Ainda era fevereiro, poucos dias antes de o novo vírus chegar à Europa e se tornar pandemia. À hora marcada, entrava no antigo palacete da Lapa, na Rua Pau da Bandeira, que acolhe o Provedor de Justiça, um orgão do Estado, mas independente. A reportagem estava há muito pedida e o dia tinha chegado. Queríamos conhecer a jurista, a mulher, cidadã, que aceitou o cargo, mesmo tendo apenas designação no masculino: Provedor de Justiça. Queríamos saber o que se faz na "casa que universalmente é do cidadão", e que lhe tenta fazer justiça, pelo poder da palavra e da razão. Foram horas de conversa com Maria Lúcia Amaral e com a sua equipa. A manhã passou e o almoço também. À tarde, quando saímos, percebemos que aquela casa é afinal o espelho do que "somos enquanto país, sociedade e Estado". A reportagem esteve parada. O vírus impôs outra atualidade, mas na edição dos 46 anos da Revolução de Abril, voltar a esta casa, é uma realidade atual..À minha frente está uma mulher pequenina, de sorriso aberto e olhos brilhantes, uma mulher que acredita na liberdade como "o valor primordial do ser humano", que defende cada cidadão como seu semelhante, que olha para o Estado como "uma construção histórica formidável" e garantindo que "Estado não é só poder, somos todos nós"..À minha frente, numa das salas do antigo palacete à Lapa, na Rua Pau da Bandeira, há muito transformada em gabinete do Provedor de Justiça, está a jurista Maria Lúcia Amaral, antes professora de Direito, na Universidade Nova de Lisboa e vice-presidente do Tribunal Constitucional (TC), que só conhecia pelos seus escritos, pelas posições assumidas e até pelo que dela se tinha contado quando foi eleita para o cargo, em outubro de 2017..As imagens gravadas na minha memória realçavam as frases lidas várias vezes: "juíza radical", "desalinhada" nas posições, "juíza passou cartão vermelho aos colegas do TC", no chumbo às medidas de austeridade de Passos Coelho, "está sempre sentada na primeira fila", mas "nunca falou aos media", "quando fala parece uma flecha"..Mas à minha frente está uma mulher jurista de sorriso aberto, olhar vivo, que fala com paixão do que faz, de como se sente angustiada quando não consegue resolver os problemas dos cidadãos, que acredita nas instituições sólidas, resilientes, e que, apesar de não ter poderes coercivos, apenas com o poder da palavra e da razão, sente que está a ser ouvida pelos poderes públicos e pela sociedade. Senão, questiona: "Como se explica o aumento, cada vez maior, do número de queixas de cidadãos que chegam à provedoria? Por dia, 70 processos, nem todos são admitidos como queixas, mas, em 2019, só queixas foram mais de dez mil.".Uma jurista, mulher, cidadã, um semelhante, que nos recebe de sorriso nos lábios, mão estendida, e com uma mensagem que vem da função que exerce: "Agradeço muito que cá estejam, porque nós, portugueses, temos muito pouco a noção do que são as nossas instituições, e eu estou muito empenhada em dá-las a conhecer, desde logo aquela por que sou responsável.".A conversa começa pelo espaço, pelo edifício onde se encontra, a história que carrega desde o início do século XX, "sabem que foi a casa do embaixador do III Reich durante a II Guerra Mundial?". Depois, passa-se a outra fase, à pessoal..A exposição incomoda-a, mas aceita.A luz natural do dia impõe-se na sala. É tempo de fotografias mais formais, nota-se algum desconforto, "não gosta?", perguntamos. "Não é fácil, mas faz parte da função. É uma exposição, mas vivo com isso, não se limite", avisa a rir-se. É adepta da discrição, prefere andar na rua e só ser reconhecida pelos amigos, de ir nadar ou fazer ginástica, o que ainda faz, mais do que uma vez por semana, e sentir-se em perfeita liberdade, de ir a concertos nos jardins da Gulbenkian, que, confessa, "adoro", e poder apreciá-los sem incómodo..