Hollande remodela governo e ecologistas regressam ao poder
O presidente François Hollande procedeu ontem a uma importante remodelação no governo de Manuel Valls, que apresenta como maiores novidades o regresso dos ecologistas ao poder, o reforço de poderes de Ségolène Royal em tudo o que respeita as questões ambientais e a surpresa de ter o ex-primeiro-ministro François Ayrault à frente dos Negócios Estrangeiros.
Ao recuperar o seu primeiro chefe de governo (2012-2014), e figuras da área ecologista, Hollande está a recentrar à esquerda o executivo de Manuel Valls, quando falta menos de ano e meio para as presidenciais de 2017. No campo socialista, Ayrault foi um dos críticos declarados da orientação de Valls em matéria económica, como se opôs ao projeto do chefe do governo de incluir na Constituição a perda da nacionalidade francesa para os detentores de dupla nacionalidade condenados por terrorismo.
Os três ministros ecologistas - a líder cessante de Europa Ecologia, Emmanuelle Cosse, e dois ex-dirigentes que deixaram esta formação - assim como a presença do presidente do Partido Radical de Esquerda, Jean-Michel Baylet, são a expressão política da recentragem feita por Hollande, mas a manutenção de Valls e de Emmanuel Macron, na Economia, e de Michel Sapin, nas Finanças, indicia que nesta matéria não haverá alterações significativas.
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Numa entrevista à TF1 e à France 2, ontem à noite, Hollande explicou as prioridades do novo executivo: "a proteção dos franceses, (...) a criação de emprego (...) e o que foi assinado na COP21 [cimeira do clima de Paris, em finais de dezembro], a ecologia, o ambiente". A taxa de desemprego é hoje de 10,6%.
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No plano social, o presidente francês garantiu "reformas" e "mudanças" nas áreas sociais e do trabalho, a serem anunciadas por Valls, mas não deixou de elogiar o trabalho de Macron, um liberal. Noutro plano, num comentário ao distanciamento que Macron tomou face à proposta de perda de nacionalidade, Hollande referiu que o ministro "tem o seu temperamento".
Sobre a questão da perda da nacionalidade - na origem da recente saída, pela esquerda, da ministra da Justiça, Christiane Taubira -, o presidente limitou-se a dizer que não quer a "eternização do debate".
A questão das presidenciais não deixou de ser abordada, mas também aqui Hollande evitou respostas claras, declarando apenas que tomará uma decisão "no momento adequado" e recusa entrar no "debate das primárias". Perfilam-se várias candidaturas no campo político do presidente, tendo o dirigente do Partido de Esquerda, Jean-Luc Mélenchon, anunciado na quarta-feira que se vai apresentar em 2017.
No plano das correntes no interior dos socialistas, além de recuperar Ayrault, o outro detalhe relevante desta remodelação é o reforço de competências e peso político de Ségolène Royal.
A antiga companheira de Hollande, ministra da Energia, Ecologia e Desenvolvimento Sustentável, cujo nome chegou a ser referido para os Negócios Estrangeiros, vê alargada a sua esfera de ação, passando a tutelar as negociações internacionais na questão do clima.
Pormenor que não deixa de ser irónico é o de que Ayrault regressa a funções governativas num executivo dirigido pelo seu ministro do Interior e que, segundo diferentes media franceses, foi decisivo para o afastamento do primeiro em 2014.
Com o seu regresso ao governo, Ayrault passa a integrar o restrito clube de antigos primeiros-ministros que regressam a funções oficiais apenas como ministros. Caso de Alain Juppé, primeiro-ministro entre 1995 e 1997, na presidência de Jacques Chirac e, no primeiro governo de Valls, de Laurent Fabius, que fora o mais jovem primeiro-ministro francês, entre 1984 e 1986, sob o mandato presidencial do socialista François Mitterrand, na conjuntura política conhecida sob a designação de coabitação.
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Além da necessidade de de recuperar espaço à esquerda, a remodelação agora efetuada e, em particular, a substituição de Fabius por Ayrault, um indefetível aliado de Hollande, era necessária pois o presidente decidira nomear o primeiro para dirigir o Conselho Constitucional, equivalente ao Tribunal Constitucional em Portugal.
O segundo governo Valls mantém o principio da estrita paridade entre homens e mulheres e cresce em mais seis titulares, sendo composto por 38 elementos enquanto o anterior era constituído por 32.