Guardiões do mar. Mais de 36 mil embalagens de lixo retiradas do Sado

Campanha "Mariscar sem lixo", lançada em 2016 pela cooperativa de Ocean Alive, que visa proteger o ambiente marinho, ganhou um Green Project Award
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Foi em 1994, num estágio na Reserva do Estuário de Sado, a monitorizar a população de golfinhos residentes, que a bióloga Raquel Gaspar encontrou o fio à meada do que veio a ser a sua vida profissional. Ela, naturalmente, seguiu-o sem hesitar - até hoje. E vai continuar.

Fê-lo como bióloga e investigadora e, mais recentemente, enquanto fundadora e ativista da cooperativa de proteção do ambiente marinho Ocean Alive que, com as suas ações de sensibilização e campanhas para a limpeza do Sado, tem ganho prémios atrás de prémios. O Green Project Awards, atribuído na semana passada à sua campanha "Mariscar sem Lixo", é só o mais recente.

A poucas semanas de completar dois anos de existência, a Ocean Alive já se tornou imprescindível a um ambiente mais saudável e mais limpo naquele estuário. Os números alcançados falam disso, e os quatro prémios conquistados são a sua melhor prova.

Ao todo, desde março de 2016, quando começou a sua atividade, a Ocean Alive já mobilizou 2076 voluntários que, mês após mês, têm percorrido desde então as margens do rio, mais a montante ou mais perto da foz, a recolher lixo de toda a sorte e a sensibilizar os pescadores e a população para a necessidade de não deixar resíduos nos locais das suas atividades.

Nestes quase dois anos, a campanha "Mariscar sem lixo" já recolheu ali mais de 36,8 mil embalagens e sacos de plástico de sal e mais de 30 toneladas de lixo variado, incluindo garrafas, plásticos de todos os tamanhos e feitios, pneus ou restos de redes. E as ações de sensibilização junto das comunidades piscatórias e dos alunos das escolas da região também começam a dar bons frutos. "Os bons exemplos são transformadores", sustenta Raquel Gaspar. "Agora os pescadores e os mariscadores já não deixam lixo para trás, recolhem-no e levam-no com eles".

Quanto aos prémios, além do prestígio e do reconhecimento que significam, também têm sido fundamentais porque alimentam as ações e campanhas da Ocean Alive. Foi o caso do prémio Ideias de Origem Portuguesa, no valor de dez mil euros, recebido da Fundação Gulbenkian logo em 2016. Ou ainda o Terre des Femmes (35 mil euros) que distinguiu em 2017 uma das iniciativas da Ocean Alive, a das "Guardiãs do Mar", que faz das mulheres pescadoras da região aliadas seguras da proteção ambiental.

"Isso permitiu-nos ter 12 pescadoras no projeto, parte delas remuneradas, para fazerem atividades de sensibilização junto das suas próprias comunidades, bem como de guias em saídas de campo", conta a bióloga e fundadora da Ocean Alive.

O estágio já distante, nos anos de 1990, e o trabalho que se seguiu na reserva do Sado foram para ela tempos intensos. Mas, sobretudo, coincidiram com a maior quebra da população de golfinhos do estuário. "As crias, depois dos primeiros três anos junto das mães, desapareciam, ou então morriam e, portanto, a população estava envelhecer". Para Raquel Gaspar, impunha-se perceber os motivos daquele declínio, pelo que decidiu estudar a questão no doutoramento. As hipóteses que modelou, na busca de uma solução, acabaram por conduzi-la a uma resposta: era preciso preservar as chamadas pradarias marinhas, o habitat do estuário do Sado que é maternidade e berçário das espécies de que se alimentam os golfinhos locais.

"A criação do Parque Marinho da Arrábida [em 1998] foi muito importante para preservar esse habitat e a verdade é que a partir da década de 2000 a população dos golfinhos ganhou juvenis", lembra Raquel Gaspar. A par disso, no entanto, a bióloga considerou que era preciso envolver a população local e fazer outras ações concretas. "Tive a intuição de que as pescadoras eram importantes para esta sensibilização ambiental".

Não se enganou. As "Guardiãs do Mar têm sido determinantes no seu exemplo transformador", para que o lixo causado pelas atividades da pescar e de mariscar não fique por ali a contaminar as pradarias marinhas, e enfraquecê-las. E o facto é que "agora já são os próprios pescadores e mariscadores que removem esse lixo e o depositam em contentores apropriados", diz Raquel Gaspar.

Tudo motivos para continuar e o certo é que não faltam planos à Ocean Alive que, à semelhança de 2017, vai continuar a ter o patrocínio do Oceanário de Lisboa e da Fundação Oceano Azul para as suas atividades. O calendário de 2018 está recheado. Já a 18 de fevereiro, haverá uma grande ação de limpeza na Carrasqueira e no mês seguinte, uma ação de sensibilização para os pescadores. Além disso, haverá atividades de limpeza, todos os meses, até final do ano, em diferentes pontos do estuário. Os voluntários já sabem: são todos bem-vindos.

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