Instituto da droga quer centros de saúde a fazer rastreio de vícios
Os médicos e enfermeiros dos centros de saúde vão fazer parte de uma rede de referenciação de pessoas com problemas relacionados com o consumo de bebidas alcoólicas. Este é um dos projetos que o Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD) tem previsto para tentar detetar hábitos de risco que podem transformar-se em problemas de saúde mais tarde. Ou que já o são, mas sem que o utente do centro de saúde se aperceba.
Este projeto passará por um questionário feito a quem se dirija a uma destas unidades e com o qual os profissionais tentarão detetar indícios da existência de consumos anormais de bebidas alcoólicas - diariamente, por exemplo.
A questão do consumo de álcool e de canábis foi a que maior destaque mereceu nos relatórios sobre a situação do país em matérias de drogas, toxicodependências e álcool, referentes a 2016 e ontem apresentados. Nestes documentos, o SICAD chama a atenção para o aumento no consumo nas mulheres e nas faixas etárias mais velhas - a partir dos 45 anos.
Outro dos alertas está relacionado com a menor fiscalização da venda de bebidas alcoólicas a menores. De acordo com os dados que as autoridades forneceram, em 2016 foram fiscalizados 12 193 estabelecimentos comerciais, número que representa uma descida de 22% em relação a 2015.
"A lei diz que quem vende e serve bebidas a menores deve ser penalizado. Tem de se atuar por aqui. Punir quem serve e vende aos menores", frisou ao DN Manuel Cardoso, subdiretor do SICAD.
Este responsável admite que as entidades responsáveis por essa fiscalização [polícias, ASAE] "possam ter falta de recursos", mas salientou: "A verdade é que a fiscalização é pouca. Toda a gente que saia à noite vê menores a consumir. A nossa complacência é tão grande. Há até indivíduos mais velhos que, mesmo sem conhecer os menores, vão comprar-lhes a bebida caso lhes seja pedida a identificação. Este não é só um problema português, na Europa também não se consegue fazer esta fiscalização."
O consumo por parte das faixas etárias mais velhas - a partir dos 45 anos - é outra das preocupações. "Está a aumentar a infeção por VIH em indivíduos com consumo de álcool. Temos de perceber o que é isto. Provavelmente estará relacionado com comportamentos de risco", frisou. Considerando dramático um outro dado: "As intoxicações alcoólicas aumentaram de 37 (em 2015) para 45 (2016). A morte por intoxicação alcoólica é inaceitável." Aliás, morreram mais pessoas por este consumo do que por overdose por drogas - 27, em 2016. Uma descida em relação às 40 do ano anterior.
"Temos de intervir junto dos mais velhos. A pessoa tem de ter a noção de que está a correr riscos. Precisamos de identificar os comportamentos para depois ver se os alteramos", sublinha. Daí a importância da referenciação que pode ser feita aos utentes dos centros de saúde. Além das faixas etárias mais velhas, o consumo - seja de álcool como de drogas - por parte das mulheres é outra das preocupações, pois os dados mostram que estão a subir. "Por exemplo, o cancro da mama na mulher está relacionado com o consumo de álcool. Se este já é um dos maiores problemas que atingem as mulheres, como será daqui a uns anos?", questiona Manuel Cardoso. Ainda relacionada com o álcool está a subida dos acidentes de viação em que foi registado um aumento de mortes relacionadas com este consumo - 163 -, além de que várias delas foram de peões que se apresentavam com valores de álcool no sangue elevados.
Quanto ao consumo de droga, o relatório frisa que o consumo de canábis [haxixe] se agravou nos últimos cinco anos com mais pessoas a consumir e a fazê-lo diariamente. Novamente, também nas mulheres e nos grupos etários entre os 25 e os 44 anos.