Imigrantes, drogas e muro: as falsidades no discurso de Trump à nação

Presidente norte-americano falou durante oito minutos a partir da Sala Oval sobre o muro que quer construir na fronteira, repetindo mensagens erróneas que já tinha dito no passado.
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O presidente norte-americano, Donald Trump, tentou conquistar o apoio dos norte-americanos para o seu projeto de muro na fronteira com o México, falando na existência de uma "crise humanitária".

No discurso à nação, o primeiro que fez a partir da Sala Oval, inclui várias falsidades e verdades fora do contexto, como os media norte-americanos se apressaram a indicar.

Já prevendo esse facto, os democratas pediram tempo de antena, de forma a falar imediatamente depois de Trump, o que aconteceu, com Nancy Pelosi, líder da Câmara dos Representantes, e o senador Chuck Schumer, líder da minoria democrata no Senado, a falar lado a lado.

Eis algumas das declarações do presidente norte-americano:

"Todos os dias, os agentes da alfândega e as patrulhas nas fronteiras encontram milhares de imigrantes ilegais a tentar entrar no nosso país."

Na realidade, o número de pessoas que foram apanhadas a atravessar ilegalmente a fronteira do México com os EUA é um dos mais baixos nos últimos 20 anos: 2017 foi o ano mais baixo, com cerca de 300 mil detenções, enquanto no ano fiscal de 2018 foram detetadas quase 400 mil (média de 1087 por dia). No início do século, as detenções ultrapassavam anualmente um milhão de pessoas.

"É um exagero falar em 'milhares' por dia. É melhor dizer 'dezenas'", escreve o The Washington Post.

"[A imigração ilegal] sobrecarrega recursos públicos e diminui o número de empregos e salários"

Alguns economistas, refere o The New York Times, lembram que a imigração só diminui o número de empregos e dos salários dos norte-americanos se estes competirem pelos mesmos empregos. Em muitos casos, os imigrantes estão a concorrer a empregos que os cidadãos norte-americanos não querem.

Além disso, há patrões que se queixam que a falta de mão-de-obra imigrante está, na realidade, a levar a um aumento dos custos - e logo dos produtos que chegam aos consumidores. Em relação aos recursos públicos, apesar de os imigrantes ilegais representarem um custo para os serviços públicos, compensam ao pagar impostos.

"Todas as semanas, 300 dos nossos cidadãos morrem devido à heroína, 90% da qual entra através da nossa fronteira sul."

Os dados apresentados por Trump são verdadeiros: em 2017, mais de 15482 pessoas morreram devido a overdoses de heroína, o que equivale a 297 por semana. A análise da droga em 2016 determinou que 86% da heroína veio do México.

Contudo, segundo a CNN, aquilo que Trump não diz é que a maioria dessa heroína é contrabandeada através dos pontos de entrada legais (escondida em bens legais). Logo, o muro não teria impacto.

"Nos últimos dois anos, os agentes dos serviços de imigração prenderam 266 mil imigrantes ilegais com registo criminal, incluindo aqueles acusados ou condenadas de cem mil agressões, 30 mil crimes sexuais e quatro mil mortes violentas."

Apesar de o número de detenções estar correto, a National Public Radio lembra que muitos crimes são relacionados com questões de imigração ou de condução sob a influência de álcool ou drogas e não atos violentos, como o presidente refere. A mesma fonte cita o Instituto Cato, para lembrar que a taxa de crime entre os imigrantes é mais baixa do que em relação aos nascidos nos EUA, incluindo homicídios e outros crimes violentos.

"O muro acabaria muito rapidamente por se pagar a si próprio."

O presidente alega que o custo das drogas ilegais que chegam aos EUA é de 500 mil milhões de dólares (Trump pede 5,7 mil milhões para fazer o muro), mas parar o fluxo de drogas na fronteira sul não vai resolver o problema das dependências. E não é claro como é que reduzir o custo que o país tem com as dependências de drogas pode ajudar a pagar o muro.

"O muro também vai ser pago, indiretamente, pelo excelente novo acordo comercial que fizemos com o México."

É falso, desde logo porque o tratado ainda não foi aprovado pelo Congresso. Depois, porque os benefícios do novo acordo que substitui o NAFTA serão em termos de tarifas mais baixas para as empresas norte-americanas ou salários mais elevados para os trabalhadores - e não propriamente para pagar o muro.

"O senador Chuck Schumer (...) tem apoiado repetidamente uma barreira física no passado, assim como muitos outros democratas"

É verdade que o senador Schumer apoiou, no passado, legislação para uma barreira física na fronteira (uma cerca). Mas não um muro. Os democratas ofereceram 1,3 mil milhões de dólares para reforçar a segurança na fronteira, mas não os cinco mil milhões que Trump quer.

Schumer, o líder da minoria do Senado, falou ao país depois de Trump, ao lado de Nancy Pelosi, a líder da Câmara dos Representantes. "Não tenham dúvidas. Os democratas e o presidente querem uma segurança fronteiriça forte. Contudo, discordamos totalmente do presidente em relação à forma mais efetiva de o conseguir", afirmou.

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