"Foi à experiência, mas passados 15 dias de chegar ao Seixal apresentaram-lhe contrato"
Henrique era um "miúdo tranquilinho e calado, que ganhava voz no seu grupo de amigos" e que tinha o sonho de ser jogador de futebol. O Andorinha, o Marítimo e agora o Benfica ajudaram-no nesse caminho, mas o talento também contribuiu. O jovem avançado de 20 anos das águias esteve em destaque ao marcar três golos na final da Youth League (a Liga dos Campeões de sub-19), que o Benfica venceu (6-0, ao RB Salzurgo, na segunda-feira). É o maior troféu da pérola madeirense da formação do Seixal, que tem contrato com o Benfica até 2024, é representado por Jorge Mendes e já se estreou a marcar pela equipa principal.
Ter começado no mesmo clube que viu nascer Cristiano Ronaldo - Andorinha - vai marcar para sempre a carreira do jovem avançado, que tem no capitão da seleção um ídolos (o outro é Robert Lewandowski) e um exemplo a seguir. "As pessoas falam disso, mas não haverá outro Cristiano Ronaldo em 50 anos. O próprio Henrique diz isso. O Andorinha potenciou o facto de o Ronaldo ter começado lá e criou uma creche de futebol no início dos anos 2000 onde o Henrique começou a jogar. Esteve lá quatro anos. É a origem dele, é um facto inegável, mas nada mais que isso", disse ao DN Gonçalo Araújo, pai do jogador do Benfica.
Jogava no Marítimo quando um dos olheiros das águias na Madeira chamou a atenção para o avançado veloz e com "facilidade" em fazer golos e "frieza" na hora da decisão, que precisava de um teste mais "exigente" para ser avaliado ao pormenor. Viam nele potencial para "chegar à equipa principal". Por isso, em 2017 aproveitou as férias escolares da Páscoa para vir ao Seixal fazer testes sob orientação de Luís Araújo.
Mostrou que tinha qualidade para jogar no Benfica e voltou à Madeira para retomar os estudos já com o convite para fazer parte da equipa juvenil do Benfica em 2017-18. "Ele tinha o sonho de ser jogador de futebol e foi à procura desse sonho em Lisboa e no Benfica. Percebeu que na Madeira estava limitado. Aos 16 anos tomou essa decisão e nós apoiamos. Já tinha feito um torneio pelo FC Porto, mas a situação não evoluiu e o pior que podia acontecer era ficar a pensar "e se tivesse tentado?". Ele tentou. Agora está a caminho de alguma coisa", acrescentou o pai.
O antigo nadador federado e hoje diretor regional de Planeamento, Recursos e Infraestruturas da Maderira, revelando que sempre lhe exigiram uma via alternativa ao futebol, que é como quem diz, que continuasse a estudar. Hoje tem matrícula suspensa no ISEG, curso de Economia. Para já, fazer contas... só aos golos que marca ou aos números do próximo contrato.
No caso de Henrique, o sonho tinha como base o talento para marcar golos. "Foi um ano à experiência, mas passados 15 dias de chegar ao Seixal apresentaram-lhe um contrato de formação", revelou Gonçalo Araújo, sem esconder que a família vê os jogos com "muita emoção" e sempre à espera que jogue o melhor possível: "Às vezes acontece, outras não."
E quando perde, pede o colo da família [pai, mãe e irmã]? "Como eu digo, podes aprender a aceitar a derrota, mas não precisas gostar. Ninguém gosta, mas é preciso aprender a perder. Ele aprendeu a lidar com a derrota, quando jogava no Marítimo, e gere bem o processo, tirando sempre algo de positivo", segundo Gonçalo Araújo, que ainda não viu o filho jogar pela equipa principal ao vivo.
No seixal foi queimando etapas - na época de estreia, pelos juvenis, apontou 37 golos em 33 jogos - e integrou o plantel principal com a saída de Jorge Jesus e a promoção de Nélson Veríssimo. Já foi utilizado em cinco jogos (Estoril, Vizela, Tondela e Gil Vicente no campeonato e Sporting na Taça da Liga), e foi ele que marcou o golo do empate com o Vizela (1-1, na jornada 26 da I Liga). Por estar entre os seniores só fez dois encontros pelos Sub-19, com o Midtjylland e o RB Salzburgo, na final, em que apontou três golos. É o melhor marcador da equipa B esta época, com 14 golos e 24 jogos.
Henrique nasceu no Funchal em 2002. É um dos 19 campeões europeus do Benfica que não é de Lisboa, o que reflete o modelo e a política da formação benfiquista seguida após a inauguração do Benfica Campus, no Seixal, em 2006. Samuel Soares, João Tomé, Luís Semedo, Martim Ferreira e Diogo Spencer são os únicos naturais na capital.
A rede de escolas que o clube montou vai de Vila Real ao Algarve, passando por Braga, Aveiro e Viseu, e tem sido uma forma de captar talento e ganhar avanço sobre os rivais. Além disso, o clube montou uma rede de olheiros e observadores gigantesca, que mobiliza quase 200 pessoas todos os fins de semana a ver jogos em nome do Benfica e a fazer relatórios com indicações e observações sobre jogadores.
O título agora conseguido coroa o trabalho de quase duas décadas e a aposta do conhecimento de pessoas que estiveram na descoberta de alguns dos melhores jogadores portugueses de sempre ... na afamada academia leonina. Pedro Mil Homens (Diretor geral da formação), Jean Paul (técnico de prospeção de especialização), Bruno Maruta (coordenador da prospeção/scouting) e Pedro Marques (diretor técnico) são apenas alguns dos 14 elementos da estrutura da formação do Benfica que passaram pelo Sporting.
Agora estão a fazer valer a sua experiência e conhecimento ao serviço das águias. No Seixal encontraram condições de trabalho ao nível das melhores equipas da Europa, um clube que apostou forte na formação e dotou as equipas de staff com 15 ou mais elementos, desde fisiologistas a educadores, passando por nutricionistas e psicólogos. A conquista desta Youth League (a Champions dos sub-19) foi até agora a maior conquista.
isaura.almeida@dn.pt