Gulbenkian vende negócio do petróleo e do gás. Onde vai investir agora?
Gulbenkian não é apenas sinónimo de cultura, arte ou investigação científica. O próprio fundador, Calouste Gulbenkian, criou há mais de 80 anos, em 1938, uma empresa de petróleo e de gás que era detida há pelo menos seis décadas pela fundação e que agora foi, finalmente, vendida.
Nesta segunda-feira, a Fundação Calouste Gulbenkian anunciou a assinatura de um acordo para a venda da petrolífera Partex à empresa pública tailandesa de exploração e produção de petróleo PTT Exploration and Production (PTTEP), pelo montante de 555 milhões de euros, cumprindo assim o prazo anunciado pelo presidente executivo da empresa, António Costa Silva, para encontrar um comprador até ao final do primeiro semestre do ano. Na corrida estiveram 14 empresas europeias e asiáticas e a entrega de propostas decorreu até final do mês de março.
A Fundação Gulbenkian tinha já anunciado a sua intenção de sair do negócio da exploração de petróleo, com ativos avaliados em cerca de 457 milhões de euros em 2017 (uma desvalorização de 38,4 milhões de euros face a 2016), com o objetivo de se tornar mais verde e sustentável.
"Esta transação marca uma reconfiguração da base de ativos da fundação que é investido com o objetivo principal de obter um rendimento atrativo a longo prazo. A recomposição reforçará a diversidade dos seus investimentos e impacto social, em linha com a natureza filantrópica das suas atividades", considerou Isabel Mota, presidente do conselho de administração da fundação.
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O portfólio de investimentos da Fundação Calouste Gulbenkian é constituído por uma carteira de aplicações financeiras diversificada, nos mercados globais, que só no ano passado gerou ganhos de 10%. Contudo, o ativo da fundação só cresceu 1,4% face a 2016. "A gestão dos restantes 80% dos recursos é feita com prudência e o investimento é alinhado com objetivos de desenvolvimento sustentável. Até agora havia uma concentração muito grande no petróleo. Queremos uma maior diversidade para maximizar os rendimentos", explicou a presidente da fundação.
De acordo com o último relatório de contas, o ativo da fundação era de três mil milhões de euros em 2017 e detinha capitais próprios de 2,6 mil milhões.
A Gulbenkian revelou que a operação terá um valor de 622 milhões de dólares (554,5 milhões de euros). De acordo com Isabel Mota, este valor foi superior à "primeira tentativa de venda" por 500 milhões de euros ao grupo chinês CEFC, cujas negociações acabaram por fracassar. "Relativamente ao montante, foi a melhor proposta que tivemos, não só numa ótica financeira, mas das condições que eram fundamentais para nós." O acordo deverá estar concluído até final do ano.
De acordo com o CEO, António Costa e Silva, em 2018 a Partex teve receitas na ordem dos 420 milhões de dólares e lucros de 37 milhões de dólares. "Todos os anos a Partex produz sempre bons resultados. Em 2018 pagámos 90 milhões de dividendos à Fundação Gulbenkian. Temos sempre feito esse nosso papel."
"A área da energia não pode estar fora de questão, porque é um dos grandes negócios de futuro", garantiu Isabel Mota. "Relativamente às áreas específicas e aos projetos em que vamos investir, dentro das regras de rigor e boas práticas de mercado, tudo o que tiver que ver com um efeito positivo para os grandes problemas da humanidade, e em particular das alterações climáticas, será uma área em que vamos procurar ver o que o mercado nos oferece. Não está fora de mira, mas não temos ainda uma lista definida."
Na visão da Fundação Gulbenkian, as energias renováveis são uma área a que estarão atentos para ver "que oportunidades o mercado oferece". "Vamos olhar, ver e analisar. Para já, nos próximos seis meses temos de trabalhar no período de transição, para garantir que fechamos a venda da Partex até ao final do ano", disse Isabel Mota em conferência de imprensa. Garantindo que ainda "não existe uma lista" de novos investimentos verdes para substituir a Partex.
"Já temos os nossos consultores internacionais a pensar em novos investimentos. Já temos uma carteira muito diversificada. Mas a atividade da fundação é independente da forma como se financia. É importante que tenha os recursos necessários para continuarmos a ter a nossa atividade e ampliá-la", explicou. "As questões ambientais pesam para uma fundação como a Gulbenkian e os investimentos devem estar alinhados com esse propósito. Já tivemos investimentos em energias renováveis no passado, deixámos, mas não foi por desinvestimento. Estamos abertos a novas ideias que privilegiem o melhor rendimento que se possa alcançar, em Portugal ou no estrangeiro", disse a presidente, sublinhando que "os ativos da Partex não são portugueses, por exemplo".
"A nossa ideia é privilegiar o melhor rendimento que possamos alcançar. Não há nenhuma preocupação de privilegiar o mercado português. Mas claro que também estamos atentos ao mercado português", garantiu Isabel Mota.
A Fundação Calouste Gulbenkian foi criada em 1956 por testamento de Calouste Sarkis Gulbenkian. É a maior fundação portuguesa e está entre as maiores de todo o mundo. A fundação tem como propósito fundamental melhorar a qualidade de vida das pessoas através da arte, da beneficência, da ciência e da educação. Desenvolve as suas atividades a partir da sua sede em Lisboa e das delegações em Paris e em Londres, tendo também intervenção através de apoios concedidos desde Portugal nos PALOP e Timor-Leste, bem como nos países com comunidades arménias.
A fundação conta com um museu, que alberga a coleção particular do fundador e uma coleção de arte moderna e contemporânea; uma orquestra e um coro; uma biblioteca de arte e arquivo; um instituto de investigação científica; e um jardim, que é um espaço central da cidade de Lisboa, onde decorrem também as atividades educativas. Em articulação com as atividades culturais, a fundação cumpre a sua missão através de programas inovadores que desenvolvem projetos-piloto e apoia, através de bolsas e subsídios, instituições e organizações sociais. Para o período 2018-2022, os três domínios prioritários - coesão e integração social, sustentabilidade e conhecimento - deverão ser refletidos em toda a estratégia de intervenção.