Vários autores ilustres proclamaram aos ventos o "fim da globalização". Mas o comércio internacional de bens e serviços, com transferência de tecnologia, capitais e capacidade industrial instalada continua, ancorado num forte enquadramento de suporte ao multilateralismo. E o círculo virtuoso de crescimento internacional interdependente continua a crescer..O que mudou parcialmente foi, por um lado, a relevância das geografias das trocas comerciais - com cada vez maior percentagem a decorrer na orla da Ásia-Pacífico e uma redução na área do Atlântico e também mais comércio Sul-Sul - e, por outro, o sentido dos fluxos. Nos últimos anos, os direitos de propriedade intelectual e outra tecnologia e know-how, os bens de capital e os movimentos de capitais para investimento têm sido mais bidirecionais entre países desenvolvidos e em vias de desenvolvimento..Por outro lado, a "vertente cultural" da globalização - nela se integrando o entretenimento e os media, da TV por cabo à produção de filmes e séries de TV - e o acesso aos media online e a informação gerada atomisticamente 24 horas por dia, sete dias por semana - contribuiu, por um lado, para a diversidade de informação e entretenimento acessíveis internacionalmente e, por outro, consagrou o inglês como a língua-veículo internacional. Esta "vertente cultural" da globalização criou para as populações urbanas no mundo padrões de exigência mínimos em termos de qualidade de vida e destarte aumentaram as expectativas e exigências dos povos e o escrutínio da governação..A pressão exercida sobre múltiplos governos e a procura inerente a esses novos padrões de exigência mínimos em termos de qualidade de vida conduziu a uma abertura de mercados e a um aumento local da produção de bens de consumo condizentes com tais necessidades - automóveis, motos, eletrodomésticos, produtos eletrónicos, etc..Do mesmo passo, a liberalização dos movimentos de capitais facilitou o financiamento desta nova produção massificada de bens e serviços em países em desenvolvimento..O mundo em que vivemos é ainda unipolar no plano do poderio militar, mas já é claramente multipolar em vários outros domínios. É sobretudo multipolar no plano económico porquanto os países desenvolvidos têm vindo a ver a sua relevância relativa internacional diminuir do mesmo passo que cresce a de uma série de países em desenvolvimento, seja com base em valores absolutos do PIB seja em termos de PIB per capita, sobretudo em paridade do poder de compra..É ainda multipolar porque, embora fosse claro há décadas, é claríssimo hoje que muitas das principais empresas multinacionais detêm um poder económico e uma influência social e política maior do que a maioria dos Estados..Vivemos claramente num período intercalar..Uma das respostas a esta dispersão de poder económico, político e social foi a criação ou a consolidação de blocos económicos regionais, como a UE, a NAFTA, o Mercosul, a CEDEAO e a ASEAN..Para países pequenos, como é o caso de Portugal, a relevância relativa e a margem de manobra internacional diminuem significativamente fora do bloco regional respetivo. Ser membro empenhado da UE hoje não é apenas uma opção por um modelo civilizacional, mas também uma condição de sobrevivência num mundo multipolar complexo..Consultor financeiro e business developer. www.linkedin.com/in/jorgecostaoliveira