À medida que as palavras e as histórias lhe surgem, a imagem da juíza radical que raramente fala desaparece. À minha frente, afinal, está uma mulher de 64 anos, que assume não ter outro remédio senão dizer o ano em que nasceu, porque "está na net", e que fala sem pressão da infância feliz em África, na difícil adaptação a um Portugal de 1967, dos tempos de faculdade, do professor Marcelo Rebelo de Sousa e da vida de professora..Mas antes de tudo isto, prefere falar da função que aceitou, e para a qual foi indicada pelo PSD e eleita pelo Parlamento com 143 votos a favor, 61 brancos e sete nulos, entre 211 votantes. Até pode ser uma juíza radical, mas à minha frente está acima de tudo uma pessoa defensora da razão, porque esta "é a exigência para chegar aos argumentos dos outros"..Foi esta mulher jurista que tomou posse no dia 2 de novembro de 2017 e que, em discurso, assumiu o compromisso de "independência perante o poder", "vigilância constante" e "obediência firme aos direitos fundamentais das pessoas", não fosse a casa que agora ocupa "uma casa que é universalmente do cidadão" e em que os direitos são defendidos pelo poder da palavra e da razão..Uma casa que tem crescido, em anexos, a bem dizer, com obras que tentam ao máximo o reaproveitamento de todo o espaço do antigo palacete à Lapa, em Lisboa, mesmo ao lado da embaixada chinesa, para poder albergar seis unidades temáticas e pouco mais de cem pessoas, entre juristas, economistas, administrativos, que ali trabalham e têm como missão a resolução de conflitos entre o cidadão e os poderes públicos - que tanto podem ir da progressão na carreira de professor ao direito à gratuitidade de manuais escolares para todos, da habitação ao ambiente, da violência à proteção de dados..Mas na casa do Provedor de Justiça também há atendimento presencial e três linhas telefónicas de apoio a idosos, crianças e pessoas com deficiência, que funcionam diariamente. "Não nos podemos esquecer dos mais vulneráveis. São uma preocupação", diz..Mesmo em tempo de estado de emergência, como vivemos agora, não há serviço que pare na casa do Provedor, pois é dos órgãos de Estado que por lei têm de continuar a funcionar em pleno, à exceção do atendimento presencial..À mesma hora, todos os dias, Maria Lúcia Amaral está no seu gabinete, o resto da equipa maioritariamente em teletrabalho, mas sempre atenta para que liberdades e direitos sejam acautelados. Foi dali que saíram há poucos dias recomendações para o Ministério da Justiça, para se prevenir o contágio nas prisões, para a Direção-Geral da Saúde, para que não se violem direitos com quarentenas regionais, e para o Ministério do Trabalho, para todos proteger nas alterações às leis laborais..Infância espantosamente feliz.A manhã vai a meio, olha para o relógio, às 12.00 tem uma audiência, "não podemos descurar o tempo, ninguém chega atrasado". Nós precisávamos de mais tempo para falar dela, é quando surge a proposta. "Bem, se não conseguirmos acabar isto até à audiência, proponho que se continue durante o almoço, uma coisa simples, para falar de tudo o que pretende, e depois vou à minha vida, porque também tenho muito que fazer", dispara pragmática..Regressamos às memórias de Angola, Nova Lisboa, Huambo, a terra onde nasceu, que lhe deu "uma infância espantosamente feliz" e de onde saiu, em 1967, quando o pai, médico, teve de regressar definitivamente a Portugal. Ela era a mais nova de sete irmãos, estava a iniciar o liceu, e foi-lhe "dificílimo" adaptar-se.."Nem calcula como detestei. Em Angola era autónoma, podia andar à vontade por todo o lado, de bicicleta, de patins, tinha uma vida livre e feliz. Aqui, fiquei a viver num apartamento na Rua das Picoas, no Saldanha, não havia espaço para nada, nem andar de bicicleta podia.".As imagens e o sentir daquela época surgem-lhe, e sem sinais de incómodo. Lembra-se do frio que sentia, das ruas estreitas, das portas pequenas e da calçada que não a deixava andar de patins ou de bicicleta. Agarrou-se à infância, porque "uma infância assim dá alimento para toda a vida, não acha?", ri-se, "agora já sou eu que estou a fazer perguntas"..Aos 10 anos soube que queria Direito.O pai era médico, os irmãos seguiram-no, "a medicina era uma profissão de família", mas lembra-se de quando se decidiu pela justiça