Família de palestiniano morto por militar israelita quer recorrer ao TPI
A família do atacante palestiniano morto pelo sargento israelita Elor Azaria, depois de aquele ter esfaqueado outros dois militares da mesma nacionalidade, anunciou que vai levar o caso ao Tribunal Penal Internacional (TPI) de Haia.
Abdel Fattah al-Sharif, de 21 anos, foi um de dois palestinianos que, a 24 de março de 2016, em Hebron, atacaram com armas brancas um grupo de soldados de Israel. Ambos os palestinianos foram alvejados durante o ataque, havendo vídeos a mostrarem Azaria a disparar contra a cabeça de Al-Sharif quando este já se encontrava no chão, a sangrar. O outro palestiniano também morreu no local devido a ferimentos de bala, mas não voltou a ser alvejado.
Na quarta-feira um tribunal militar israelita considerou por unanimidade Azaria responsável pelo homicídio de Al-Sharif, esperando-se que a pena seja conhecida dia 15, segundo fontes militares citadas no The Times of Israel. O máximo são 20 anos de prisão, mas a expectativa é que a pena aplicada seja mais leve.
O caso alcançou enorme repercussão em Israel, com grande número de figuras políticas e governantes, entre os quais o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, a pronunciarem-se a favor do perdão ao sargento. Um possível perdão só pode ser concedido pelo presidente Reuven Rivlin, do Likud, o mesmo partido do atual chefe de governo.
Perante o clima maioritariamente de empatia para com Azaria, a família de Al-Sharif pretende levar o caso ao TPI de Haia, considerando que o sargento devia ter sido acusado de assassínio e não homicídio, o que significa uma pena menos severa. Recorda, por outro lado, que os palestinianos acusados da morte de israelitas são condenados a pena perpétua nos tribunais deste país.
Além do TPI de Haia, a família do palestiniano quer ainda que outras entidades ligadas aos direitos humanos analisem o sucedido no quadro de uma investigação internacional independente.
Se um grande número de políticos defende Azaria e apela ao perdão da sentença, a maioria das chefias militares, além de um antigo ministro da Defesa e chefe de estado-maior das forças armadas, Moshe Ya"alon, tem tido palavras duras para o comportamento do sargento, qualificando-o de "antiético" e errado por ter disparado sobre um ferido desarmado. Ya"alon, que pertence ao Likud, disse ontem estar a fazer-se "um cínico aproveitamento do caso pelos políticos para ganhos pessoais". Ya"alon abandonou o cargo em choque com o primeiro-ministro devido ao caso em Hebron. O incidente de 24 de março de 2016 foi mais um na série de ataques, principalmente com armas brancas, desencadeados por palestinianos em setembro de 2015. Números oficiais israelitas revelam um saldo de 42 mortos e 635 feridos. Do lado palestiniano, segundo a OLP, verificaram-se 248 mortos, a grande maioria de jovens com 25 anos ou menos, nem todos resultantes da vaga iniciada em 2015.
A condenação de Azaria é desenvolvimento raro em Israel, tendo o caso anterior sucedido em 2003 quando um militar foi responsabilizado pela morte de um ativista europeu envolvido numa ação de apoio aos palestinianos.
O substituto de Ya"alon, Avigdor Liberman, do Yisrael Beiteinu, nacionalista sionista, que se pronunciou contra a acusação de Azaria, na altura dos acontecimentos e quando o seu partido estava na oposição, disse ontem dever "respeitar-se a sentença, mesmo quando não se concorda" com ela e pediu aos políticos "discrição" naquilo que dizem.
Perante as declarações a favor do perdão, o presidente Rivlin divulgou um comunicado, em que criticando de forma implícita os pronunciamentos públicos, refere serem os condenados ou seus representantes legais a terem de pedir clemência. A possibilidade de um perdão só será considerada, acrescenta o presidente, após conclusão do processo e tendo em presente "as recomendações das entidades relevantes".
Os termos do comunicado sugerem, na interpretação de alguns analistas, que Rivlin está ciente das implicações do caso num país onde existe real independência de poderes, nomeadamente no plano judicial. Recorde-se que o próprio primeiro-ministro está a ser investigado por corrupção. Ainda ontem, Netanyahu foi interrogado, pela segunda vez esta semana, pelo responsável do departamento de investigação de fraudes e corrupção.
O primeiro-ministro é suspeito de ter recebido dezenas de milhares de dólares em presentes de apoiantes, indicava ontem a televisão i24 . Segundo o Haaretz, um desses apoiantes de Netanyahu teria funcionado como intermediário em compras do exército israelita e cultiva relações com outras figuras de primeira linha da política no país.
O caso está a afetar a popularidade de Netanyahu, com sondagens a sugerirem uma derrota eleitoral. No passado, outros políticos, como o primeiro-ministro Ehud Olmert, foram acusadas de corrupção e acabaram por se demitir.
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