Francisco Rodrigues: "O surf passa uma mensagem para todo o desporto"

A Associação Nacional de Surfistas organiza no fim de semana a primeira prova da Liga MEO Surf 2021. Será na praia de Ribeira d"Ilha (Ericeira) e o presidente da ANS antecipa o que pode ser a época da modalidade que, afirma, é um exemplo no desporto.
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Qual foi o impacte da pandemia de covid-19 no surf?
2020 foi difícil para toda a gente, reformulou todo o nosso mundo. Mas no caso da Liga MEO Surf não se pode dizer que tenha sido um ano mau, muito longe disso. Primeiro, porque fizemos o primeiro campeonato de surf após o confinamento. Foi uma mensagem forte não só do desporto em si, por ser ao ar livre e de baixo risco, mas também pela Liga pois conseguimos posicionar um projeto nacional como o primeiro campeonato do mundo pós-covid. A Federação, a Associação Nacional de Surfistas, os patrocinadores e o município da Figueira da Foz estiveram todos alinhados para fazer a prova e isso mostra a responsabilidade de todos. Fizemos a reposição da vida ativa dos atletas, dos profissionais que vivem do surf, mas também pelas pessoas que têm sofrido por não haver surf. Fomos agente positivos na retoma. Foi possível chegar ao final de outubro com as etapas todas e sempre com segurança, sem qualquer incidência. Revela que o surf é seguro e que o projeto está sólido. Os campeões foram o Frederico Morais e a Teresa Bonvalot. O Frederico em 2020 só teve o título oficial da Liga. 2020 foi exigente, mas quando chegámos ao fim percebemos que o resultado foi positivo para surfistas e patrocinadores.

E tiveram feedback do exterior?
Fomos notícia em toda a Europa, na América do Sul. A World Surf League sublinhou que Portugal teve competições de surf , houve um artigo de opinião numa revista australiana a falar da nossa competição. Num projeto local mostrámos ser cartão de visita.

Ansiavam pela autorização para iniciar as competições...
A Liga é a primeira divisão do surf. Sempre houve condições. A partir do momento que havia um plano de desconfinamento, que libertava as modalidades de baixo risco a partir de 5 de abril [ontem], o trabalho foi conversar com os municípios e projetar etapas. Houve coordenação com Mafra: foram feitos trabalhos condicionados à espera da autorização do primeiro-ministro. A partir do momento em que se confirma [o início da segunda fase do desconfinamento], não só temos o enquadramento como finalizamos os trabalhos. O surf vai passar de uma forma muito sólida neste processo de retoma. É uma mensagem para o desporto.

Qual é a importância da Liga MEO Surf?
Uma das situações que o selecionador frisou foi a necessidade de dar rodagem aos surfistas portugueses antes da próxima e última qualificação para os Jogos [Olímpicos em Tóquio] no final de maio. Vamos fazer três etapas até lá, estão duas anunciadas: 9 a 11 de abril com Mafra (a prova será na praia de Ribeira d"Ilhas, na Ericeira); 23 a 25 para a Figueira da Foz. Estamos a fechar o licenciamento da terceira para cumprirmos os planos de contingência e ter autoridades da capitania e dos municípios. Queremos que seja uma plataforma para poder ajudar os surfistas e, quem sabe, conseguirmos mais uma vaga no torneio de El Salvador. A estrutura da Liga é sempre a mesma. Está coordenado com a agenda dos surfistas que têm muitos campeonatos lá fora. A Liga é importante para a carreira de um surfista, mas não é o objetivo final. Temos de ambicionar objetivos internacionais, devemos moldar-nos para complementar e sendo acelerador do crescimento, mas sempre respeitando as prioridades fora de portas.

Quais vão ser as etapas?
Além das duas já referidas podemos dizer que haverá uma no Porto, em princípio no mês de maio. Outra será em Sintra e a última acontecerá em Cascais, terminando numa lógica de premiar o município, a história e o património de um sítio que tem dado a maioria dos resultados no surf.