e pelo Direito. "Tinha 10 anos, acabara de chegar de Angola, e tive de ir com o meu pai ao Arquivo de Identificação para praticar um ato existencialmente muito importante: tirar o Bilhete de Identidade", conta. "Lembro-me de que estava uma daquelas manhãs tristes de janeiro, cinzenta, chuvosa, insuportável, para quem vinha de África. Estamos no Portugal de 1967, um país já irreconhecível aos nossos olhos, felizmente. Quando nos aproximamos vejo que a rua estava cheia de bancas e de pessoas. De um lado, as bancas onde estavam pessoas sentadas a escrever, do outro, pessoas em pé, ar aflito, expectante, carente, que olhavam para quem escrevia. Perguntei ao meu pai o que se passava, e ele disse-me: "Há quem não saiba ler nem escrever e tem de pagar para que lhe preencham os papéis do BI."".Ainda menina, apenas com 10 anos, diz que se sentiu "indignada com o sofrimento que parecia atingir a dignidade daquelas pessoas. Naquele momento, decidi que queria ir para a área da justiça, do Direito, e nunca mais mudei de opinião". Fez os seis anos do liceu, deu-se o 25 de Abril, e entrou na faculdade. No primeiro ano, tem um único momento de dúvida. "Se calhar, enganei-me, isto não é para mim", pensou..No segundo ano, teve "um professor fantástico, chamado Marcelo Rebelo de Sousa, e por causa dele permaneci em Direito". "Esse professor ficou seu amigo?", interrompemos. Ri-se. "Pergunte-lhe. Não sei se é meu amigo ou não, sei que é alguém que na minha história pessoal, como na de muitos outros, teve este papel fundamental.".As convicções e os extremismos.Viveu o PREC - Processo Revolucionário em Curso na Faculdade de Direito de Lisboa, momento em que forjou "convicções fundamentais sobre o futuro de Portugal", sobre os valores e sobre a vida. "O debate era tão vivo, as fraturas tão profundas, e vivemos novamente num tempo de fraturas, que percebi quem era. Naquela altura, aos 18 anos, as pessoas não tinham outro remédio senão perceber de que lado estavam e em que valores acreditavam.".As convicções trouxeram-lhe a perceção clara sobre o que acreditava em matéria de vida coletiva. E acreditava na "ausência de fundamentalismos", assumindo que "nunca, mas nunca, iria por convicções extremas. Nunca iria acreditar nas visões do mundo que implicassem saber de antemão, quem sabe e quem não sabe". Talvez por isto tenha escolhido no Direito a sua vertente Pública e Constitucional..Formou-se e seguiu aquela que é a sua vocação, ensinar. Hoje, diz, "tenho muita saudades da vida de professor, essa é uma verdadeira vocação". Foi o professor que tanto a marcou que, um dia, também lhe disse. "Não há nada melhor e mais bonito, um professor nunca envelhece." Na altura, tinha 20 poucos anos, longe de pensar envelhecer, mas o desabafo ficou. E confessa: "O ser professor é, de facto, algo que se é, ao passo que no Tribunal Constitucional ou na provedoria de Justiça é algo em que se está, que se exerce", mas de que "também gosto. Gosto de servir as instituições, de cuidar delas, de lhes estar atenta porque nelas acredito profundamente"..Instituições sólidas e resilientes.Em adulta fortaleceu as convicções de adolescente e que a fizeram olhar para os regimes democráticos, "assentes na razão do não fundamentalismo, do ouvir a outra pessoa". Por isso, defende, e com veemência, que "para estes regimes sobreviverem é necessário que tenham instituições sólidas. Sem estas não há democracias resilientes, resistentes, aos ventos de mudança"..Sobre as instituições que serviu e que serve, diz que devem desenvolver todo um trabalho que faça sentir ao cidadão a razão da sua existência. "As instituições que servi e sirvo, o TC e o Provedor de Justiça, têm em comum o facto de serem instituições democráticas essenciais." Ou seja, "o serem instituições ao serviço daquilo que nos une a todos. E eu gosto, profundamente, de servir este tipo de instituições. É algo que completa a minha vocação de professora"..Quando citamos o discurso de tomada de posse - em que diz ao cidadão que a "provedoria não legisla, não julga e não executa" - interrogamos: "O que faz então?", ri-se. "Aparentemente nada." Mas não. Explica que quando o disse referia-se às três funções essenciais do Estado, fazer leis, ao Parlamento, que executa, através do Governo, e aos serviços da administração central, porque "o Provedor de Justiça é um órgão singular que não legisla, que não tem competências administrativas, que não pratica atos administrativos e que não julga. Isto significa que todos os atos que pratica não têm a eficácia e o grau vinculativo de nenhum dos atos tradicionais dos três poderes do Estado". E sublinha: "Não é adversário dos poderes públicos." Pelo contrário, "existe para ser um elemento auxiliar de uma boa administração do Estado, de uma boa governação, para ser um elo de intermediação entre o cidadão e os poderes públicos"..Este é o sentido do Provedor de Justiça, órgão criado em 1975, logo após a Revolução de Abril, inspirado na figura sueca de Ombusdman, um defensor do povo. "É um órgão de acesso universal e gratuito ao cidadão. Qualquer pessoa pode dirigir-se-lhe para pedir ou reclamar o que quer que seja, porque o Provedor, mesmo com ausência de poderes coercivos, procura resolver os conflitos, para além da política e aquém do poder judicial. O Provedor propõe resoluções, de acordo com critérios de justiça e do direito vigente, mas também de equidade.".Mais queixas, dez mil em 2019.Ao fim de três anos, Maria Lúcia Amaral percebe que "nem todas as autoridades públicas respondem imediatamente, que nem todas se mostram colaborantes", mas que quando intervém, e, reconhece, "não posso intervir em todas as queixas instruídas, é humanamente impossível, só o faço em situações mais difíceis", sente que é ouvida e que "os poderes públicos têm consciência da função comunitária que esta instituição serve e exerce, tratando-a respeitosamente"..Em balanço, afirma, "nunca tivemos um número tão elevado de queixas como o que temos agora", dez mil em 2019, o que para ela tem duas explicações. "Uma benigna, que me agrada pessoalmente, os cidadãos estão mais conscientes dos seus direitos, das injustiças de que são alvo e estão menos passivos, o que é um excelente facto a registar. E outra menos benigna, que tem que ver com a fase histórica porque passa hoje a administração pública portuguesa, e que é de transição geracional, e com as restrições orçamentais que têm existido". Não é fácil, mas quando os portugueses se queixam, "a maior parte das vezes têm razão"..Da audiência para o almoço.Olha para o relógio, faltam poucos minutos para a audiência. Pede que chamem a provedora adjunta e a chefe de gabinete para seguirem. Para nós, é altura de conhecer a casa. No piso térreo funciona o atendimento presencial ao cidadão, naquela manhã, apenas um visitante, um imigrante do Senegal, com quem se fala em francês, mas que responde em português. "Estou cá há cinco anos", diz. Não é a primeira vez que se dirige aos serviços do Provedor de Justiça, ali sente que é ouvido e que o ajudam no processo de legalização..Ao lado, atende-se o telefone das linhas de apoio a idosos, crianças e pessoa com deficiência. Um serviço que tem vindo a crescer e que, por vezes, é procurado tão-só pela solidão ou pelo desespero da ausência de respostas. Regressa-se ao primeiro piso, a mesa está posta na sala de audiências. Nas paredes, os retratos dos nove homens que a antecederam. Ela será a primeira mulher. É aqui que defende ser a favor de um só mandato para Provedor, seis anos, "não há justificação para que o mandato coincida com a legislatura". Maria Lúcia Amaral termina a função em 2021, mas se é ou não reconduzida, "não faz parte das minhas preocupações"..Preocupa-a mais a funcionalidade da casa. "Está numa zona da cidade muito pouco acessível, deveria estar junto a uma boca do metro, e, depois, porque tem dificuldades óbvias, na sua arquitetura, para que as pessoas não trabalhem todas separadas umas das outra. Apesar de ser uma casa bonita, gostaria que se pudesse proporcionar outra funcionalidade"..Sopa, filetes e gelatina.O menu é simples, mas completo. Sopa de