Incendiário político e radical da linha mais dura
Aos 76 anos, Jean-Marie Le Pen é um dos mais experientes políticos europeus especializados em actividades de oposição. O líder da extrema-direita francesa está no activo há 50 anos e é imitado em vários países. Radical de linha dura, tem torpedeado os melhores planos dos partidos tradicionais, num estilo franco-atirador que valoriza truculência, populismo e terrorismo verbal.
Le Pen nunca foi um construtor, mas antes um permanente obstáculo. O seu partido, a Frente Nacional, esteve na recente campanha pelo "não" à constituição europeia, projecto de tratado na UE que poderá ter morrido após a recusa do eleitorado francês. Nas eleições presidenciais, em 2002, a passagem de Le Pen à segunda volta, com o correspondente afastamento do candidato socialista Lionel Jospin, constituiu um terramoto político: acabou num combate entre Chirac e Le Pen, concluído com um rotundo oito a dois que era uma espécie de goleada da equipa que marcara os dois golos.
O exemplo ilustra a forma como o incendiário da política francesa tem alterado a lógica do sistema. Embora derrotado de forma tão expressiva nas presidenciais, o facto é que Le Pen, nessa ocasião, conseguiu fragilizar o segundo mandato de Chirac e dividir ainda mais a esquerda francesa, que ainda hoje sofre os efeitos do desastre.
"Homem do povo", Jean-Marie Le Pen foi mineiro e pescador, combateu em vários conflitos, de forma mais famosa na guerra da Argélia, para onde foi como voluntário, já depois de ter sido eleito deputado de extrema-direita, aos 27 anos. Recentemente, a Imprensa publicou novas histórias sobre o alegado envolvimento de Le Pen em torturas, acções que o político sempre negou. Depois da Argélia, Le Pen perdeu um olho numa arruaça e foi forçado a ganhar dinheiro, montando um negócio de editor que chegou a publicar discos com canções nazis.
Esta é a fase de formação de um projecto político que em 1972 acaba por dar origem a um partido, a Frente Nacional (FN). Esta formação teve um início modesto, sustentando-se nos discursos inflamados do líder. Mas a FN também aproveitou a lentidão com que os partidos tradicionais reagiram às mudanças na sociedade. O partido começou a ter bons resultados e conquistou bastiões municipais.
Em breve, a FN estava a ser imitada em diversos países, como Áustria, Suíça, Bélgica ou Dinamarca, com o aparecimento de forças políticas xenófobas, proteccionistas na economia e de discurso ultranacionalista e antieuropeu. Esta evolução deu-se ao longo dos anos 90 e provocou forte reacção dos partidos tradicionais e dos media. A extrema-direita cresceu em quase toda a Europa, com votações entre 10% e 15%, juntando o eleitorado farto do discurso monótono dos conservadores, mas também votantes sob o choque das transformações sociais, por exemplo, os desempregados ou os pobres em contacto com minorias étnicas.
Radicalmente antieuropeu, Le Pen namorou com a ideia de criar um movimento de extrema-direita que abrangesse vários países. As divisões internas impediram o projecto. Partidos como a FN, cujo crescimento se baseia na contestação e na crise, são vítimas do próprio êxito: chegados a um certo patamar, que para outros é próximo do poder, esbarram com o seu carácter radical. Le Pen está no final da carreira, mas a sua criação persistirá, enquanto houver terreno apropriado para que cresça a semente da demagogia.
O DN está a publicar uma série de artigos sobre os protagonistas políticos que ocupam há mais de 20 anos a primeira linha da luta pelo poder. Durante Agosto, conheça o percurso destas personalidades - desde primeiros-ministros a líderes religiosos - e compreenda as razões da sua longevidade. Hoje, o DN publica o perfil do líder da Frente Nacional. Amanhã, em destaque estará o Presidente de Benim, Mathieu Kérékou.