O que pediam os surfistas?
Diziam deixem-nos fazer surf. É um desporto de lazer e é muito importante. Há surfistas em todas as classes: havendo a lógica de baixo risco o que foi sendo conversado é que se tem de balancear a liberdade. O sistema imunitário sai beneficiado pelo contacto com o mar e a saúde mental também. Foi possível ir encontrando convergências. As situações nos vários municípios não são iguais. As restrições de usufruto da praia não são adequáveis ao surf: o surfista não fica na praia, segue para o mar, não se arrisca nem coloca ninguém em risco. Felizmente está tudo regularizado e é bom para o desporto.

Foi mais fácil preparar esta edição da Liga MEO tendo em conta a experiência do ano passado, quando retomaram no fim do primeiro confinamento e foram a primeira liga do mundo a fazê-lo?
Todos os anos são desafiantes. Mas por exemplo há sempre a necessidade de compatibilizar agendas e neste ano a coisa foi mais fácil nesse sentido. O investimento, o fazer, é uma questão diária, há mudanças quase semanais nas políticas das empresas, não estamos alheios a isso. O financiamento é bastante mais baixo do que em outros anos, mas há vontade de fazer e isso mostra a maturidade do projeto. O licenciamento em 2021 nada tem que ver com 2019. Estamos preparados para receber os melhores atletas nacionais.

Kikas será um deles?
Kikas não pode estar. Estando ele na elite não podia competir aqui, mas pedimos uma dispensa à World Surf League enquanto as competições principais estavam paradas. O Frederico tem de estar a competir ao mais alto nível e ainda bem que não vem. A Liga tem de ser um confronto de gerações: tivemos um confronto excelente com Frederico que ganhou a primeira etapa, Vasco Ribeiro ganhou duas, depois surge o Afonso Antunes que ganhou na Ericeira e juntou-se na luta pelo título máximo do surf português. Teresa é campeã nacional, está com dinâmica acelerada a Yolanda Hopkins vem em força para se meter no meio. O crescimento do Kikas, o facto de ele não estar, é sinal de que está a fazer muito e melhor fora de portas.

Como estão os surfistas nacionais?
Matias Canhoto é muito novo, vamos ver nesta época 2021 a sua progressão. A Liga está a ter um efeito positivo. Nas senhoras há muita quantidade: Bonvalot, Hopkins, Carolina Mendes, Camila Kamp, Francisca Vezelko, Mafalda Lopes Gabriela Dinis. Para elas ganhar uma etapa é um motivo de orgulho. Não procuramos só a campeã nacional. Há uma distância de dez anos do Vasco e do Afonso e estamos no bom caminho. Sem dúvida que acreditamos que se as mulheres andarem lado a lado vamos ter uma mulher na elite.

Há alguma etapa internacional em Portugal?
Não tenho informação sobre isso. Esteve planeada uma etapa do World Championship Tour em Peniche. Depois, o plano inicial era que a nossa etapa fosse para meio de março. Confirmadas em Portugal só a Liga, mas é possível que na viragem do verão, em setembro, que se disputem algumas. Não há mais provas previstas mas quero acreditar que as provas de qualificação vão encontrar o seu espaço.

Há articulação internacional?
Trabalhamos muito próximo da World Surf League. O diretor para Europa, Middle East é português. Se recuarmos a 2009 tivemos todo o tipo de mundiais. A capacidade de produzir mundiais no surf é reconhecida no mundo inteiro. Somos um país pequeno, com recursos próprios, mas estamos bem servidos e a agenda vai voltar.

E consegue-se investimento?
Temos encontrado financiamento para se fazer as competições, não somos como o futebol em termos de penetração. O surf vem do setor privado, a associação vem daí. É mais difícil, mas traz exigência porque temos de dar retribuição aos patrocinadores. Temos caminhado no aumento da divulgação e para nos tornarmos no segundo desporto do país.

E o público?
Vamos fazer uma competição na praia e não há uma única utilização coletiva. Vamos ter a comitiva mínima e indispensável. A praia está aberta ao público. Pedimos às pessoas que se afastem, mas o evento é fechado e tem transmissão integral. As pessoas que estão na praia não estão pelo campeonato. A atividade está no mar. Não há concentração de pessoas. Durante as entregas de prémios fazemos vedação alargada e não permitimos que as pessoas se aproximem.

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