Hamas aceita eleições e dá passo para frente unida palestiniana

Fatah, do presidente Mahmoud Abbas, mostrou-se recetiva a reaproximação ao grupo integrista que governa Gaza desde 2007. Egito tem mediado diálogo entre os dois lados no Cairo
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De acordo com a ONU, a Faixa de Gaza pode ficar inabitável até 2020. Com dois milhões de habitantes amontoados numa área de 40 quilómetros por dez de largura, o território palestiniano tem sido na última década alvo de um bloqueio de Israel e do Egito que o sujeita a constante falta de água e de energia - os residentes só têm eletricidade três a quatro horas por dia. Uma situação extrema que explica em parte a decisão do Hamas, que ontem anunciou estar disposto a dissolver a comissão que criou em março para administrar o território que controla desde 2007, realizar eleições gerais e começar de imediato o diálogo direto para a reconciliação com a Fatah do presidente Mahmoud Abbas. Um passo em direção a uma há muito desejada frente unida palestiniana.

Com Abbas a caminho de Nova Iorque para participar na Assembleia Geral da ONU que começa amanhã, a Fatah - que governa as zonas da Cisjordânia que não estão sob controlo de Israel - mostrou-se recetiva mas cautelosa em relação ao anúncio do Hamas. "Se esta é a posição do Hamas, é um sinal positivo. Nós na Fatah estamos preparados para implementar a reconciliação", garantiu à Reuters Mahmoud Aloul, alto responsável do grupo.

O Hamas venceu as legislativas palestinianas de 2006 e o governo de união que daí resultou durou pouco. E após confrontos mortíferos na Faixa de Gaza no ano seguinte, o grupo integrista expulsou a Fatah daquele território. Na altura, o presidente Mahmoud Abbas demitiu o primeiro-ministro do Hamas. Desde então a liderança palestiniana dividiu-se: a Fatah governa na Cisjordânia, o Hamas governa a Faixa de Gaza. Todas as tentativas dos dois grupos para se entenderem na última década e formarem um governo de união falharam.

Segundo o diário israelita Haaretz, os dois lados parecem agora estar à espera para ver o que o outro vai fazer. "[A Autoridade Palestiniana - AP] estará à espera para ver como as coisas se desenvolvem e até que ponto o Hamas quer mesmo desistir do poder na Faixa de Gaza. Ao mesmo tempo, o Hamas estará à espera para ver até que ponto Abbas está disposto a cooperar com eles e a incluí-los na Organização para a Libertação da Palestina [OLP] e na AP", escreve o jornalista Jack Khoury.

Na lista das organizações terroristas tanto dos EUA como da União Europeia, o Hamas terá cedido à pressão do Cairo, onde representantes do grupo integrista e da Fatah se encontram, com os diplomatas egípcios a fazerem a ligação entre ambas as delegações. "Este passo vai reforçar a união dos palestinianos e acabar com uma divisão feia", afirmou à WAFA, agência de notícias palestiniana, Azzam Al-Ahmad, o líder da delegação da Fatah no Cairo. Em 2014, uma tentativa de formar um executivo de união falhou devido à incapacidade de os dois lados chegarem a acordo sobre os detalhes práticos. Uma das questões colocadas na altura e que podem voltar a surgir agora é a reticência do Hamas em pôr as suas forças de segurança sob controlo de Mahmoud Abbas.

A reaproximação à Fatah é o último exemplo da mudança de rumo do Hamas. Depois de alterações na liderança do grupo, com Ismail Hanie a suceder a Khaled Meshaal como líder no estrangeiro e Yahya Al-Sinwar a ocupar o seu lugar à frente do movimento em Gaza, em maio, o Hamas emitiu um documento em que traça a sua nova política. É verdade que não fala no reconhecimento de Israel, mas aceita a criação de um Estado palestiniano nas fronteiras de 1967, além de moderar a retórica antissemita.

Com Abbas, de 82 anos, enfraquecido e sem sucessor claro, o certo é que várias sondagens dão o Hamas a vencer a Fatah tanto em Gaza como na Cisjordânia, em caso de eleições.

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