Fungagá da bicharada: a natureza do animal político
Aristóteles definiu o homem como um animal político. Esta frase tem sido reproduzida vezes sem conta nos mais diversos contextos, até com intenções sarcásticas, mas nunca se banalizou ao ponto de se esvaziar.
O grande filósofo grego tinha razão. O homem é mesmo um animal político. Houve até um conhecido político português que há uns anos aprofundou esta característica ao definir-se como "animal feroz". Daqueles que chegam a provocar medo aos mais incautos.
Para ultrapassar obstáculos, o animal político deve ser sagaz como a raposa, astuto como o lince, ágil como a lebre, infatigável como o castor, sábio como o mocho.
Convém possuir boa memória, como o elefante. Ter visão muito superior à média, como o falcão. E paciência de tartaruga, pois devagar se vai ao longe.
Exemplo a seguir é o das abelhas. Sabem agregar-se, cooperar, ter espírito de equipa. E produzem bens úteis, como o mel e a cera. Os seres humanos deviam aprender com elas. Também simbolizam lealdade, sem ser canina.
Depois há os aprendizes de políticos. Aqueles que só repetem o que os outros dizem, imitando papagaios. Que se acham a tecer a sua teia, imitando a aranha. Alguns por vezes picam, como as vespas. Outros só incomodam, como as melgas.
Neste quase meio século de regime democrático em Portugal tem havido de tudo.
Nunca falta o peixe de águas profundas, que raras vezes se exibe e prefere circular na penumbra, onde supõe ser mais influente. Com a diferença de circular pelos corredores do poder em vez de navegar no oceano.
E até o gato e as suas sete vidas, demonstrando que na política são mais as reaparições do que as mortes.
A espécie mais abundante talvez seja o camaleão. Muda de pele e pinta-se de várias cores, tantas vezes quantas lhe for conveniente. Assim se vai perpetuando no espaço público.
Há que tomar precauções contra a víbora, sempre pronta a destilar veneno no seu rastejar constante. E contra a picada do escorpião, que leva a ingratidão ao ponto de liquidar o próprio sapo que o transporta para atravessar o rio. É a sua natureza, segundo o próprio...
Na política, também há bichos-do-mato. São os que fogem dos holofotes por excesso de timidez. Os desconfiados, sempre com a pulga atrás da orelha. E convém não esquecer os ratos, que estão na primeira linha quando chega a hora de abandonar um navio em águas mais agitadas.
Quando a política pede emprestadas metáforas à zoologia, encontra-se de tudo um pouco. Desde quem seja especialista em tirar coelhos da cartola a quem passa o tempo a chorar lágrimas de crocodilo. Outros andam armados em carapaus de corrida e cantam de galo quando ainda mal deixaram de ser pintos. E por falar em pintos, o Calimero dos desenhos animados podia estar na política. Daqueles que fazem da lamúria a sua principal forma de expressão.
Convém não esquecer os abutres, que se alimentam dos despojos alheios. Podemos não os ver, mas sabemos que eles andam sempre a rondar por aí. Geralmente quando o dia dá lugar à noite.
Profusos são os polvos. Alguns com tentáculos intermináveis. Chegam aos locais mais inesperados, imunes à mudança das marés. Alapam-se às rochas e lá fisgam as suas presas. Move-os a gula insaciável e revelam forte instinto de sobrevivência. Terão tudo a perder se vierem à superfície, daí rejeitarem cargos públicos. Desse modo evitam terminar grelhados.
Espécie jamais em extinção é a dos amigos da onça. Quem tem "amigos" destes, na política e não só, nunca precisa de inimigos. George Orwell conhecia-os bem e retratou-os no genial romance O Triunfo dos Porcos, livro que pôs literalmente fim à bicharada.
Líder parlamentar da Iniciativa Liberal
Escreve de acordo com a antiga ortografia