IndieJúnior: do cinema para bebés ao 'E.T.' de Steven Spielberg
A história da vida de uma cadelinha preta e branca que passou por vários donos e teve diferentes nomes pode ser um bom ponto de partida para olhar o programa da 4.ª edição do IndieJúnior Allianz, subordinado ao tema da viagem. Justamente, A Extraordinária Viagem de Marona, da romena Anca Damian, longa-metragem que integra a competição do festival, é um exemplo perfeito da maior jornada de todas, aqui concebida através de um pacto entre a delicadeza narrativa e a criatividade mais fervilhante.
Nesta animação cheia de cores, personagens e paisagens fluidas, Marona - assim se chamou nos seus últimos anos de vida - é um pequeno animal que nos conta o filme da sua vida quando está prestes a desaparecer deste mundo. Vemo-la, assim, a atravessar a existência, de dono em dono, entre o medo e o afeto, empurrada pelas linhas do acaso, como uma criatura mágica à procura de um recanto no coração do espectador... Haverá outras viagens, claro, mas esta é uma das mais fascinantes deste IndieJúnior.
Também com cúmplices de quatro patas em desenho animado, Jacob, Mimmi e os Cães Falantes, do letão Edmunds Jansons, é outra das adoráveis propostas da competição: uma aventura num subúrbio histórico da cidade de Riga, Maskachka, que junta dois primos e uma matilha de cães falantes na luta contra a construção de um arranha-céus num parque local. Filme de animação que se vê como quem folheia um livro (não admira, já que o realizador é ilustrador de livros para crianças) e com elogio à própria arte do desenho, neste caso, em relação com o universo da arquitetura.
Já em imagem real, Uma Colónia, ficção da canadiana Geneviève Dulude-De Celles, centrada numa adolescente introvertida e no seu caminho para se libertar das inseguranças que a tolhem, completa o painel de longas-metragens selecionadas, numa competição composta por mais de 50 títulos, sendo os restantes no formato de curta-metragem.
Além da seleção oficial, neste ano há um foco na obra de outro canadiano, Norman McLaren (1914-1987), pioneiro da animação artística conhecido pela técnica do desenho direto na película, e volta também o chamado cinema de colo - uma experiência imersiva, abaixo dos 3 anos. São sessões com cerca de 25 minutos de duração, em que se projeta para os bebés acompanhados uma série de filmes curtos com narrativas de cores e sons que despertam os sentidos num ambiente aconchegado.
Por sua vez, a secção O Meu Primeiro Filme, que reúne as escolhas de três personalidades com base nas suas reveladoras experiências cinematográficas, traz O Clube dos Poetas Mortos (1989), de Peter Weir, proposta de Marta Bateira, a youtuber conhecida como Beatriz Gosta, que aqui recupera a eterna personagem de Robin Williams, esse professor que todos gostaríamos de ter tido; ainda A Quimera do Ouro (1925), uma das mais brilhantes e comoventes comédias mudas de Chaplin, selecionada pela realizadora Regina Pessoa (há pouco galardoada nos Prémios Annie com a sua curta-metragem de animação Tio Tomás, A Contabilidade dos Dias, que esteve à porta da nomeação para o Óscar); e, finalmente, E.T. - O Extraterrestre (1982), de Steven Spielberg, uma eleição de António Preto, o diretor da Casa do Cinema Manoel de Oliveira, que convida a (re)descobrir o imaginário dessa maravilhosa obra-prima da ficção científica, em que o regresso a casa é a mais bela das mensagens fixada na antológica cena da bicicleta que voa sobre a imagem da lua.
O encerramento do IndieJúnior Allianz, no dia 2 de fevereiro, fica a cargo da Associação Porta-Jazz, com um cineconcerto que exibe O Barco (1921), de Buster Keaton. Todas as sessões deste Festival Internacional de Cinema Infantil e Juvenil decorrem entre as salas do Teatro Rivoli, Biblioteca Municipal Almeida Garrett, Casa das Artes e Reitoria da Universidade do Porto.