Guerra de 'spreads' preocupa Banco de Portugal
É um déjà vu. Tal como antes da última crise financeira, os bancos estão a baixar as margens de lucro para ganhar mais clientes no crédito. O Banco de Portugal deixou ontem um alerta: a guerra de spreads pode levar ao agravamento do nível de incumprimento no futuro. O aviso surge numa altura em que o crédito malparado em Portugal, apesar da melhoria, está ainda acima da média da Europa. No final de 2018, o rácio de non-performing loans (NPL) situava-se em 9,4%.
"A tentativa de aumentar o volume de crédito através da fixação de spreads de taxa de juro que não cubram o risco de crédito de maneira sustentável poderá resultar, no futuro, num maior nível de incumprimento", avisou ontem o Banco de Portugal no Relatório de Estabilidade Financeira de junho.
Há bancos a oferecer já spreads mínimos de 1%. O BPI foi o último a baixar o spread, que agora se situa em 1,2%, abaixo dos 1,23% oferecidos pela Caixa Geral de Depósitos.
Esta guerra de spreads acontece numa altura em que "existem evidências, em termos agregados, de sobrevalorização no mercado imobiliário residencial desde a segunda metade de 2017". Neste cenário de sobrevalorização, "é importante que as instituições tenham particular cuidado na definição dos critérios de concessão de crédito", alertou o supervisor.
A exposição ao mercado imobiliário é uma das fragilidades que o Banco de Portugal identificou na banca portuguesa e que a torna vulnerável. "Uma eventual redução acentuada e brusca da procura de imóveis por não residentes constitui um risco para a estabilidade financeira", adiantou. "O mercado imobiliário português continua a estar particularmente dependente da intervenção de não residentes, seja por via do turismo seja por investimento direto." E avisou que "o abrandamento mais acentuado da atividade económica a nível global, decorrente em particular da materialização de eventos de tensão geopolítica, aumentos dos prémios de risco e eventuais alterações no quadro regulamentar nacional sobre o mercado imobiliário poderão vir a traduzir-se numa interrupção brusca do dinamismo do imobiliário e, consequentemente, num ajustamento em baixa dos preços".
Mas há outros fatores que tornam a banca portuguesa vulnerável. O sistema financeiro português tem também uma "elevada exposição" a títulos de dívida pública portuguesa. Incerteza política ou tensões comerciais entre países podem levar a um aumento da aversão ao risco e apanhar os bancos portugueses numa situação de maior vulnerabilidade, considera o Banco de Portugal.
No caso da exposição a dívida pública portuguesa, os bancos tinham uma exposição correspondente a 9% do ativo total. "Uma eventual subida de cem pontos-base das yields da dívida pública nacional teria impacto negativo de cerca de 51 pontos-base no rácio [de capital] CET1 dos bancos portugueses."
"É essencial prosseguir políticas que promovam a sustentabilidade das finanças públicas, a poupança dos particulares e das empresas, o crescimento potencial da economia portuguesa e a resiliência do sistema bancário", adiantou. Destacou que os bancos devem continuar a cumprir os "planos de redução de NPL submetidos às autoridades de supervisão" e devem adotar "políticas prudentes de aplicação dos resultados gerados, em particular na distribuição de dividendos".