Igualdade de género. Cada vez mais visível, mas progressos são lentos

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A agenda da Igualdade de Género tem vindo a assumir cada vez maior visibilidade. Deixou de ser um "problema das mulheres", como os seus detratores denunciavam, para passar a ser uma questão de direitos humanos que tem uma importância vital na construção do desenvolvimento coletivo e da paz.
Para isso contribuíram as sucessivas conferências promovidas pelas Nações Unidas para análise dos vários temas em que esta problemática se desdobra, mas também a crescente sensibilidade da sociedade para a injustiça que lhe está subjacente.

Importante para esta progressiva consciencialização foram as organizações não governamentais, bem como o envolvimento da Academia em linhas de investigação que identificaram os custos sociais e económicos decorrentes da desigualdade de oportunidades, culminando na criação de instâncias governamentais que desenvolveram agendas concretas para a combater.

A abordagem desta temática entre nós sofreu, naturalmente, um forte impulso com a revolução democrática, através da aprovação de uma Constituição que dá forte reconhecimento aos direitos fundamentais nos quais esta problemática se insere. Para além disso, avançou-se, logo de seguida, com a alteração de legislação anacrónica no domínio do direito civil, designadamente no direito de família, pondo-se fim a um conjunto de soluções de organização familiar que remetiam a mulher a um papel subalterno, serviçal e mesmo indigno. Mas os estereótipos permanecem e contrariá-los só terá êxito através de uma ação consistente, equilibrada e persistente, o que demora muito tempo a produzir efeitos, sobretudo se não se verificar estabilidade de orientação.

A integração de Portugal na União Europeia veio reforçar as condições políticas para o avanço determinado num conjunto de ações que, no plano interno, têm progressivamente alcançado um apoio social e parlamentar mais alargado. A produção de legislação que visa a criação de um quadro jurídico consistente que vá no sentido da correção das distorções que propiciam que a desigualdade permaneça e que promova a alteração de comportamentos que contrariam o livre desenvolvimento da personalidade tem seguido no sentido certo e os avanços são indiscutíveis .

No entanto, e apesar de todos os esforços, devido à própria natureza do problema, têm sido lentos os progressos alcançados, não apenas entre nós mas a nível mundial e europeu.

Razão pela qual é fundamental a permanente avaliação das políticas e a atuação através de áreas prioritárias que, consagradas em programas estratégicos de ação, deem consistência e rumo à ação política.

A Estratégia para a Igualdade de Género da UE, com a qual a presidente Von der Leyen está pessoalmente comprometida, identifica cinco eixos prioritários: aumentar a participação das mulheres no mercado de trabalho e a independência económica de mulheres e homens; reduzir o diferencial de salários e pensões para combater a pobreza no feminino; promover a igualdade entre mulheres e homens no processo de decisão; combater a violência de género, proteger e apoiar as vítimas; promover a igualdade de género e os direitos das mulheres em todo o mundo.

Para atingir estes objetivos reafirma-se o compromisso com a transversalidade da agenda em todas as políticas da União, bem como nos seus programas de financiamento.

A pandemia veio introduzir novo retrocesso nesta dinâmica. Basta debruçarmo-nos sobre o aumento do número de horas de trabalho não pago em tarefas domésticas e acompanhamento escolar dos filhos que pesou sobre as mulheres ou sobre a vulnerabilidade acrescida que os confinamentos proporcionaram em termos de violência de género sobre mulheres e raparigas.

E como se tal não bastasse, a invasão da Ucrânia confronta-nos com um fenómeno de contornos que não imaginávamos possível, em pleno século XXI e na Europa, de negação do direito à autodeterminação para satisfação de ambições imperialistas sanguinárias e que nem sequer respeitam os mais basilares princípios aplicáveis em tempo de guerra.

E este fenómeno coloca-nos, da forma mais cruel, perante a natureza estrutural da desigualdade de género: mulheres que abandonam, sozinhas com os seus filhos, a sua casa, os seus familiares, o seu país, em busca de segurança para eles e que, ao fazê-lo, se colocam numa nova e perigosa vulnerabilidade, pois são presa fácil e indefesa para quem não tenha escrúpulos.

Pese embora a expressiva generosidade de acolhimento a que temos assistido, não podemos baixar a guarda e temos de fazer o possível e o impossível para proteger estas mulheres e estas crianças!

É esta a nossa urgência maior, hoje!

Diário de Notícias
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