eleição dos clássicos. Acolheu mais de 200.

Propriedade do Governo do Estado do Rio de Janeiro, o maior estádio do Brasil está concessionado desde abril deste ano à sociedade anónima Fla-Flu S.A., criada pelos dois clubes com o propósito de administrar o recinto.

Ainda assim, o Fla-Flu já foi disputado em 16 cidades, entre as quais Corunha, em Espanha. Um dos clássicos disputados fora do Rio ficou marcado pela despedida de Zico, na cidade de Juiz de Fora, em Minas Gerais, assinalada com uma goleada do Flamengo por 5-0, em dezembro de 1989.

Zico é precisamente o maior goleador do Fla-Flu, com 19 golos em 44 jogos. Embora os registos divirjam de fonte para fonte, as mais credíveis apontam para 422 clássicos entre os clubes cariocas, com 153 vitórias e 610 golos para o Flamengo e 131 triunfos e 556 remates certeiro para o Fluminense - houve ainda 138 empates.

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