Vai ser um momento "muito especial" para Fernando Tordo. Afinal, nunca antes um artista da denominada música popular se havia juntado em palco com a Orquestra Sinfónica Portuguesa, como o autor de Tourada e Cavalo à Solta vai fazer no próximo sábado, 16 de novembro, quando subir ao palco do imponente palco do Teatro Nacional de São Carlos para um concerto "único e irrepetível"..Fernando Tordo começou a cantar durante a adolescência, mas foi em 1968, ao ingressar no grupo Sheiks, do qual faziam também parte Paulo de Carvalho e Carlos Mendes, que se tornou um profissional da música. No ano seguinte concorreu pela primeira vez ao Festival da Canção, iniciando aí uma longa parceria com o poeta José Carlos Ary dos Santos, da qual resultariam vários temas clássicos. Para a história ficaram também álbuns como Adeus Tristeza, o primeiro feito após a morte de Ary dos Santos, em 1983, ou o espetáculo Só Nós Três, com os companheiros de sempre, Carlos Mendes e Paulo de Carvalho, com quem percorreu o país e a Europa numa longa digressão, cujo duplo álbum ao vivo arrecadou a marca de platina. Agora, aos 71 anos e com mais de meio século de carreira, volta a fazer história..Como surgiu este projeto de um concerto com a Orquestra Sinfónica Portuguesa? Foi o maestro Jorge Costa Pinto, quando nos encontrámos casualmente numa exposição, que me falou pela primeira vez de fazer um concerto com as minhas canções, tocadas pela Orquestra Sinfónica Portuguesa. Pareceu-me logo um projeto muito interessante e especial, mas de alguma forma difícil de realizar, por ser a primeira vez que um autor e compositor de canções iria apresentar o seu trabalho com a Orquestra Sinfónica Portuguesa e logo num local como o Teatro Nacional de São Carlos..O local também é especial? É especialíssimo, por ser a casa da ópera, embora nem sempre o tenha sido. O teatro nacional foi inaugurado em 1793, com a presença do então príncipe regente, mais tarde rei D. João VI, e é engraçado, porque a documentação da época revela que os primeiros espetáculos ali apresentados eram bastante mais populares. De qualquer forma, tenho de enaltecer a disponibilidade da direção do São Carlos para receber este espetáculo. Fico muito feliz, porque é sinal de alguma responsabilidade que a minha música tem, depois de tantos anos. No outro dia estive lá, a assistir a um bocadinho de um ensaio da orquestra, e de facto aquela sala tem uma acústica perfeita, pois permite a quem está na última fila ouvir tudo tão bem como se estivesse em cima do palco..Porque é que pensou, então, que seria difícil de realizar? Não foi tanto pelos músicos ou sequer pela direção do teatro que o senti, mas por algo mais subliminar e que está muito mais para trás, que é o estatuto, a chamada pompa e circunstância [risos]. E esse parecia-me um caminho um bocadinho difícil de desbloquear, mas a verdade é que, cerca de um ano e meio depois dessa primeira conversa, vai mesmo concretizar-se..E para o Fernando Tordo, este também era um desejo ou um objetivo? Tenho de confessar que não, porque felizmente, ao longo da minha carreira, tenho tido a oportunidade de cantar e gravar com excelentes orquestras, embora nenhuma com esta dimensão. Por exemplo, quando gravei o disco O Menino Ary dos Santos, em 1988, em Londres, com orquestrações do José Calvário, cantei com 74 músicos, mas com uma orquestra sinfónica é de facto a primeira vez, o que torna este momento muito especial, até pelo local onde se vai realizar..Quais são os maiores desafios de um espetáculo como este? Aquilo que pode parecer um bocadinho assustador, para quem está de fora, que é ter tantos músicos a tocar ao mesmo tempo, só me preocupa tecnicamente. Por exemplo, se vou ouvir a minha voz ou não, porque o resto não me apoquenta nada, adoro cantar com orquestras. Outra questão que me preocupa são as orquestrações, porque como vamos tocar 20 temas, ainda não as conheço todas. Mas é sempre bom que existam algumas preocupações antes de um espetáculo como este, que acima de tudo é um acontecimento muito feliz para mim e pode deixar uma porta entreaberta para outros artistas também fazerem, no futuro, algumas colaborações deste género..Qual vai ser o alinhamento? Este concerto vai ter muitos originais, nos quais musiquei a poesia de Carlos Oliveira, David Mourão Ferreira, Pedro Homem de Melo, Tiago Torres da Silva, Antero de Quental e António Botto, que vão ser pela primeira vez apresentados ao vivo. E depois há os clássicos, que nunca podem faltar num concerto meu, Cavalo à Solta, Estrela da Tarde, Adeus Tristeza, todas essas canções. Ao todo serão 17 canções mais três instrumentais, um deles composto propositadamente pelo maestro Jorge Costa Pinto para ser tocado pelo meu filho Filipe Manzano Tordo, que é pianista clássico..O concerto vai ser registado para uma futura edição em disco? Vai ser gravado pela RTP, porque vai ser um momento único e havia uma preocupação, por parte de todos os envolvidos, para que ficasse registado e posteriormente seja transmitido. Quanto a uma futura edição em disco, está de momento posta de parte, devido ao compromisso que temos com os músicos da orquestra, a quem foi garantido não haver qualquer tipo de negócio neste projeto. A própria RTP nada paga pela gravação..E os próprios discos já pouco ou nada vendem... A gravação de um CD é hoje meramente curricular. Às vezes perguntam-me porque continuo a gravar discos, que ainda fica bastante caro, mas há coisas que não têm preço e um tipo como eu não se pode dar ao luxo de fazer canções e não as gravar, não faz sentido. E depois há sempre algumas surpresas, como o disco Calendário, que editei em 1997 pelo Diário de Notícias e que ainda hoje é um recorde nacional. Foi posto à venda numa quarta-feira e nem sequer era obrigatório comprar, ou seja, tinha tudo para correr mal, mas acabou por se tornar o álbum mais vendido em Portugal num único dia, com um total de 24 mil discos..Fernando Tordo e Orquestra Sinfónica Portuguesa.Teatro Nacional de São Carlos Lisboa, 16 de novembro, 21.00. Bilhetes de €10 a €25