Gulbenkian evoca figura e obra de Clarice Lispector
Escritora genial que nunca abdicou de ser uma mulher bela. Intelectual que nunca separou o corpo da alma, a carne da escrita, eis Clarice Lispector, a ucraniana que soube como poucos amar e explorar a língua portuguesa. Tem, na Fundação Gulbenkian, em Lisboa, uma exposição criativa e instigante que a revela sem lhe retirar o mistério. Chama-se "Clarice Lispector: A Hora da Estrela" e abre ao público na quinta-feira.
Pensada pelo poeta brasileiro Ferreira Gullar e Julia Peregrino (a responsável pela exposição "Fernando Pessoa, Plural como o Universo", que a Gulbenkian acolheu no ano passado) e conceptualmente criada por Daniela Thomas e Felipe Tessara, esta mostra pretende refletir o universo peculiar da escritora que nasceu ucraniana mas que aos 21 anos escreveu ao presidente Getúlio Vargas uma carta a pedir a nacionalidade brasileira onde faz uma comovente declaração de amor à língua portuguesa.
Essa carta faz parte do conjunto de cem documentos que podem ser vistos nesta exposição. Organizada em torno de seis núcleos, A Hora da Estrela (que recupera o título do último romance da escritora) recria ambientes dos livros e passos da vida de Clarice, desde o seu nascimento em 1920 na Ucrânia até à sua morte em 1977, no Rio de Janeiro.
O crítico português João Gaspar Simões foi um dos primeiros portugueses a escrever sobre esta autora e sobre o romance Cidade Sitiada, de 1949: "É de um hermetismo que tem a consistência do hermetismo dos sonhos. Haja quem lhe encontre a chave." Mesmo sem conhecerem esta frase, os criadores da exposição tiveram uma intuição semelhante à de Gaspar Simões e construíram uma sala que reproduz o mesmo ambiente árido, claustrofóbico, monocromático mas sob o qual há segredos e mistérios à espera de uma revelação, gavetas à espera que alguém as abra.
Patente até 23 de junho, esta exposição integra a programação do ano do Brasil em Portugal e pode ser vista de terça a domingo.