IRS. Queixas ao provedor sobre os reembolsos aumentaram 7,5 vezes
"Nem sei se estou feliz ou aborrecido de tanto esperar. De dia 19 de abril até dia 10 de novembro passou para declaração certa. Será que recebo antes do Natal? Veremos." O desabafo é de M.P., mas está longe de ser caso único. De tal forma que ao gabinete do provedor de Justiça chegaram neste ano 97 queixas sobre atrasos no reembolso do IRS, o que resulta numa subida de 7,5 vezes por comparação com os 13 pedidos de intervenção remetidos a José de Faria Costa ao longo de todo o ano passado.
A mudança nas regras do IRS - na sequência da reforma deste imposto que mudou a lógica de contabilização das deduções - fez que o tempo médio de processamento dos reembolsos tivesse sido neste ano ligeiramente superior ao do ano passado: mais cinco dias em média. Mas as reclamações, traduzidas em pedidos de esclarecimento junto dos serviços de Finanças, em trocas de experiências pelas redes sociais e em pedidos de intervenção do provedor de Justiça, surgiram sobretudo da parte dos contribuintes que viram as suas declarações ficar durante várias semanas suspensas até serem validadas como "certas" e que, por este motivo, receberam o reembolso com bastante atraso.
A questão levou até à criação na rede social Facebook de um grupo denominado Encalhados do IRS, em que não faltam relatos de atrasos, de pedido de informação sem resposta, de apelos ao provedor e também de "desencalhanços" - vários a acontecer em outubro e novembro.
"O provedor de Justiça abriu, em 2016, 97 procedimentos de queixa sobre atrasos nos reembolsos de IRS", adiantou fonte oficial em resposta ao DN/Dinheiro Vivo. A mesma fonte adiantou também que, na sequência destas queixas, foram solicitadas "à diretora de serviços do IRS um conjunto de informações que permitirão conhecer o estado atual do problema".
Na sequência das respostas que chegarem ao provedoria de Justiça, José de Faria Costa irá avaliar "a necessidade de uma intervenção que auxilie à resolução dos problemas e dificuldades sentidas e, por outro lado, dar resposta a todos os cidadãos que a este respeito se dirigiram ao provedor de Justiça".
Vários fatores contribuíram para que neste ano o processo de "validação" de algumas declarações demorasse mais tempo e que, consequentemente, também resvalasse a chegada do reembolso. Um deles esteve relacionado com as deduções. A reforma do IRS previa que apenas fossem consideradas as que constassem de faturas emitidas com o NIF dos contribuintes, mas problemas detetados ao longo do ano passado - nomeadamente a constatação de que algumas despesas não estavam a ser contabilizadas corretamente.
Esta situação levou o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Fernando Rocha Andrade, a criar um regime excecional (que vai manter-se ativo em 2017) através do qual puderam ser os contribuintes a indicar o valor de despesas de saúde e de educação que constava das faturas que tinham juntado ao longo do ano e rejeitar o cálculo prévio do fisco.
A isto, somou-se ainda o regime que fazia depender a tributação em conjunto da data de entrega da declaração - o que levou a que alguns contribuintes tivessem feito uma primeira declaração e mais tarde uma segunda.
Os fatores que estiveram na origem de atrasos no reembolso também se observaram nas cobranças e de forma ainda mais acentuada. Habitualmente o IRS em falta tem de ser pago até 31 de agosto, mas neste ano algumas pessoas foram chamadas a pagar mais tarde precisamente porque Fernando Rocha Andrade deu indicações aos serviços para darem prioridade aos reembolsos. De tal forma que o valor das notas de cobrança para serem pagas depois daquele prazo ascendeu a 594 milhões de euros - mais 359 milhões do que um ano antes.