Grandes medidas na resposta à covid já estão a sair do papel, mas novos apoios sociais tardam
Menos de dois meses após a entrada em vigor do Programa de Estabilização Económica e Social (PEES) e do Orçamento Suplementar, as medidas de maior despesa na resposta à covid-19, para apoiar empresas e digitalizar as escolas, já estão a sair do papel. Já as medidas de combate à pobreza e de apoio a trabalhadores mais vulneráveis estão atrasadas.
O Programa de Estabilização, resposta intercalar à crise enquanto não chegam as verbas do Fundo de Recuperação da União Europeia, conta, grosso modo, 65 medidas com execução prevista até ao final do ano, e nalguns casos para lá de 2020. Destas, três destacam-se pelo volume da despesa associada: o apoio à retoma progressiva nas empresas, que sucede ao lay-off simplificado, os incentivos à retoma para as empresas que saem entretanto do lay-off, e a digitalização das escolas para fazer face às necessidades do ensino remoto. Todas juntas, poderão custar 1,7 mil milhões, segundo as estimativas do governo.
O apoio à retoma nas empresas mantém um mecanismo simplificado de redução dos horários dos trabalhadores, agora sem a possibilidade de suspensão de contrato e com uma menor comparticipação da Segurança Social perante quebras de faturação mínimas de 40%. Desde o dia 6 que é possível aceder à medida, e o apoio deverá começar a ser pago em agosto no que diz respeito à comparticipação por horas não trabalhadas. As empresas com maiores dificuldades (quebras de faturação de 75% ou mais) receberão um extra de apoio ao pagamento dos salários, mas só em setembro.
A segunda resposta mais cara no pacote das medidas de curto-prazo diz ainda respeito ao lay-off, e também já está no terreno, com candidaturas junto do IEFP. Trata-se do incentivo extraordinário para as empresas que saem do mecanismo, e que pode garantir até 1270 euros por trabalhador mantido nos quadros da empresa. O governo admite no PEES que o incentivo possa custar até 603 milhões de euros, com o desenho da medida a prever algumas reduções face aos valores máximos de um salário mínimo ou dois salários mínimos dos apoios previstos.
A terceira grande medida do programa, para dotar as escolas do país de mais computadores e software, também já conheceu alguma avanço, embora permanecendo por concretizar. No final de julho foi autorizada uma despesa de 157 milhões de euros neste ano, e de 229 milhões em 2021. A contratação das compras caberá à Secretaria-Geral da Educação e da Ciência, mas para que haja despesa são ainda necessárias candidaturas aprovadas a fundos europeus com financiamento a 100%. Vão ter prioridade os alunos com Ação Social Escolar.
Há, por outro lado, iniciativas mais demoradas ou mesmo atrasadas nas áreas de combate à pobreza e de apoio aos rendimentos dos trabalhadores mais vulneráveis. As regras do Rendimento Social de Inserção (RSI), para que nos critérios de acesso sejam tidos em conta os rendimentos atuais dos beneficiários e não anteriores, devido à pandemia, já foram alteradas em portaria para valerem desde início de julho. Mas as mudanças ainda não foram publicadas no site da Segurança Social.
Também os novos apoios mais generosos para trabalhadores informaisaprovados no Orçamento Suplementar, apesar de não integrarem o PEES, ainda não estão a chegar aos beneficiários. No início deste mês, a Segurança Social mantinha abertos pedidos ainda para valores mais baixos de apoio, de 219,41 euros, relativos ao mês de julho, destinados a trabalhadores independentes em situação de desproteção social. O valor aprovado no Orçamento era já de 438,81 euros, o dobro.
Além disso, está atrasado o alargamento de apoios a sócios-gerentes de microempresas aprovado pelo parlamento, que prevê o pagamento de até dois terços dos rendimentos habituais e elimina o critério de faturação máxima. Entretanto, a Segurança Social já disponibiliza desde quinta-feira a informação de que os trabalhadores da saúde com contrato individual de trabalho têm direito a baixa médica paga a 100% na doença covid-19, mas não há ainda alteração para a generalidade dos trabalhadores que também têm direito a baixa a 100%, com as alterações ao Orçamento.
O Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social é responsável ou corresponsável por mais de duas dezenas das medidas previstas no Programa de Estabilização, com os apoios extraordinários da resposta à covid-19 a inflarem a despesa desta área em 1,9 mil milhões de euros adicionais até ao final do ano.
Já do lado do Ministério da Economia, estão outras das medidas mais esperadas pelo tecido empresarial. Desde logo, a disponibilização de mais 6,8 mil milhões de euros em linhas de crédito com garantias de Estado. Destes, até aqui, há mil milhões de euros para micro e pequenas empresas, que desde a última semana podem já candidatar-se. Faltam os valores restantes, assim como a materialização de vários programas de incentivos, como a segunda edição do Adaptar, para financiar a adaptação de estabelecimentos devido à pandemia.
Parte das medidas deverão também ficar dependentes do início de atividade do novo Banco Português de Fomento que só deverá estar operacional em outubro. É o caso da criação de um novo fundo para a capitalização de empresas. Entretanto, avançaram as garantias de Estado para seguros de crédito à exportação para países da OCDE.
Noutras medidas já concretizadas, desde meados de julho que o Serviço Nacional de Saúde pode pagar mais aos profissionais para a recuperação, fora do horário normal de trabalho, de primeiras consultas e cirurgias que ficaram por fazer devido à chegada da pandemia.
Na Cultura, também, desde o início do mês que é possível aos trabalhadores e outros agentes culturais candidatarem-se a três novas linhas de apoio criadas no âmbito do Programa de Estabilização. Estas incluem um reforço de apoios, com o tecto de 1316 euros, para trabalhadores independentes da Cultura que em abril e maio tenham já recebido apoios extraordinários da Segurança Social por perda de atividade. Os valores são atribuídos por ordem de entrada das candidaturas até ao limite da dotação, 34,3 milhões de euros.
jornalista do Dinheiro Vivo