legumes, filetes de peixe com arroz ou massa, gelatina e café. Para a provedora, a hora de almoço é sagrada, "um direito fundamental", diz a rir-se, mas também um momento em que recupera energia para continuar o dia. À mesa, aceita continuar a conversar. "O que mais a preocupa quando olha para a sociedade portuguesa?", atiramos assim que inicia a sopa.."São as situações de pobreza, as condições gerais de vida das pessoas. O facto de ainda não conseguirmos ser uma sociedade mais próspera, embora com todas as condições para o sermos, faz que as expectativas de vida das pessoas sejam muito baixas, que se ambicione pouco, porque, ancestralmente, também fomos habituados a querer pouco. Era bom que conseguíssemos mudar isto.". Na casa que ocupa agora diz que aprende todos os dias, mas que também, muitas vezes, dali sai angustiada. "A provedoria de Justiça é um observatório privilegiado do que é o Estado e a sociedade em Portugal. Quem está bem não se queixa ao Provedor. O que vemos aqui é o que está mal e há dias em que não posso deixar de sair muito angustiada, sobretudo porque a minha capacidade, ou a nossa capacidade, das cento e poucas pessoas que aqui trabalham, para resolver todos os problemas também é limitada. E isto é angustiante.".Lealdade e convicção no que faz.À equipa exige lealdade e convicção no que se faz. "Para trabalhar comigo é preciso acreditar no que se faz e na sua utilidade", e não tolera "pessoas subservientes, que me dizem sempre que sim. Gosto de pessoas leais, mas que sejam capazes de me dizer "isto não está bem, vamos por outro lado""..Continuamos, Maria Lúcia Amaral fala de história, de literatura, cita de cor os Os Lusíadas. É verdadeiramente professora, ensina, sempre, mesmo quando fala de si e das coisas que a apaixonam. "No outro dia vi um concerto em direto do Metropolitan, árias de Gershwin, viram?" Perguntava-me como era possível ter tempo para tanto, quando continua: "Adoro nadar, é uma coisa fantástica, durante meio hora ninguém me chateia", de fazer exercício físico, "descansa-me muito", depois "sou uma cinéfila militante" e uma "adicta a séries na Netflix". Olhando para mim percebe, "olhe que consigo integrar tudo isto na minha vida, e não durmo pouco". Fez doutoramento na Alemanha, onde aprendeu que a jornada de trabalho "tem de ser intensa, mas acabar cedo, senão é pouco saudável"..O futuro até 2021.A sobremesa chega, para alguns só café. "Eu quero gelatina", diz a rir-se. Restam-nos minutos para falar sobre quem ali vai e do futuro, duas situações em que gostaria de atuar no tempo que lhe resta de mandato. "Gostaria de ocupar este tempo para refletir sobre a reforma da instituição", que não é repensada desde 1993 e que funciona com uma estrutura idêntica à de um ministério. "A sociedade mudou, gostaria de deixar uma proposta de reforma.".Gostaria de ir mais além, de alargar o perfil-tipo de quem procura aquela casa. Agora, o perfil é de alguém "urbano, medianamente instruído, que usa as novas tecnologias e que tem emprego no Estado". Por isso, "quando falo na organização da instituição, também tem que ver com isto, com a mudança no perfil do queixoso típico da provedoria, gostaria que este pudesse surgir de fora do núcleo descrito"..É certo que ali também vão pessoas vulneráveis, a maioria estrangeira em território português e em situação difícil. É isto que quer mudar, "gostaria de deixar uma instituição preparada, adaptada e organizada para responder a outro tipo de pessoas e para chegar a outro tipo de questões, como energia, ambiente, reflorestação ou proteção da privacidade em relação à digitalização"..A preocupação "é poder chegar às pessoas isoladas", nem que para isso, ela própria, "tivesse de sair de Lisboa durante o mandato que me resta para ir ter com essas pessoas, com esses centros, para perceber como é que esta instituição lhes pode ser útil". É aqui que entra o futuro, é por aqui que quer continuar caminho. Depois desta nossa conversa, deparou-se com o inesperado, o vírus que abalou o mundo. Mas a jurista mulher à minha frente não desiste.