Isabel Minhós Martins vive num Planeta Tangerina
A escritora Isabel Minhós Martins, de 38 anos, começou a ir à Feira do Livro Infantil de Bolonha, na Itália, quando estava ainda na Faculdade de Belas Artes com os amigos Bernardo Carvalho e Madalena Matoso. Nessa altura, não tinham livros para vender nem negócios para fazer. Iam pelo prazer de ver as melhores ilustrações que se estavam a fazer pelo mundo fora.
Esta semana, lá estarão todos outra vez, agora em nome da Planeta Tangerina, uma das mais importantes editoras naacionais de livros infantis. Bernardo e Madalena integram a exposição de ilustradores da representação portuguesa na feira. Isabel vai apresentar ali o seu livro mais recente, "Nunca Vi uma Bicicleta e os Patos Não me Largam". E a Planeta Tangerina é um dos 186 candidados, de 66 países, ao prémio Alma - Astrid Lindgren, o mais importante prémio na área da literatura infantil, cujo vencedor será anunciado na terça-feira.
Fundada por estes três amigos, a Planeta Tangerina começou em 1999 como atelier de comunicação e design e é, desde 2004, também uma editora de livros infantis. Tudo começou quase por acaso, um trabalho levando ao outro, sem grandes planos para o futuro. O primeiro livro a chegar às livrarias foi 'Um livro para todos os dias' (recentemente reeditado) e desde o início Isabel assumiu o papel de escritora de serviço. "Nunca escrevi um livro que não fosse ilustrado, tenho ali um texto na gaveta mas não tenho coragem para isso. Há tantos livros, não sei se vale a pena publicar mais um", confessa Isabel Minhós Martins.
A formação em artes ajuda-a no processo de escrita. "Normalmente faço o texto e depois vem a ilustração. Tem que se ter um espírito muito aberto porque é inevitável que na nossa cabeça surjam imagens quando escrevemos mas temos que estar preparados para as imagens que o ilustrador vai criar e que podem ser diferentes das que nós imaginámos. Mas a riqueza do álbum ilustrado é existirem esses dois discursos, que às vezes dizem a mesma coisa, outras dizem coisas diferentes, mas são paralelos e sobrepõem-se e dialogam."
Escrever pequenos livros ilustrados exigem, além disso, uma grande contenção, nas ideias e nos textos, explica a autora: "Não passo muito tempo a escrever, passo é muito tempo a pensar. Há que saber distinguir uma ideia boa de uma ideia má e deitar 99% das ideias para o lixo. Depois, o texto tem que ser muito económico, porque depois a ilustração vem e pode dizer uma coisa melhor e corta-se o texto."
Não foi preciso muito tempo para que a Planeta Tangerina se
impusesse como uma das mais importantes editoras de livros infantis no mercado português. Os seus ilustradores têm recebidos diversos prémios - no ano passadoYara Kono venceu o Prémio Nacional de Ilustração. E os livros também têm sido reconhecidos, pela crítica e pelo público. "Pê de Pai" e "Coração de Mãe", ambos com texto de Isabel Minhós Martins e ilustrações de Bernardo Carvalho estão entre os maiores sucessos.
"Para quem são os nossos livros? Essa é uma grande pergunta", medita a autora. "É verdade que há muitos adultos a comprar os nossos livros. O album ilustrado só é lido na sua totalidade quando se forma um par de leitores adulto/criança, porque cada um consegue ler uma coisa." E conclui: "Nos nossos livros o universo da infância está sempre presente, mas a infância não pertence só ás crianças, também pertence aos adultos. Continua dentro de nós para sempre. Veja-se, por exemplo, 'O livro dos quintais', é um livro que nos traz muitas memórias. Ou o 'Andar por aí' que nos mostra um miúdo que vai andar com o avô pela rua, e as pessoas que encontra e aquilo que vê. São temas universais."
Isabel acredita que "não há temas para crianças ou para adultos".
Os livros são o que deles quisermos fazer. E dá como exemplo o livro 'Para onde vamos quando desaparecemos' (este com ilustrações de Madalena Matoso), que aborda um tema complicado como a morte mas com uma delicadeza que é já uma imagem de marca dos livros da Planeta Tangerina. Juntar abstração e simplicidade é o grande desafio de quem escreve para um público mais novo.
"Evoluimos imenso nesta área", garante Isabel Minhós Martins, "há muitos pais muito preocupados com o acesso aos livros, alguns ainda escolhem livros do primeiro degrau - porque a leitura é como uma escada que é preciso subir - se calhar ainda há alguns mitos e preconceitos sobre a literatura infantil. Mas estamos a evoluir." A autora apercebe-se disso nas suas muitas visitas às escolas. "Alguns dos nosso livros causam uma certa estranheza mas há uma vontade por parte dos professores e dos professores bibliotecários de descobrir estes livros, mesmo não sendo óbvios. E trabalham-nos com os miúdos. É muito bom ver isso."