Festival San Sebastián. Timothée Chalamet é a sensação num festival que arrancou em pleno
O Festival de San Sebastián continua a reforçar o seu estatuto de grande no circuito internacional. Beautiful Boy, com Timothée Chalamet, foi o título mais mediático desta primeira metade, mas há outros títulos a impressionar os cinéfilos. A corrida à Concha de Ouro termina este sábado
Beautiful Boy, de Felix Van Groeningen, com Timothée Chalamet e Steve Carrel
O filme do belga, que nos trouxe Ciclo Interrompido, foi um dos títulos mais sonantes da competição e trouxe à cidade basca Timothée Chalamet, ator que fez literalmente parar o trânsito. O jovem de Chama-me Pelo Teu Nome, de Luca Guadagnino, interpreta aqui um adolescente que tenta sucessivamente fugir à toxicodependência com a ajuda do seu pai, interpretado com uma contenção invulgar por parte de Steve Carrel.
Chalamet deverá ser de novo nomeado ao Óscar, desta vez na categoria de melhor ator secundário. Este jovem ator tem algo de James Dean em toda a intensidade que exala. É a melhor coisa de um filme que chega a ser experimental no recurso à música pop-rock como fonte de condução sensorial.
O Primeiro Homem na Lua, de Damien Chazelle, com Ryan Gosling e Claire Foy
Vindo do Festival de Veneza e de Toronto já com uma campanha montada para a temporada dos prémios, First Man passou fora de competição e foi talvez o filme mais popular do arranque do festival. A confirmação de um novo grande cineasta, Damien Chazelle, que depois de La La Land se aventura numa história verdadeira, a conquista da Lua pela NASA, em particular a saga íntima e pessoal de Neil Armstrong.
Claire Foy e Ryan Gosling são notáveis e foram de uma simpatia tremenda para os fãs de San Sebastián, mostrando-se disponíveis para todas e mais algumas selfies. Menos disponíveis estiveram para a imprensa internacional, tendo cortado o seu tempo de promoção.
O Caderno Negro, de Valeria Sarmiento, com Lou de Laâge e Stanislas Merhar
Foi dos melhores filmes que vimos concorrer para a Concha de Ouro. Adaptação livre de O Livro Negro do Padre Dinis, de Camilo Castelo Branco, que mostra a infância do Padre Dinis, o protagonista de Mistérios de Lisboa.
Paulo Branco produziu uma obra que no Festival de Toronto já tinha tido honras de seleção. Na conferência de imprensa, a realizadora chilena salientou que não há nada mais feminista do que fazer um filme em forma de retrato de uma mulher.
O Caderno Negro é uma lição de como a noção de folhetim pode e deve ser tratada em cinema. Quem entrar neste carrossel de surpresas narrativas de Camilo sairá muito recompensado.
Red Joan, de Trevor Nunn, com Judi Dench e Sophie Cookson
Passou para ilustrar a sessão de homenagem a Judi Dench, atriz inglesa que veio a San Sebastián receber o prémio de carreira, mas Red Joan é uma das desilusões do festival. Um filme onde nem a chamada "qualidade à BBC" salva um guião que se dá mal com flashbacks atabalhoados e um tom de romance de cordel. Tudo isto para contar a história da famosa "Espia Avózinha", que nos anos 1990 foi descoberta pela FBI depois de surgirem provas de como entregou documentação sobre a bomba atómica aos russos durante a Segunda Guerra Mundial.
Dench mal aparece num filme onde vemos a jovem Joan interpretada por Sophie Cookson, atriz com carisma zero. Red Joan é um filme antiquado. Antiquado no pior sentido da palavra...
In Fabric, de Peter Strickland, com Marianne Jean-Baptiste e Hayley Squires
Um filme de fantasmas na competição oficial? Os programadores do festival apostaram e ganharam. In Fabric é um sério candidato à Concha de Ouro e coloca de uma vez por todas Peter Strickland como cineasta de primeira divisão no cinema internacional.
História sobre um vestido vermelho que é possuído por um espírito maligno. Cinema transgressivo e repleto de um humor demente que não tem medo de arriscar. Como se fosse Monty Python a experimentar o género do terror. Uma delícia que em Portugal não tem distribuição.
Depois da polémica em Serralves com Mapplethorpe, seria interessante perceber se estas imagens de sémen, sexo violento e erotismo absurdo causariam discussão...
Bergman- A Year in Life, de Jane Magnusson
Elliot Gould, Barbra Streisand e Liv Ullman são algumas das figuras que falam e choram sobre Bergman neste documentário que em breve chega ao circuito comercial português. Pensado para celebrar o centenário de Ingmar Bergman, o documentário centra-se em 1957, ano em que o génio sueco assinou a realização de dois filmes e encenou peças de teatro que o imortalizaram, além de ter tido vários amores.
A seu favor tem um ritmo interessante e uma relação de simbiose espantosa com as imagens de arquivo, contra talvez o facto de por vezes nos fazer sentir "voyeurs". Mas basta acreditar naquilo que Bergman conta aqui numa entrevista recuperada: "o que me interessa no cinema não é aquilo que nos faz pelo intelecto, mas sim a forma como nos toca como seres humanos".